Revista Exame

Como investir em 2019, quando a economia deve passar por mudanças

O Brasil e algumas das principais economias do mundo devem passar por mudanças em 2019. O que esperar do próximo ano e como investir nesse novo cenário

 (Arte/Exame)

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GN

Giuliana Napolitano

Publicado em 6 de dezembro de 2018 às 05h58.

Última atualização em 6 de dezembro de 2018 às 07h13.

Os estudos econômicos normalmente afirmam que o melhor momento para comprar alguma coisa é o ano passado.” A frase é de um comediante americano morto em 2018, Marty Allen, e não de um especialista no assunto. Mas descreve bem o drama de muitos investidores, especialmente no Brasil atual. Depois de anos de crise, existe uma expectativa de que a economia local consiga avançar. Na projeção da maioria dos analistas, o país é um dos poucos com condições de crescer mais no ano pela frente do que em 2018. Para que isso aconteça, porém, é preciso que as promessas do novo governo no campo econômico virem realidade, e elas não são simples. Até agora, os investidores que ignoraram os riscos e apostaram num desfecho positivo se deram bem: a bolsa valorizou, o real também, e os juros continuam baixos. Olhando para a frente, e não para o passado, a maioria dos 55 executivos do mercado financeiro consultados por EXAME para este especial — analistas, gestores de fundos, assessores financeiros e economistas — ainda acredita que é possível ganhar dinheiro sendo otimista. Mas avisam: é bom se proteger dos riscos, que não são pequenos.

O Brasil e algumas das principais economias do mundo deverão passar por mudanças importantes em 2019 — e, pela primeira vez em anos, estamos na ponta das expectativas positivas. Nos Estados Unidos, os juros estão subindo e espera-se que o PIB passe a crescer menos. Alguns analistas temem que o país entre em recessão, ainda que o cenário-base não seja esse. A China deverá continuar desacelerando, e poderá sofrer ainda mais se aumentar a tensão comercial com os Estados Unidos. No início de dezembro, os dois países concordaram em dar uma trégua à disputa e negociar para chegar a um acordo em três meses, mas, se isso não acontecer, os problemas deverão voltar. A Inglaterra terá de fechar um acordo para cumprir o que foi definido em referendo e sair da União Europeia. Tudo isso causará impactos na economia brasileira, mas eles podem ser limitados. “O Brasil tem uma economia diversificada e menos dependente da demanda do exterior do que outros países emergentes, porque é pouco aberto ao comércio internacional. Assim, se o mercado doméstico for bem, o país conseguirá avançar”, diz Isabelle Mateos y Lago, diretora responsável por estratégias globais do instituto de investimentos da americana BlackRock, maior gestora de recursos do mundo, com 6 trilhões de dólares de patrimônio administrado (leia a entrevista completa abaixo).

É claro que, se houver uma crise mundial, o Brasil não ficará imune. Mas poderá atravessar relativamente bem o período mais adverso no exterior — desde que faça a lição de casa. As bases para a retomada estão aí, segundo os especialistas: os juros estão baixos, a inflação está sob controle, as contas externas estão ajustadas e as empresas que sobreviveram à recessão tornaram-se, de forma geral, mais eficientes. Falta atacar o caos fiscal em que o país ficou mergulhado. “Os primeiros seis meses de governo vão mostrar para onde estamos indo de fato”, diz Juan Jensen, economista da consultoria 4E. Nesse período, espera-se que o governo consiga, no mínimo, aprovar a reforma da Previdência e adotar medidas para reduzir o gasto público, o que mostraria que o governo tem condições de administrar seu endividamento e daria confiança a investidores e empresários para colocar dinheiro aqui.

