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Ascensão, queda e mais queda

Atilano Oms, dono do grupo industrial Inepar, foi um dos empresários mais ambiciosos do país nos anos 90. De lá para cá, coleciona fracassos. Agora pode perder o controle da empresa

Atilano Oms, da Inepar, em 1998: seus assessores tentam convencer os credores a assumir a empresa  (Kiko Ferrite/EXAME)

Atilano Oms, da Inepar, em 1998: seus assessores tentam convencer os credores a assumir a empresa (Kiko Ferrite/EXAME)

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Da Redação

Publicado em 1 de outubro de 2014 às 06h00.

São Paulo - A história tornou-se comum no Brasil nos últimos anos. Empresários com ideias megalomaníacas levantam um dinheirão para tirar seus projetos do papel — em setores tão distintos quanto carne, leite, petróleo, mineração. Milhares de investidores, no embalo, colocam seu dinheiro na megalomania.

Como se sabe, esse tipo de combinação tem acabado mal por aqui. Eike Batista e seu grupo X são, claro, o símbolo mais extremo de um Brasil que parecia decolar e estacionou na cabeceira da pista. Mas, ao longo da história, esse tipo de enredo teima em se repetir. O empresário Atilano Oms Sobrinho, dono do grupo industrial paranaense Inepar, foi uma espécie de precursor de Eike Batista.

Entre os anos 80 e 90, a Inepar chegou a ser um dos 15 maiores grupos empresariais do país. Nessa época, sua ação foi a queridinha da Bovespa. Mas uma combinação de investimentos exagerados com má gestão derrubou a companhia. Nos últimos 15 anos, a Inepar acumula um revés atrás do outro.

O último veio em agosto, quando a empresa pediu recuperação judicial. Atilano, como é conhecido o empresário, tem de pagar dívidas de 2 bilhões de reais. Mas ninguém sabe de onde virá o dinheiro. 

A ascensão de Atilano foi quase tão impressionante quanto a queda que viria em seguida. Depois de ficar órfão, aos 16 anos, Atilano começou a trabalhar como auxiliar de escritório numa empresa de engenharia, a Enco. Teve seus estudos custeados por um dos sócios da empresa, Ophir Woitowicz.

Quando se formou em direito, ganhou de Woitowicz participação acionária numa empresa  que seria o embrião da Inepar. Ao longo dos anos 70, foi acumulando ações até que seu mentor morreu, em 1982, e Atilano assumiu o controle. Foi quando começou a fase mais exuberante da companhia.

Adquiriu várias fabricantes de equipamentos industriais em dificuldades. Uma série de investimentos em telecomunicações lhe daria fama e fortuna. O mais conhecido foi a Iridium, projeto financiado na década de 90 pela americana Motorola que pretendia criar uma rede mundial de telefonia por satélite ao custo de 6,6 bilhões de dólares.

Atilano era o controlador da subsidiária brasileira. Na privatização da Telebras, em 1998, fez parte do consórcio que arrematou a atual Oi (na época, Telemar), com  20% das ações.

No fim de 1998, o grupo valia 1,5 bilhão de reais na bolsa — um terço, por exemplo, do valor de mercado da mineradora Vale. Parecia, por um bom tempo, que Atilano estava fazendo tudo certo. Mas logo ficaria claro que estava fazendo tudo errado.  

Executivos próximos ao  empresário dizem, meio brincando, meio a sério, que a recuperação judicial está vindo com pelo menos dez anos de atraso. Em 1999, Atilano levou um golpe fatal quando a Iridium quebrou. Entre a concepção do projeto e sua conclusão, surgira uma tecnologia que tornaria a rede de satélites da Iridium obsoleta — a telefonia celular.

O plano acabou entrando para a antologia dos negócios como o maior mico da história. A Inepar logo começou a ter dificuldades financeiras. Sem dinheiro, Atilano entregou suas ações na Telemar ao banco Opportunity,­ seu credor. No ano seguinte, ele tomaria outra decisão dramática: deixou de entrar no leilão de concessão que criou a empresa de telefonia GVT, em 2000.

