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América Latina está no início de uma transformação política

Para um dos mais argutos observadores da política latino-americana, a região está em transformação após o fracasso de uma agenda mais à esquerda


	Christopher Garman, da Eurasia Group: "Não há mais espaço para populismo"
 (Germano Lüders / EXAME)

Christopher Garman, da Eurasia Group: "Não há mais espaço para populismo" (Germano Lüders / EXAME)

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Da Redação

Publicado em 2 de dezembro de 2015 às 04h56.

São Paulo — O cientista político Christopher Garman lidera o time que faz avaliações de países emergentes na consultoria americana Eurasia Group, uma das mais respeitadas do mundo. Nos últimos meses, ele tem escrito aos clientes com frequência sobre a frustração da classe média latino-americana com promessas não cumpridas pelos governos. Para Garman, essa é a principal causa da baixa histórica na popularidade dos presidentes da região.

EXAME - O senhor vê uma guinada mais à direita em países da América Latina?

Christopher Garman - Não acredito que governos de direita se espalhem pelo continente, mas a região vai passar por uma correção. Os experimentos mais heterodoxos da esquerda na região fracassaram. A correção de rumos na Argentina é inevitável. A crise política na Venezuela é gravíssima.

EXAME - O que o faz acreditar numa readequação?

Christopher Garman - A média de aprovação dos governos latino-americanos está em 29%, numa pesquisa binária que pergunta se o cidadão aprova ou desaprova as atuais administrações. É um número insustentável no longo prazo. Há um ano, era de 42%.

EXAME - O que está por trás dessa impopularidade?

Christopher Garman - O principal fator é que a nova classe média latino-americana está vendo suas expectativas serem frustradas. No Chile, Michelle Bachelet voltou ao poder com uma agenda agressiva. Aumentou a carga tributária em 3 pontos percentuais do PIB para elevar gastos sociais e oferecer ensino superior gratuito, mas teve de voltar atrás e acabou nomeando Luis Felipe Céspedes para ministro da Fazenda, um conservador, exatamente como fez a presidente Dilma Rousseff no Brasil com Joaquim Levy.

EXAME - É o cenário externo adverso que está pressionando os governos da região?

Christopher Garman - Sim. O momento econômico benéfico, que elevou o preço das commodities na década passada, abriu espaço para políticas populistas e irresponsáveis. Aquela situação permitiu todo tipo de experimento, mas agora não há mais espaço para isso. De certa forma, o fracasso dessas políticas demorou para acontecer. As ações dos Kirchner e do chavismo já pareciam insustentáveis para o mercado há anos.

EXAME - Dá para dizer que há uma onda de ajuste contagiando a região?

Christopher Garman - Sempre relativizo a ideia de contágio na América Latina. Talvez a realidade dos vizinhos influencie o discurso das lideranças e inspire cópias de políticas públicas. Mas as pesquisas de opinião mostram que os fatores locais são o que pesa numa eleição, não um suposto contágio.

EXAME - Por que Peru, Colômbia e México, que seguiram políticas econômicas mais ortodoxas, também estão com problemas?

Christopher Garman - Juan Manuel Santos, na Colômbia, Ollanta Humala, no Peru, e Enrique Peña Nieto, no México, estão com a popularidade no chão, mas a política econômica mais responsável dos três países os torna mais preparados para enfrentar as turbulências vindas do exterior.

EXAME - Algum presidente da região conseguiu equilibrar popularidade e responsabilidade fiscal?

Christopher Garman - Por incrível que pareça, Evo Morales, da Bolívia, é fiscalmente conservador. Ele continua tão popular que está tentando concorrer por um quarto mandato. Rafael Correa, no Equador, também foi pragmático.

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