Revista Exame

Alok, brasileiro mais ouvido do mundo, vive entre a música e a filantropia

O artista brasileiro mais ouvido do mundo destina parte de sua renda com publicidade a ações de impacto social e ambiental entre Brasil, Índia e África

Alok, no estúdio da EXAME. (Leandro Fonseca/Exame)

Alok, no estúdio da EXAME. (Leandro Fonseca/Exame)

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GabrielJusto

Publicado em 17 de junho de 2021 às 05h46.

Última atualização em 18 de junho de 2021 às 12h09.

De Carmen Miranda a Tom Jobim e ­Anitta, a música brasileira sempre teve seu espaço no mercado internacional. Nos últimos anos, porém, um DJ do interior de Goiás tem subido a barra do que é fazer sucesso no exterior.

Aos 29 anos, Alok é hoje o quinto melhor DJ do mundo segundo a DJ Mag, a mais conceituada publicação de música eletrônica do planeta. Na lista desde 2015, quando estreou em 44ª lugar, ele vem ganhando posições ano a ano.

Nos serviços de streamings e nas redes sociais, os números também impressionam. Com 3,2 bilhões de streams­ e 22 milhões de ouvintes mensais, Alok é o artista brasileiro mais ouvido do mundo — no Brasil, fica em oitavo nesse ranking, em uma lista dominada pelo sertanejo. No Instagram, já são 25 milhões de seguidores, o que faz dele o segundo DJ mais popular da rede.

Estima-se que ele cobre entre 400.000 a 600.000 reais por apresentação. Além de turnês pelos Estados Unidos e Europa, Alok se tornou também um queridinho da Ásia, onde chega a ganhar 200.000 dólares por show — um feito praticamente inédito para um brasileiro. Há anos o DJ se apresenta para dezenas de milhares de pessoas na China, Singapura, Indonésia, Filipinas, chegando até a estrelar uma campanha da ­Budweiser para todo o continente asiático.

O mercado publicitário, aliás, ama Alok. Um de seus últimos hits, Alive, é também uma parceria com a Vivo, que inclui cocriação de conteúdo, eventos e até um plano de ativação desenhado pelo DJ. Recentemente, ele também se tornou embaixador da Cervejaria Petrópolis e da plataforma de investimentos TC.

Outra parceria de peso foi com a Garena, desenvolvedora do Free Fire, o game mais baixado do mundo. Desde 2019, é possível usar o personagem Alok no jogo. Com o poder de curar os colegas de equipe e dar mais agilidade ao jogador, a skin do DJ custa 599 diamantes (que podem ser comprados por pouco mais de 20 reais). Combinando seu próprio sucesso com o do game, Alok lucrou quase 30 milhões de reais — e resolveu doar todo o dinheiro para um fundo que, hoje, é gerido pelo Instituto Alok.

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A parceria comercial se tornou uma iniciativa com impacto social. “Retribuir faz parte de nossa cultura, e acreditamos que ter acesso à educação e às oportunidades de treinamento certas são os maiores impulsionadores do sucesso de longo prazo para uma mudança de vida”, afirmou a Garena em nota. “Alok e nós estamos alinhados nesse sentido, entregando mais para as nossas comunidades.”

As preocupações de Alok passam por questões ambientais. Junto com a ZEG, empresa de energia renovável do grupo Capitale, ele zerou as emissões de carbono de sua live de fim de ano, transmitida da cobertura de 370 metros quadrados em que o DJ mora, na zona sul de São Paulo (um evento para evitar aglomerações em tempos de pandemia). No futuro, a ideia é que a parceria transforme Alok em um dos primeiros artistas carbono neutro da indústria. 

Motivado pela depressão

A história do DJ com causas sociais e ambientais vem de longa data. Aos 24 anos, quando já havia sido considerado o melhor DJ do Brasil por dois anos consecutivos e acabara de entrar para a lista dos melhores do mundo, Alok também enfrentava uma depressão profunda. Os questionamentos sobre o que aconteceria depois da morte não deixavam de atormentá-lo.

Em busca de respostas, foi à África conhecer o trabalho da Fraternidade sem Fronteiras, uma ONG que combate a fome e a vulnerabilidade social nos lugares mais pobres do planeta, como o Malawi. Por lá, Alok encontrou uma senhora que não comia há três dias, mas, diferentemente dele, ainda acreditava em Deus. 

Alok em Moçambique: projeto em educação e saúde com o Fraternidade sem Fronteiras (Fraternidade sem Fronteiras/Divulgação)

Ao contrário do que eu pensava, não foi Deus que a tinha abandonado. Fomos nós”, conta ele no estúdio de fotografia da EXAME, vestido de costume Louis Vuitton, com a barba aparada e coque no cabelo.

“Naquele momento entendi que eu não estava buscando respostas sobre o pós-morte, mas o porquê de estarmos aqui. Entendi que a minha influência me colocava numa posição muito importante, e tudo o que eu fiz de lá para cá foi no sentido de usar isso para mudar a vida das ­pessoas.”