Atilano participou da concepção do projeto e seria um dos controladores da empresa, com metade do capital, mas decidiu ficar de fora três dias antes do leilão para a concessão. A GVT acaba de ser vendida à espanhola Telefónica por 22 bilhões de reais. Para tentar se reerguer, o empresário decidiu mudar de ramo.

Em 2005, partiu para o pe­tróleo­ e criou a Iesa, fabricante de equipamentos para plataformas de exploração. Três anos depois, investiu em equipamentos ferroviários e de saneamento em associação com a construtora Triunfo.

Bem relacionado, financiou essa expansão com aportes de fundos de pensão, bancos oficiais e conseguiu grandes encomendas da Petrobras. Mas gerir tantas empresas foi ficando impossível. “Tivemos oportunidades muito maiores do que nossa capacidade de gestão”, afirma Atilano.

Para resolver o problema num lado, o empresário acabava criando outros, ainda mais complicados. A Inepar foi alvo de dezenas de processos na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) entre 1999 e 2013. Quase sempre era acusado de prejudicar seus acionistas minoritários e salvar, ou tentar salvar, a própria pele.

No inquérito principal, a CVM diz ter constatado que Atilano “transferiu” dinheiro da Inepar para sua holding, causando prejuízo aos minoritários. O objetivo era pagar dívidas e manter o controle da companhia. Além disso, inflou artificialmente seu balanço. O processo, que começou em 2006, resultou no ano passado em multa de 4,5 milhões de reais.

O empresário e seu irmão, Jauvenal, foram proibidos de ter cargos em companhias abertas por cinco anos. A Inepar está recorrendo, e Atilano diz que a CVM “cometeu erros”.  O fato é que as crises e os processos fizeram com que as ações da empresa, que chegaram a valer 48 reais na década de 90, sejam negociadas hoje a 37 centavos. 

Com alguns anos de atraso, a situação da Inepar de fato chegou ao limite. Em maio, Atilano contratou o banco de investimento Brasil Plural para encontrar uma solução para as dívidas do grupo, que somam 2 bilhões de reais. Suas empresas estavam atrasando salários e dando calote em rescisões trabalhistas, o que acabou provocando protestos de sindicatos de metalúrgicos.

O banco avaliou a situação e decidiu que a única solução seria a recuperação judicial. “Demitimos mais de 3 000 pessoas e ainda não pagamos todos os compromissos trabalhistas. É uma situação terrível”, diz Atilano.

As companhias  que a Inepar detinha em sociedade com outros grupos tiveram seu controle transferido para os sócios capitalizados. A austríaca Andritz Hydro e os sócios da construtora brasileira Triunfo já comandam os negócios de turbinas hidrelétricas e material ferroviário, respectivamente.

Aconteceu algo semelhante com a subsidiária de óleo e gás, a Iesa. Atilano enxergava nos bilionários investimentos da Petrobras a chance de reerguer o grupo. Depois de obter financiamentos no banco Banrisul para construir uma unidade em Charqueadas, no Rio Grande do Sul, conseguiu um contrato de 1,5 bilhão de reais com a estatal. Mas a Petrobras irritou-se com  atrasos e exigiu que outra empresa assumisse as obras.

A construtora Andrade Gutierrez deve ficar com 75% do contrato de fornecimento de módulos para plataformas (o restante da Iesa continua com a Inepar). Atilano reconhece os problemas, mas ainda pensa em abrir novas frentes de negócio.

“Nossa capacidade de engenharia e a lição aprendida nos farão voltar”, diz. O Brasil Plural tem outros planos: convencer credores e outros investidores a transformar dívidas em ações e assumir o grupo. Atilano, assim, perderia  o controle do grupo que criou há 40 anos. A proposta será apresentada aos credores em novembro.

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