Esse é o cenário considerado mais provável para 2019 por três consultorias econômicas ouvidas por EXAME: LCA, MB Associados e 4E. Elas atribuem cerca de 60% de chance de que ele ocorra. Nesse cenário, o PIB cresceria em torno de 2% — com viés de alta a partir de 2020 —, os juros aumentariam pouco e o dólar ficaria em 3,70 reais. Essa projeção leva em conta, ainda, que os juros americanos subirão dentro do previsto (ou seja, sairão do patamar atual, entre 2% e 2,25% ao ano, para cerca de 3% em 2019) e que a economia chinesa crescerá em torno de 6%. “Se o Brasil fizer pelo menos uma reforma substancial da Previdência, a percepção sobre o país se transformará, mesmo que não haja uma mudança grande nos fundamentos. Foi o que aconteceu em outubro com a eleição de Bolsonaro: o real e a bolsa valorizaram, enquanto os mercados emergentes tiveram desempenho ruim, apenas por causa da expectativa de que as coisas vão melhorar”, afirma Peter Taylor, diretor responsável por renda variável no Brasil da gestora britânica Aberdeen, que tem 20 bilhões de reais aplicados em ações brasileiras.

Mas o risco de o governo não conseguir entregar o que prometeu é considerável. A grande dúvida é se terá capacidade de negociar com o Congresso para aprovar a reforma da Previdência — que depende de três quintos dos parlamentares, ou 308 deputados federais e 49 senadores. Se o governo falhar, indicando que também teria dificuldades para implementar outros pontos da agenda liberal, as perspectivas para a economia piorariam sensivelmente: o PIB cresceria apenas 0,5% em 2019 e o país entraria em recessão na sequência.  Esse é o cenário pessimista de 4E, LCA e MB. As consultorias também traçaram uma projeção otimista, que prevê que o governo conseguiria avançar no plano de privatizações e aprovaria outra reforma além da previdenciária. Com isso, a economia teria uma expansão de 3% e o dólar cairia para 3,50 reais em 2019.

Terceira idade em Salvador: os investidores torcem pela reforma da Previdência | Marka/UIG/Getty Images

Mas será que ainda dá para ganhar dinheiro apostando que o Brasil vai melhorar? Ou isso já está nos preços dos ativos financeiros? Depois da alta de outubro, gestores estrangeiros venderam bilhões de reais em ações brasileiras. Em novembro, o real desvalorizou a ponto de o Banco Central intervir fazendo leilões para conter a depreciação. Se houve excesso de euforia, as perdas podem ser ainda maiores caso algo dê errado. Na opinião dos especialistas, o mau humor de novembro foi pontual. Taylor, da Aberdeen, afirma que vendeu um pouco de ações brasileiras para aproveitar a oportunidade de comprar papéis mais baratos em outros mercados emergentes, como China e México, mas que continua otimista com o Brasil — mesmo com a venda, no acumulado do ano aumentou os investimentos em ações brasileiras em cerca de 20%. Instituições como BlackRock e Morgan Stanley elevaram a recomendação de compra da bolsa local. Assessorias financeiras têm sugerido que seus clientes arrisquem mais. “É o momento de ser menos conservador e aproveitar oportunidades”, diz Ernesto Leme, diretor da gestora de investimentos Claritas, que reforçou a indicação de investimento em renda variável e fundos multimercado em novembro.

Se algo próximo do cenário-base se confirmar, os analistas consultados para esta reportagem acreditam que o Ibovespa chegará a 110 000 pontos em 2019 — uma alta de cerca de 20% em relação ao patamar atual. Quando os juros estavam em 14,25% ao ano, em 2015 e 2016, uma chance de ganho como essa poderia parecer pequena diante dos riscos (na projeção pessimista, o Ibovespa poderia cair mais de 25%). Mas, hoje, com a taxa Selic em 6,5% — e a previsão de que dificilmente passará de 8% no próximo ano —, o “custo de oportunidade” do mercado de ações diminuiu. Consultorias como Claritas e GPS recomendam que mesmo investidores conservadores tenham uma parte do patrimônio na bolsa — pequena, inferior a 5% do total. Para os mais arrojados, a fatia pode chegar a 20%. “Existem riscos, claro, mas quem ficar de fora pode perder um momento que pode ser bastante positivo para a bolsa”, diz Paulo Miguel, sócio da GPS. Outra opção de menor risco para diversificar e tentar ganhos maiores são os fundos multimercado, que podem aplicar em diferentes ativos, aqui e no exterior.