Depois do encontro, Alok acabou se tornando um apoiador de projetos de saúde, educação, cultura e infraestrutura da Fraternidade sem Fronteiras, que beneficiam mais de 5.000 crianças e adultos no Malawi, Moçambique e Madagascar. No Brasil, passou a colaborar com projetos como o Natal sem Fome, que doa cestas básicas para famílias carentes, e as Vilas da Esperança, que levam infraestrutura de moradia e saneamento para famílias do sertão da Bahia. 

Com o dinheiro do jogo Free Fire em mãos, Alok sentiu a necessidade de organizar toda essa vontade de ajudar o próximo. Para tirar a ideia do papel, convidou uma pessoa com anos de experiência no terceiro setor e, por acaso, também seu tio. Devam Bhaskar assumiu a direção do Instituto Alok com o desafio de coordenar ações que já existiam de maneira difusa, estruturando a organização.

“Desde o começo, o acesso à oportunidade era a ideia central de nossas conversas. Ao mesmo tempo, Alok não quer só ensinar a pescar. Ele sabe que existem casos em que é preciso dar o peixe”, explica Bhaskar, que dividiu a atuação do instituto em três áreas: empreendedorismo, gastronomia social e expansão da consciência, com ações de apoio a emergências sociais, fortalecimento de culturas indígenas, combate ao racismo, entre outras iniciativas.

O Instituto Alok nasceu no meio da pandemia, há seis meses. Entre Brasil, África e Índia, foram investidos 15 milhões de reais em mais de 20 projetos, como a Casa PretaHub, uma aceleradora e incubadora do empreendedorismo negro, e a Associação Gastromotiva, cujas cozinhas sociais oferecem qualificação profissional e alimentação de qualidade para jovens e adultos de baixa renda. Na Índia, o Instituto apoia as Vilas Amigas da Criança, desenvolvidas pelo ganhador do Prêmio Nobel da Paz Kailash Satyarthi para promover o bem-estar infantil em aldeias do interior do país. Outros 24 milhões de reais seguem no fundo e devem ser investidos no Brasil nos próximos anos.

(Arte/Exame)

Pelo menos por enquanto, Alok e Bhaskar não planejam tocar projetos proprietários com o instituto. Segundo eles, o momento é de encontrar o lugar da instituição em meio a tantas outras que já atuam com excelência no terceiro setor e à ampla gama de necessidades sociais potencializadas pela pandemia.

“O instituto vai acontecendo muito conectado com o ritmo e a visão do Alok. Trabalhar com ele, desde o começo, significa estar aberto para novas visões e inquietudes”, explica Bhaskar, que diz ter interações muito espaçadas com o DJ por causa de sua agenda, sempre cheia. “É uma cabeça que está no auge da claridade, sempre à frente, muito antenada com o mundo. É legal de ver.”

Parceria com Luiza Trajano

Foi com essa mente inquieta que, em 2018, Alok ligou para Fabião Soares em busca de novos ares para sua carreira. Sócio do Oke Studio, o diretor criativo já havia trabalhado com o Blue Man Group, dirigido todo o esquema de projeções da abertura da Olimpíada do Rio de Janeiro e tinha vontade de trabalhar novamente com um artista. Deu match.

Durante seis meses, Soares e Alok desenvolveram pilares criativos que funcionam como balizas para os projetos em que o DJ se envolve, da produção musical às parcerias comerciais. Com a fundação do instituto, Soares se tornou também vice-presidente do conselho administrativo, transmitindo as diretrizes para as ações sociais.

“Normalmente o que se vê é o artista emprestando sua imagem para a marca em troca de um bom contrato. Já o Alok quer, na verdade, construir com esses grandes players, influenciando uma agenda positiva dentro desses parceiros”, explica Soares.

“Queremos saber, também, se a parceria vai construir um capital social. Tem de ter essa troca. Se for só pelo dinheiro, ele prefere abrir mão.”

Recentemente, o DJ ESG embarcou na campanha Unidos Pela Vacina, apadrinhando quatro municípios (Alto Paraíso, Cavalcante e Goiás Velho, em Goiás, e Ituberá, na Bahia) que receberão equipamentos como câmaras refrigeradas e bobinas de gelo, que preparam o terreno para a campanha de vacinação nessas localidades. A campanha, que também envolveu outros famosos pelo país, é capitaneada por Luiza Trajano, presidente do conselho de administração do Magazine Luiza.

“Sou grande admiradora do Alok. Sempre digo que isso aumenta a média de idade de seus fãs”, brinca Trajano. “Ele é um artista extremamente engajado e preocupado com a realidade brasileira.”

Alok só embarcou na ideia depois de ouvir da própria Trajano uma negativa sobre os boatos de candidatura à Presidência da República. Mesmo reconhecendo que transformações sociais em escala só acontecem por meio de iniciativas públicas, Alok também não pretende entrar para a política. 

Quero ser um agente social por meio da minha arte. Tenho a responsabilidade de inspirar a nova geração para uma agenda positiva, transformando o inconsciente coletivo, estimulando atitudes relacionadas à sustentabilidade, inclusão e desenvolvimento humano”, explica o DJ que, depois de muito sofrer com a depressão e finalmente encontrar seu propósito, garante não se preocupar mais com a morte. “O que me preocupa é ter uma vida sem sentido.” 

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