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A vida ficou mais dura no escritório Demarest & Almeida

Os desafios enfrentados pelo Demarest & Almeida, segundo maior escritório de advocacia do país

Lessa, do Demarest: história de 60 anos

Lessa, do Demarest: história de 60 anos

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Da Redação

Publicado em 25 de abril de 2011 às 15h16.

O Demarest & Almeida se consolidou na década passada como um dos maiores e mais conceituados escritórios de advocacia do país. Os números de seu crescimento impressionam. Há dez anos, a firma tinha 19 sócios e cerca de 80 advogados.

Nos anos seguintes, tornou-se uma potência, com 70 sócios, 310 advogados, 2 000 clientes e faturamento de aproximadamente 130 milhões de reais anuais -- e alterna-se semestre a semestre com Pinheiro Neto e Tozzini Freire no topo do ranking dos maiores escritórios brasileiros em número de advogados.

Demarest e Pinheiro Neto foram os pioneiros no chamado direito empresarial, aquele que presta assessoria jurídica a companhias. Essa assessoria vai desde a resolução de pequenos conflitos com consumidores até as transações mais sensíveis, estratégicas e rentáveis para as bancas: as fusões e aquisições.

Por vários anos, o Demarest ajudou a protagonizar as grandes ondas de fusões no país. Nos últimos tempos, porém, a competição nessa área vem se tornando cada vez mais acirrada -- e fica cada vez mais difícil manter-se no topo. Antes um dos líderes do segmento de fusões e aquisições, hoje o escritório tem diversas firmas menores e de pouca tradição à sua frente.

Isso, justamente, durante a maior temporada de compras de empresas da história do país, negócios bilionários, como a compra da Ipiranga pelo consórcio formado por Petrobras, Grupo Ultra e Braskem. A banca também tem tido uma atuação discreta nas operações de abertura de capital na bolsa, os IPOs.

Grandes escritórios especializados em direito empresarial têm um fluxo constante de trabalho, pois muitas empresas simplesmente terceirizam quase todo o seu departamento jurídico às bancas. As maiores oportunidades de crescimento, porém, vêm quando o ritmo de negócios fora desse arroz-com-feijão rotineiro aumenta.

Foi assim com as privatizações, nos anos 90. E é assim, hoje, com fusões e emissões de ações. As duas ondas representam uma grande oportunidade de expansão, e escritórios como Pinheiro Neto, Machado, Meyer e Mattos Filho têm se beneficiado disso -- hoje, estima-se que tais áreas representem mais da metade do faturamento dessas bancas.


No primeiro trimestre deste ano, o Pinheiro Neto foi contratado para assessorar fusões que somam 5,3 bilhões de dólares. O Machado, Meyer vem logo atrás, com 5,2 bilhões de dólares, e o Mattos Filho em seguida, com 1 bilhão.

No ano passado, o total de negócios assessorados pelos três somou quase 18 bilhões de dólares. Além disso, cada um desses escritórios ajudou a planejar dezenas de emissões de ações desde 2004. O Demarest, segundo a Thomson Financial, maior empresa de informações financeiras do mundo, soma 95 milhões de dólares em fusões anunciadas no primeiro trimestre e 555 milhões de dólares no ano passado -- e duas aberturas de capital nos últimos três anos.

"Estamos vivendo nossa melhor fase", diz Rogério Lessa, diretor-geral do Demarest, com sede em São Paulo. "A onda de IPOs é uma competição da qual não queremos participar. A concorrência é alta e as margens de lucro são muito baixas." Em relação à area de fusões e aquisições, Lessa afirma que a atuação do Demarest não está refletida com exatidão nas listas que medem o desempenho das grandes bancas de advocacia.

O Demarest, por exemplo, aparece na 17a colocação no ranking de escritórios mais importantes em M&A da América Latina produzido pela Thomson Financial. Na lista, que leva em conta os negócios anunciados no primeiro trimestre deste ano, outros seis escritórios brasileiros aparecem à sua frente. No ano passado, a banca não apareceu no ranking.

