Hélio Magalhães, do Citi: “Não dá mais para fazer de tudo” (Germano Lüders/Site Exame)
Da Redação
Publicado em 24 de dezembro de 2012 às 16h35.
São Paulo - A cada ano, fica mais claro que o sistema financeiro brasileiro está se dividindo em dois grupos. Há os bancos muito, muito grandes: Banco do Brasil, Itaú, Bradesco, Santander e Caixa Econômica Federal. E os pequenos. O pelotão médio, antes formado por instituições globais que tentavam competir em todos os mercados com os líderes, está sumindo.
A ordem do dia para esse pessoal é encontrar um nicho, fazer benfeito e tentar ganhar dinheiro. O britânico HSBC, que assustou muita gente ao comprar o Bamerindus em 1997, decidiu se concentrar na alta renda. E o gigante americano Citi é o último a se juntar a esse time.
No início de dezembro, o grupo anunciou uma reestruturação mundial na qual cortará 1 bilhão de dólares anuais em custos, demitindo 11 000 pessoas e saindo de mercados não lucrativos, como Paraguai e Uruguai. No Brasil, fechará 14 de suas 126 agências. O raciocínio que levou a essa decisão: o Citi é mais um que desiste de competir de igual para igual com os grandes no Brasil. “Não dá mais para fazer tudo para todos”, diz Hélio Magalhães, novo presidente do Citi no Brasil.
Trata-se de uma baita reversão estratégica. Até recentemente, ninguém na sede do banco, na avenida Paulista, em São Paulo, conseguia admitir que o Citi poderia pensar de qualquer outra forma senão grande no Brasil. Gustavo Marin, que deixou o cargo de presidente em junho após sete anos, cultivava ambições maiores.
Um dos pilares de sua estratégia foi a conquista da classe média (no Brasil, o banco era um tradicional competidor na alta renda e na assessoria a empresas). Marin determinou que os gerentes buscassem correntistas com ganhos mensais acima de 2 000 reais, metade do mínimo de 4 000 reais exigido até então.
Foram abertas agências em bairros típicos de classe média, como Vila Maria e Casa Verde, na zona norte da capital paulista. Mas faltou dinheiro para virar grande de verdade. A crise de 2008, não custa lembrar, levou as ações do grupo a valer menos de 1 dólar. Tempo de vacas magras, portanto. De 2005 a 2007, o número de agências dobrou, de 61 para 120, mas desde então só foram acrescentados seis novos pontos.
Disputa pela alta renda
Sem escala para competir no varejo e sem o foco necessário para ter uma operação eficiente, o Citi encolheu ao mesmo tempo que se tornava menos rentável. Em cinco anos, sua fatia no sistema bancário caiu pela metade. No ano passado, excluindo um resultado extraordinário por reversão de impostos, o banco lucrou 586 milhões de reais, o que representa uma rentabilidade de apenas 8,6%.
O resultado neste ano melhorou e está em 12,4% — menos da metade, ainda, dos tempos pré-crise. O Citi foi afetado, como todos os bancos, pela queda da taxa de juro nos últimos cinco anos. Mas foi mais lento que os concorrentes para compensar a redução do rendimento de títulos públicos com o crédito, enquanto a estrutura de custos aumentava.
Ao desperdiçar energia na nova estratégia, o Citi perdeu o bonde do crescimento do mercado de alta renda. Segundo a consultoria Booz & Company, o número de brasileiros que ganham mais de 4 000 reais mensais passou de 17 milhões, há cinco anos, para 27 milhões hoje. Apenas 400 000 deles são clientes do Citi. “Os bancos nacionais avançaram muito nesse mercado”, afirma Roberto Marchi, sócio da Booz. Um cliente de alta renda gera até quatro vezes mais receita para os bancos do que um de classe média.
Magalhães, que volta ao Citi depois de uma década na operadora de cartões American Express, vai tentar recuperar a relevância do banco nas áreas em que é tradicional no país. A divisão de varejo, que inclui uma financeira e a administradora de cartões de crédito Credicard, atenderá apenas à alta renda. As agências em bairros de classe média estão sendo fechadas.
Como ninguém perde cinco anos impunemente, consertar o que vinha dando errado será difícil. Nas áreas de banco de atacado e na assessoria a empresas, o banco perdeu muito espaço. Só nos últimos dois anos cerca de 15 executivos debandaram — os bancos americanos têm sofrido com as restrições à remuneração de seus profissionais, o que aumenta o poder de atração dos rivais brasileiros.
Segundo a consultoria Dealogic, o Citi caiu do quinto para o oitavo lugar no país em receitas de banco de investimento. Neste ano, o banco deve arrecadar pouco mais de 35 milhões de dólares com a assessoria a empresas, um terço do que havia conseguido em 2007. Além disso, bancos locais também se tornaram muito mais agressivos na concessão de empréstimos. A carteira de crédito a empresas do Citi era de pouco mais de 10 bilhões de reais no fim de 2011, enquanto o banco Itaú BBA tinha o quíntuplo disso.
Cinco anos atrás, a carteira do BBA era três vezes maior — ou seja, a distância entre os dois só cresceu. Há um ano e meio, o banco americano contratou Andre Kok, um dos responsáveis pela expansão do Itaú BBA, para revitalizar a área. De fato, o Citi melhorou nos rankings de fusões e aquisições e de operações de mercado de capitais, mas o fator competitivo fundamental não mudou: o poder de fogo no crédito.
Depois de perder parte da clientela de altíssima renda, assustada com os efeitos da crise internacional, para bancos nacionais e até estatais, e sem poder recorrer a grandes aumentos de capital pela matriz, a expansão do balanço do banco ficou naturalmente mais restrita. “Nosso valor está mais na experiência e na presença global do que num cheque que entregamos ao cliente”, diz Magalhães.
Outra prioridade será conquistar contas de pequenas e médias empresas que precisarem de serviços internacionais. Não se sabe se a nova estratégia dará certo ou errado. Mas, pensando pequeno, o risco de decepção na frente é muito menor.