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As mulheres que estão à frente da presença feminina recorde na Bolsa

Investidoras usam redes sociais e lançam cursos para ampliar o número de mulheres no mercado financeiro

 (Germano Lüders e Eduardo Marques/Tempo Editorial/Divulgação)

(Germano Lüders e Eduardo Marques/Tempo Editorial/Divulgação)

Marília Almeida

Marília Almeida

Publicado em 22 de outubro de 2020 às 05h42.

Última atualização em 22 de outubro de 2020 às 11h01.

Paula Reis tem uma década de experiência no mercado financeiro. Mas foi só há dois anos que a agente autônoma decidiu criar um perfil no Instagram com o objetivo de levar conhecimento e fomentar discussões entre investidoras que fazem day trade, as operações frequentes de compra e venda de ações para lucrar com a oscilação das cotações.

“Busco incentivar outras investidoras com consciência, mostrar que me atenho a um plano consistente e controlo riscos”, diz Reis. Nascia o perfil Mulher Trader, que hoje conta com 26.000 mil seguidoras. E que acaba de ganhar um canal dedicado no YouTube.

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Quando trata de plano consciente de investimentos, Reis fala com conhecimento de causa. Apesar da experiência no mercado, ela só começou a fazer day trade há dois anos. “Já tinha uma carteira arrojada, com fundos, e decidi apimentar. Fiz simulações em conta demo durante um ano para começar a operar minicontratos.”

São iniciativas que começam a se espalhar no mercado. Em comum, o objetivo de reunir investidoras e permitir que se aproximem do mercado financeiro com uma linguagem própria, de acordo com sua fase de vida e experiência no mercado.

É um fenômeno que coincide, não por acaso, com a participação crescente de mulheres na bolsa brasileira, inclusive em termos proporcionais. As mulheres correspondiam, em setembro, a 25,4% do total de investidores na bolsa, segundo a B3. É um recorde desde o início da série histórica, em 2002. Naquele ano, as mulheres somavam 17,6%.

A presença feminina passou a ganhar mais força a partir de 2018, em linha com o ambiente favorável de queda na taxa básica de juros. Eram 179.000 mulheres cadastradas na B3, número que saltou para 779.000 em setembro.

Foi um pouco antes do Mulher Trader, em julho de 2017, que Elaine Fantini e Anita Delmonte criaram no Facebook o grupo Sovinas — Mulheres Que Investem. “Faltavam mulheres para falar sobre investimentos”, diz Fantini sobre as motivações. O grupo cresceu e hoje soma 4.100 membros. No início, as duas fundadoras, que são investidoras autoproclamadas “tardias”, tinham de provocar discussões. Hoje a autonomia é maior.

“Conseguimos perceber a queda do estereótipo de que mulher é conservadora nos investimentos. Na verdade, ela toma risco, mas com cautela. Sem o viés de confiança do homem, que pode levá-lo a achar que sabe tudo sobre o ativo e colocar todo o dinheiro nele”, conta a investidora. “Mas a mulher precisa de um espaço que a escute”, completa.

Ela teoriza que o perfil de maior gerenciamento do risco parece estar ligado ao momento da mulher na sociedade. “Muitas ainda não chegaram à bolsa porque estão na fase de acumular uma reserva de emergência”, diz.

Educação financeira

Mas a sede de mudar é grande, segundo a psicóloga Regina Politti, que fundou em março a Gimi — Rede Independente de Mulheres Investidoras. O projeto oferece cursos de educação financeira para mulheres ministrados por acadêmicos. O conteúdo passa pela curadoria das quatro sócias do projeto, que inclui Luciane Ribeiro, ex-CEO da gestora do Santander.

“Temos um curso de renda fixa e outro de renda variável. Muitas alunas já querem ir diretamente para a renda variável, mas buscamos conscientizar que a renda fixa continua importante”, afirma Politti.

O objetivo do GIMI é oferecer um conteúdo “mastigado”, sem jargões, como forma de empoderar a mulher para que ela tenha condições de optar pelo melhor investimento quando estiver diante de um banker ou assessor de investimentos. A GIMI está na 19º turma, e cada uma inclui de sete a oito mulheres. “Nosso entendimento é que a maior participação da mulher nos investimentos pode inclusive equilibrar as finanças de um casal.”

(Arte/Exame)

Para a engenheira química Heloísa Cruz, uma das mulheres mais respeitadas da FinTwit, comunidade do mercado financeiro no Twitter, o crescente interesse das mulheres é perceptível quando se observa o filme, indo além da foto.

“Ao longo dos tempos, em meus cursos as mulheres não representavam mais do que 10%. Mas isso vem mudando. Há sete anos o assunto era tabu. Hoje muitas amigas divorciadas vêm tomando as rédeas das finanças”, afirma. Cruz tem 60.000 seguidores na rede e ensina a analisar ações em cursos.

Investimento anjo

O avanço da representação feminina não se dá apenas na bolsa. A advogada Rafaela Bassetti e a economista Itali Collini fundaram a Wishe para reunir investidoras para empresas nascentes fundadas por mulheres, que acabam enfrentando maior dificuldade em conseguir aportes de capital.

“Percebemos que é mais difícil mudar o ecossistema sem envolver investidoras mulheres”, explica Collini, que tem experiência no assunto: ela é a diretora no Brasil da 500 Startups, um dos maiores fundos de venture capital do mundo.

Uma barreira importante é de valor: entre 20 investidoras reunidas pela iniciativa, 90% têm menos de R$ 500 mil para aplicar, enquanto 50% têm menos de R$ 100 mil. “São patamares de aplicação que fazem mais sentido em uma plataforma de equity crowdfunding (financiamento coletivo), e não para investidores anjos. É algo que planejamos viabilizar”, afirma a economista.

O desequilíbrio na proporção de investimento em startup é ainda maior do que na bolsa: mulheres representam apenas 2% dos investidores, segundo pesquisa da associação Anjos do Brasil. “É uma jornada de longo prazo, mas acreditamos que conseguiremos acelerar esse processo de democratização”, diz Collini.

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