Revista Exame

Alguma coisa vai mudar na política brasileira?

Com o fim do julgamento do mensalão se aproximando, o que chama a atenção é o que não vai mudar na política brasileira — a começar pela moralização. O que se vê, por ora, são sentenciados ainda dando ordens

EXAME.com (EXAME.com)

EXAME.com (EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 30 de janeiro de 2013 às 08h12.

São Paulo - Uma das dificuldades mais aborrecidas na tarefa de escrever artigos sobre o que está mudando “no país” é que, com incômoda frequência, quem escreve não sabe realmente quais mudanças são essas — ou, até, se há mesmo alguma mudança.

As pessoas a quem consulta, na esperança de instruir-se melhor sobre o tema, em geral sabem as mesmas coisas que ele; merecem agradecimentos, é claro, pela colaboração, mas não resolvem o problema. As fontes de informação que pode utilizar apresentam dados que se contradizem.

É insatisfatório, igualmente, o esforço de concentrar-se apenas na exposição de fatos indiscutíveis, porque muitas vezes os fatos são escassos — e têm a tendência de ser altamente discutíveis. “Que fazer?”, perguntaria Lênin — como fez quando ele próprio se viu obrigado a tomar decisões críticas para levar adiante seus projetos de mudar o mundo.

Mas Lênin não tinha de escrever artigos para revistas de negócios e economia; sua atividade profissional era fazer uma revolução comunista na Rússia e, além do mais, ele já não está disponível para responder a pergunta nenhuma.

Resumo da ópera: o leitor paga para ficar sabendo mais do que sabia antes de ler a publicação que comprou, e isso inclui, justamente, informar-se sobre mudanças que podem influir em seu futuro. Como se narrou acima, trata-se de uma encomenda difícil de entregar. Mas ela é 100% legítima — e não há outra saída que não seja tentar atendê-la.

O mais razoável a dizer neste momento, quando vai se encerrando o julgamento do maior caso criminal da história política brasileira e, ao mesmo tempo, se fazem projeções sobre os efeitos futuros das eleições municipais, talvez seja chamar a atenção para algo que não vai mudar — não no futuro visível.

A principal dessas não mudanças, provavelmente, é a moralização da política brasileira depois das condenações em massa do mensalão. Muitas esperanças se levantaram quanto a isso — e com o tempo é perfeitamente possível que aconteçam, mesmo, avanços importantes nessa área.

Na data de hoje, porém, o que se vê é justamente o contrário. Está mais do que óbvia, após todo o rigor das sentenças do Supremo Tribunal Federal, a absoluta ausência de qualquer gesto de arrependimento por parte dos envolvidos nesse desastre.


Como observou há pouco a colunista Dora Kramer, em O Estado de S. Paulo, os partidos ignoraram solenemente as condenações e continuam, na prática, dando toda a “força” à gente sentenciada por corrupção ativa e passiva, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

Os condenados do PT, em vez de ser expulsos do partido, como mandam seus estatutos, são oficialmente considerados “presos políticos” e recebem medalhas de honra ao mérito. Nos demais partidos, os sentenciados continuam dando as ordens. Podem até ir para a cadeia, mas continuam à frente de suas quadrilhas; não vão largar, enquanto lhes for possível, o osso que têm.

Quanto à eleição, o que se pode perceber são as mudanças inevitáveis — aquelas que se devem menos à política do que às realidades da vida. É a história de sempre. Durante a campanha, a prioridade é atirar no inimigo; agora, chegou a hora em que o principal é atirar nos amigos, uma batalha que começa já na noite de comemoração da vitória.

Não adianta nada, afinal, ganhar a eleição e ver o companheiro que festeja a seu lado ir para o lugar que você queria no governo. Como na eleição, não dá para evitar que em tal disputa haja vencedores e perdedores — e é conforme esse resultado que começa a se desenhar o futuro.

É indiscutível que ele vai se basear na renovação; não se trata, aqui, de previsão política, mas apenas de registrar a passagem do tempo. Ela inclui o principal personagem político do Brasil, o ex-presidente Lula. Apesar de tudo o que se diz sobre a vitória de seu candidato-poste em São Paulo, ninguém que caminha para os 70 anos de idade está em ascensão. É a vida. 

Mais cedo ou mais tarde, o jogo terá um novo baralho. Eis aí, com certeza, algo que está mudando.

Acompanhe tudo sobre:Edição 1028GovernoMensalãoPolíticaPolítica no Brasil

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda