Revista Exame

“Americanos e europeus podem matar a OMC”

Para um dos maiores especialistas em livre comércio, as conversas entre Estados Unidos e Europa por um acordo comercial são uma péssima notícia para o mundo


	Jagdish Bhagwati: "O comércio mundial perde com o aumento de acordos bilaterais"
 (Daniela Toviansky/EXAME.com)

Jagdish Bhagwati: "O comércio mundial perde com o aumento de acordos bilaterais" (Daniela Toviansky/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 13 de junho de 2013 às 07h48.

São Paulo - O indiano Jagdish Bhagwati, professor de economia da Universidade Columbia, é uma das maiores referências mundiais quando o assunto é comércio internacional. Conselheiro das Nações Unidas, Bhagwati acredita que as conversas entre a União Europeia e os Estados Unidos para a formação de uma área de livre comércio enterram de vez a rodada de Doha, negociação entre 149 países para a redução de tarifas de importação sob a tutela da Organização Mundial de Comércio (OMC). Confira a seguir os melhores trechos da entrevista

1) EXAME - O que as negociações entre os Estados Unidos e a União Europeia significam para a economia global? 

Jagdish Bhagwati - A mídia americana propagou que os responsáveis pelo fracasso da última negociação da rodada de Doha foram a Índia e o Brasil. Não é verdade. Os principais culpados foram os Estados Unidos. Agora, para piorar, os americanos tentam acordos bilaterais como esse com a União Europeia. Tudo isso é péssimo para a economia mundial.

2) EXAME - Mas esses acordos bilaterais não vão aumentar o fluxo de comércio?

Jagdish Bhagwati - O resultado será que grande parte do comércio mundial ocorrerá entre blocos. Se a negociação entre americanos e europeus vingar, vai estabelecer condições que depois serão impostas a outros países interessados em firmar acordos de livre comércio com os Estados Unidos e a Europa. Boa parte dos países não vai conseguir atender a essas questões.

3) EXAME - Que condições serão essas? 

Jagdish Bhagwati - É cedo para dizer, mas esse acordo, se for adiante, deverá estabelecer normas trabalhistas mínimas e a ausência de controle sobre capitais. A maior parte das exigências vem dos lobbies americanos. São restrições como essas que afastam a Índia e a China da Parceria Trans-Pacífico, uma tentativa de acordo de livre comércio entre os países do Pacífico.

O que se vê é a repetição do que ocorreu durante as conversas sobre a Área de Livre Comércio das Américas, quando uma parte dos países ficou ao lado do Brasil, a outra com os americanos e nada aconteceu.

4) EXAME - Quais serão os efeitos para o Brasil de uma área de livre comércio entre americanos e europeus?

Jagdish Bhagwati - Fico preocupado com a possibilidade de a liberalização do setor agrícola em âmbito global atrasar. Há ainda o perigo da intensificação das medidas antidumping. O Brasil terá de acompanhar as negociações bem de perto.

5) EXAME - Como esse acordo pode influenciar a negociação entre o Mercosul e a União Europeia?

Jagdish Bhagwati - Tudo depende da pressão que os americanos farão sobre os europeus em relação às demandas do Mercosul. Se eles exigirem que os europeus sejam duros, haverá dificuldades.

6) EXAME - Por que o senhor acha que os acordos bilaterais são contrários à ideia de livre comércio? 

Jagdish Bhagwati - Esses acordos representam um retorno ao movimento de discriminação. Blocos fazem acordos e se fecham para os demais. A ironia é que essa discriminação é feita supostamente em nome do livre comércio. 

7) EXAME - Um possível acordo entre os europeus e os americanos será o fim da OMC? 

Jagdish Bhagwati - Temo que sim. É surpreendente que Obama, vencedor do prêmio Nobel da Paz por sua estratégia multilateralista, esteja à frente dessa conversa com os europeus.

Acompanhe tudo sobre:ComércioEdição 1036EntrevistasOMC – Organização Mundial do Comércio

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda