Revista Exame

As coreanas vão à guerra no mercado eletrônico

As gigantes Samsung e LG brigam há anos por espaço no mercado global de eletrônicos. Na mais recente batalha, a dos smartphones, uma delas foi quase à lona

Fábrica da Samsung, na Ásia: de produtora de vegetais e peixes em conserva nos anos 40, a Samsung se transformou na maior fabricante de tecnologia do mundo em faturamento  (Dimas Ardian/Getty Images)

Fábrica da Samsung, na Ásia: de produtora de vegetais e peixes em conserva nos anos 40, a Samsung se transformou na maior fabricante de tecnologia do mundo em faturamento (Dimas Ardian/Getty Images)

DR

Da Redação

Publicado em 18 de julho de 2012 às 11h26.

São Paulo - A virada para o  século 21 marcou o recomeço para a Samsung e para a LG, dois dos maiores chaebol — nome pelo qual são conhecidos os megaconglomerados coreanos. Os grupos nasceram na primeira metade do século 20, época em que o país tinha economia predominantemente agrária.

Viram seus negócios evoluir da produção de peixes e vegetais, no caso da Samsung, e de plástico, no da LG, para setores tão variados quanto o naval e o financeiro. Veio a crise de 1997, provocada pela alta alavancagem dos chaebol, e as duas empresas — assim como toda a Coreia do Sul — entraram num processo de autoanálise.

Ao final, estava claro que o passado marcado por relações pouco transparentes entre os conglomerados e o governo precisava de um ponto final. Era igualmente evidente que o segmento de eletroeletrônicos — desde o início da década, o principal do setor industrial — tinha o maior potencial de crescimento.

Os celulares se tornavam populares nos quatro cantos do mundo, e as TVs começavam a passar pela maior transformação desde o advento da imagem em cores. Feito o diagnóstico, Samsung e LG, tendo como base uma mão de obra altamente preparada, continuaram focando em pesquisa e desenvolvimento e invadiram os mercados internacionais com suas TVs de tela plana e seus eletrodomésticos de última geração.  

Ainda que as duas gigantes tenham progredido desde então, chama a atenção o salto da Samsung na comparação com a LG. No início dos anos 2000, o faturamento de eletroeletrônicos da Samsung era de quase 40 bilhões de dólares. Hoje é de 145 bilhões, um salto de 260%. Trata-se da maior receita do setor de tecnologia no mundo — a Apple só bate a Samsung em valor de mercado. 

Já a LG vem lutando para manter a receita acima dos 46 bilhões de dólares. A explicação para o descompasso entre as duas coreanas está na disputa por um dos mais lucrativos segmentos de eletrônicos: o dos smartphones. Na Samsung, o segmento de telecomunicações, que inclui celulares e smartphones, foi a divisão que mais cresceu nos últimos anos.

No primeiro trimestre de 2012, telecomunicações foi responsável, sozinha, por um faturamento de quase 20 bilhões de dólares, mais da metade da receita global da Samsung Electronics. Segundo a consultoria Gartner, no início do ano a Samsung superou a Nokia e tornou-se a maior fabricante mundial de celulares, com 20% de participação. Já a LG, que em 2009 era a terceira maior fabricante, viu sua participação cair de 10% para 3,5% em pouco mais de dois anos. 

Duas companhias, dois destinos

A Samsung foi uma das primeiras empresas a lançar smartphones. Seu primeiro aparelho chegou às lojas em 2003. Diferentemente dos outros fabricantes, manteve um leque grande de sistemas operacionais. Ao longo da segunda metade da década de 2000, lançou smartphones com Symbian, Linux, PalmOs, Windows Mobile, Android e Bada (desenvolvido pela própria empresa).

“Quando o Android se firmou como o grande rival do iPhone, a Samsung já estava lá”, afirma Horace Dediu, analista da Asymco, consultoria finlandesa especializada em telecomunicações. “Quem escolheu o Android foi o usuário”, diz Benjamin Sicsú, vice-presidente de novos negócios da Samsung no Brasil.


O fato de a Samsung ser uma das maiores fabricantes mundiais de componentes para celulares também ajudou a aumentar a distância que a separava da LG. É ela que faz, por exemplo, os processadores A5, usados pela Apple no iPhone e no iPad. “Isso mantém a Samsung na liderança tecnológica e permite que ela fabrique aparelhos com um custo menor do que o de seus concorrentes”, afirma Sophia Kim, analista coreana da corretora Woori Investments & Securities, em Seul.

Nesse sentido, um dos maiores esforços da Samsung hoje está na área jurídica, já que boa parte dos clientes desses componentes é também concorrente. A acusação mais comum é que a Samsung usa essa vantagem para transferir tecnologias de seus clientes para seus celulares.

A LG, por sua vez, cometeu um erro grave na década passada ao acreditar que os celulares iriam levar mais tempo para ser desbancados pelos smartphones. A empresa só investiu pesadamente em smartphones em 2008, um ano após o lançamento do iPhone.

Quando a aceleração das vendas do produto da Apple se tornou evidente, a LG optou por aliar-se à Microsoft, lançando aparelhos com o Windows Mobile, sistema operacional que não vingou. A LG só foi lançar seu primeiro celular com Android no início de 2010. 

“Considerando a velocidade desse mercado, a sequência de erros foi fatal”, afirma Dediu. Para piorar a situação, a consequente perda de participação no mercado de celulares deixou a LG mais dependente das vendas de TVs, que não crescem desde 2010.

Hoje a própria LG reconhece a necessidade de mudar. “Vamos colocar os tablets em segundo plano e focar os smartphones”, disse em comunicado o coreano Ken Hong, porta-voz da empresa, no começo de junho. “Nossa recuperação no mercado de smartphones já virá na próxima geração de aparelhos com 4G”, diz Pablo Vidal, diretor de marketing da LG no Brasil, referindo-se à próxima geração das redes de celular. 

É difícil encontrar um setor da área de tecnologia tão dinâmico quanto o de celulares. Empresas como a Motorola e a Nokia, que dominavam o mercado no início dos anos 2000, foram engolidas por novos entrantes, como a Apple e a Samsung. Dada a complexidade desse mercado, a briga entre as duas gigantes coreanas é uma rara oportunidade de avaliar seus executivos.

Tanto Samsung como LG têm acesso à mesma mão de obra e estão inseridas no mesmo ambiente de negócios. Em termos de nível de segurança jurídica e carga tributária, não há regalias. Como numa espécie de laboratório, o que vale é a capacidade do alto escalão de tomar decisões.

Choi Gee-sung, de 61 anos, estava no comando da divisão de TVs da Samsung quando, em 2006, a fabricante ultrapassou a Sony e se tornou a líder mundial do setor. Assumiu a Samsung Electronics no final de 2009 e, em dois anos, transformou a empresa na maior fabricante de celulares do mundo.

Por tudo isso, não chegou a ser surpresa quando, no início de junho, Choi foi anunciado como vice-presidente de todo o conglomerado. Ele será braço direito de Lee Kun-hee, herdeiro do fundador da Samsung. Para a LG, o fato de a concorrente ter alguém tão familiarizado com eletroeletrônicos no topo só torna mais difícil a missão de recuperar o terreno perdido.

Acompanhe tudo sobre:ConcorrênciaEdição 101902EmpresasEmpresas coreanasempresas-de-tecnologiaIndústriaIndústria eletroeletrônicaLGSamsungsetor-eletroeletronicoSmartphones

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda