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Quem são os geeks, os novos nerds dispostos a gastar

Um público cada vez mais numeroso de fãs alimenta a proliferação de filmes de heróis e de séries de TV e a oferta de produtos licenciados

Loja temporária da Riachuelo: só itens para o público geek  (Gabriel Colombara/CCXP/Divulgação)

Loja temporária da Riachuelo: só itens para o público geek (Gabriel Colombara/CCXP/Divulgação)

Marina Filippe

Marina Filippe

Publicado em 1 de fevereiro de 2018 às 05h00.

Última atualização em 3 de agosto de 2018 às 08h59.

Gênero e faixa etária eram, até pouco tempo atrás, as únicas variáveis consideradas para organizar as peças de vestuário à venda no site da varejista de moda Riachuelo, divididas entre os públicos masculino, feminino, infantil e adolescente. No fim de 2017, uma quinta opção surgiu no menu: geek. Essa categoria, que também começou a ser testada como uma nova seção em duas das 291 lojas físicas da companhia, identifica fãs de super-heróis e personagens de séries e de longa-metragens como Harry Potter e Star Wars. As evidências de que havia demanda para tanto surgiram nos últimos dois anos. Uma das experiências mais emblemáticas aconteceu em dezembro com a montagem de uma loja temporária de 270 metros quadrados na quarta edição da Comic Con Brasil, feira que reúne os seguidores de cultura pop, tecnologia e as últimas tendências em séries, jogos, filmes e quadrinhos. O espaço é duas vezes maior do que o reservado no ano anterior, quando a companhia participou pela primeira vez do evento, em São Paulo. Jovens de 18 a 35 anos esperaram até 1 hora em filas para conseguir circular entre as araras.

A Riachuelo foi uma das 130 participantes a montar um estande de vendas na Comic Con 2017. Juntas, as empresas faturaram 40 milhões de reais em quatro dias e uma noite, e atraíram 227 000 pessoas. É um salto de 134% em relação à primeira edição, em 2014. O evento, criado por sete sócios brasileiros, replica um formato existente — e próspero — há mais de 50 anos nos Estados Unidos. A primeira feira desse tipo ocorreu em 1970 em San Diego, na Califórnia, e recebeu 130 000 visitantes no ano passado. Hoje se repete em mais de 400 cidades americanas. A mais popular é a de Nova York, com 200 000 participantes na edição ocorrida em 2017, um volume 11% superior ao registrado no ano anterior. Também existem versões independentes na Europa e, neste ano, haverá a primeira na Ásia — será nas Filipinas. É uma indústria que globalmente tem sido alimentada por uma prolífica produção de filmes. “O ano de 2017 foi o da cultura geek”, diz o americano Rob Salkowitz, consultor e autor do livro Comic-Con and the Business of Pop Culture (“Comic-Con e o negócio da cultura pop”, numa tradução livre). O motivo é claro: três dos cinco mais populares lançamentos no cinema americano em 2017 são filmes de heróis: Star Wars: Os Últimos Jedi, da Disney, Mulher Maravilha, da Warner, e Guardiões da Galáxia 2, da Marvel. No Brasil, no qual o filme da Mulher Maravilha atraiu o terceiro maior público do mundo, atrás apenas de China e Estados Unidos, os aficionados parecem se multiplicar com velocidade. “O público brasileiro sempre existiu e ninguém enxergava”, diz Pierre Mantovani, sócio-fundador do grupo Omelete, sócio da feira que trouxe celebridades como o ator americano Will Smith, da série Bright, da empresa de streaming Netflix, para a edição mais recente.

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Na ponta das produtoras de conteúdo, nenhuma se compara ao poder de fogo da Disney, dona da franquia Star Wars e também dos heróis da Marvel. Desde 2012, quando comprou a LucasFilm por 4 bilhões de dólares, já lançou três filmes da série, o mais recente deles em dezembro, que já alcançou a nona maior bilheteria da história ao arrecadar 1,29 bilhão de dólares. O pontapé nessa trajetória foi o lançamento de Star Wars: O Despertar da Força em 2015. O filme conquistou a terceira maior bilheteria do cinema mundial, atrás apenas de Titanic e Avatar. No Brasil, o filme mais popular de todos os tempos, com quase 11 milhões de espectadores em dois meses, é Os Vingadores, de 2012, da Marvel. O país já é o quarto maior mercado fora dos Estados Unidos para os produtos de consumo da companhia. O Brasil, aliás, está entre os cinco países que mais consomem filmes de heróis no mundo. Ao notar a importância do segmento jovem adulto, há pouco mais de dois anos a Disney criou uma área específica de licenciamento para esse público no Brasil. A equipe foi responsável por criar linhas com a marca de semijoias Pandora e a fabricante de calçados Arezzo, por exemplo. Na Warner, o faturamento dos produtos licenciados nacionalmente de personagens como Batman e Mulher Maravilha cresceu 35% em 2017. Cerca de 70% de todo o volume licenciado é destinado a adultos. Parte do sucesso está relacionado ao lançamento do filme da heroína em junho. Na varejista Havaianas, o modelo com a Mulher Maravilha foi um dos mais vendidos de 2017, com quase 600 000 pares de sandálias no mundo.

Fãs de Star Wars, em Londres, em janeiro: um filme por ano até 2020 | Joel C Ryan/Ap Photo

EMPREENDEDORISMO

Uma leva de empreendedores também cresce junto com a expansão desse público. É o caso da varejista de camisetas Piticas, criada em 2010 pelo empreendedor Felipe Rosetti, de 31 anos. Ao produzir estampas com a aprovação de empresas como Disney e Warner, a Piticas chegou a 304 pontos de vendas em todo o Brasil e ocupa a 43a posição no ranking das 50 maiores franquias do país, segundo a Associação Brasileira de Franchising. “Quando começamos, as grandes não confiavam na força desse produto para adultos”, diz Felipe Rosetti, sócio-diretor da Piticas, que produz 25 000 peças por dia e faturou 123 milhões de reais em 2017. O paulistano Renan Pizii teve a mesma dificuldade quando começou a importar bonecos colecionáveis para o Brasil, há dez anos. Dono da PiziiToys, ele simplesmente não conseguia pontos de venda. Hoje entrega para 700 pontos de venda no Brasil e investiu numa fábrica própria na China. Sob a marca Iron Studios, passou a exportar produtos para 22 países. Um item custa, em média, 350 reais, mas há colecionadores que gastam bem mais que isso. “Alguns desembolsam 70 000 reais para montar coleções”, diz Pizii.

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As produtoras de conteúdo prometem continuar saciando a demanda irrefreável dos geeks. A Disney, que comprou a Fox em dezembro por 52,4 bilhões de dólares, agora tem direitos sobre personagens como X-Men Wolverine. A Warner se prepara para lançar um serviço de streaming apenas com conteúdos sobre super-heróis, e a Disney já prevê um novo filme por ano da saga Star Wars até 2020. Por enquanto, não parece haver kriptonita capaz de acabar com o poder de consumo desse mercado.

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