Mesmo com a queda dos juros, há opções interessantes na renda fixa. Os títulos prefixados, que determinam hoje o rendimento que será pago no futuro, estão entre os mais indicados pelos especialistas. Os papéis atrelados à inflação também são recomendados — embora tenham caído, os rendimentos continuam valendo a pena e, além disso, esse investimento funciona como proteção caso o cenário piore e os preços subam mais do que o esperado. As principais oportunidades de investimento do mercado, na opinião dos especialistas consultados por EXAME, estão descritas nas próximas 29 páginas. Conheça também os melhores gestores de recursos do país, o que eles esperam para o próximo ano e quais são os fundos premiados numa pesquisa exclusiva feita pelo Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getulio Vargas. Boa leitura!


O Brasil não está barato

Para a diretora do instituto de investimentos da gestora BlackRock, as ações brasileiras podem voltar a subir — mas, antes, o governo precisa entregar

Isabelle Mateos y Lago: “A economia global pode crescer mais do que o mercado espera” | Divulgação

Depois de trabalhar por 15 anos no Fundo Monetário Internacional, a economista francesa Isabelle Mateos y Lago tornou-se diretora do instituto de investimentos BlackRock, uma das maiores gestoras de recursos do mundo, com 6 trilhões de dólares de patrimônio. No instituto, Isabelle é responsável pela criação de algumas das principais estratégias globais de investimento da BlackRock. A EXAME, ela disse estar mais otimista  do que a média do mercado com o rumo da economia mundial. Em relação ao Brasil, porém, Isabelle recomenda cautela.

Qual é sua expectativa para a economia global em 2019?

É positiva. Nossas pesquisas mostram que as taxas de crescimento do PIB dos países do G7 e da China serão maiores do que o mercado espera. Não acreditamos que os Estados Unidos estejam perto do fim de um ciclo de expansão, como dizem alguns economistas, muito menos prestes a entrar em recessão. Longe disso. Está, no máximo, no início da fase final do ciclo, e uma análise histórica, com dados desde a década de 70, mostra que essa fase pode durar anos. Também vemos potencial de crescimento em muitos países emergentes — as exceções são os que têm grande vulnerabilidade externa, como a Turquia. Mas os mercados não estão comprando essa visão mais positiva. Os investidores, de forma geral, estão pessimistas.

O que explica esse pessimismo?

Dois fatores principais: o aumento dos juros americanos e a tensão comercial entre os Estados Unidos e a China. Concordo, ambos trazem incerteza. Mas o desfecho não deve ser tão ruim. A tensão comercial está diminuindo, e não há indícios de que os juros possam subir mais do que o esperado. Além disso, vale lembrar que as taxas estão sendo elevadas porque a economia americana está crescendo, algo bom para os países emergentes.

Esse mau humor dos investidores criou chances de investimento?

Sim. As bolsas de muitos países emergentes parecem baratas em relação a seu passado e também na comparação com os mercados desenvolvidos.

É o caso da bolsa brasileira?

As ações brasileiras subiram bastante com a eleição presidencial e não estão tão baratas quanto as de outros países emergentes. Podem valorizar mais — desde que o novo governo implemente as medidas pró-mercado que prometeu e faça reformas. Até agora, o mercado subiu com essa expectativa, mas temos de ver o que será entregue. Aumentamos a recomendação para o investimento em ações do Brasil antes da eleição e, agora, estamos esperando para ver. 

É melhor ficar longe do Brasil?

De maneira nenhuma. Ainda há oportunidades de investimento, mas não são tão óbvias. As ações de estatais e empresas exportadoras, por exemplo, já subiram muito. Atualmente, recomendamos investir em papéis de companhias voltadas para o mercado interno, como as varejistas.

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