Lessa diz que o Demarest fez muito mais negócios do que os que aparecem na lista da Thomson Financial, tanto no ano passado como em 2007, e atribui sua colocação a problemas de comunicação. "Não estávamos acostumados a fazer marketing, a divulgar informações para que esses rankings fossem elaborados."

O BRASIL ASSISTIU NA última década ao nascimento das superbancas, escritórios de advocacia com faturamento superior a 100 milhões de reais. Ao atingir esse tamanho, firmas antes administradas de forma amadora, em que as decisões eram tomadas no corredor do café pelos sócios mais importantes, passaram a adotar métodos de gestão típicos de grandes empresas.


Criar conselhos de administração e a figura do sócio com cargo de presidente foram os primeiros passos. Algumas se associaram a firmas internacionais. A disputa por talentos cresceu e a agressividade comercial também.

Em seguida, começaram a surgir os problemas típicos de corporações desse porte. Um dos principais é a sucessão. Com os sócios-fundadores ultrapassando os 60 anos, as grandes bancas foram forçadas a abrir espaço para os mais jovens, um processo inevitavelmente doloroso. "Sem transição de poder entre gerações, nenhuma sociedade sobrevive", diz um veterano especialista em fusões. Algumas firmas são consideradas bons exemplos nesse quesito. No Pinheiro Neto, mais de 80% dos 69 sócios têm menos de 45 anos.

SER MENOS FORTE NAS AREAS tidas como o filé mignon do direito empresarial traz custos ao Demarest. Os escritórios não divulgam oficialmente seu faturamento, mas EXAME levantou qual a receita anual aproximada em 2006.

O Pinheiro Neto, maior escritório do país, com 341 advogados, teve receita de cerca de 220 milhões de reais, ou 645 000 por advogado. O Machado, Meyer faturou 200 milhões de reais no ano passado, ou 780 000 reais por advogado. O Demarest faturou cerca de 130 milhões de reais, média de 420 000 reais anuais por advogado.

Segundo oito ex-funcionários do Demarest ouvidos por EXAME, esses resultados explicariam a saída de advogados observada recentemente. Nos últimos três anos, pelo menos 40 advogados com no mínimo cinco anos de casa foram atraídos por outras bancas. Na segunda semana de junho, dez profissionais, entre eles dois altos sócios, Rubens Serra e Daniella Tavares, deixaram o escritório rumo à área de fusões e aquisições do concorrente Leite, Tosto e Barros.

"Estamos crescendo nessa área e fomos buscar gente competente no mercado", diz Ricardo Tosto, sócio da banca.De acordo com advogados ouvidos por EXAME nas últimas semanas, a sucessão é justamente um dos desafios enfrentados pelo Demarest.

Fundado em 1948 pelo americano Kenneth Demarest e pelo brasileiro João Batista Pereira de Almeida, o escritório já teve alguns dos mais renomados advogados do país, como Naum Rotemberg, Fortunato Bassani Campos e Altamiro Boscoli, considerado uma espécie de papa das fusões e aquisições. Rotemberg está aposentado, Fortunato morreu e Boscoli deixou o comando do escritório há três anos.


Lessa, o diretor-geral, tem 60 anos e terá de se aposentar compulsoriamente aos 65. Altamiro Boscoli ainda é chamado para participar das principais operações do escritório. No ano passado, ele assessorou a Votorantim Celulose e Papel na troca de ativos com a International Paper, um negócio de 1,1 bilhão de dólares.

Desafios como o enfrentado pelo Demarest e por outras bancas, como o Tozzini Freire, acirram ainda mais a concorrência entre os escritórios. Isso porque talentos formados pelos grandes costumam fundar escritórios menores, com custos mais baixos e altamente especializados.

Em 2001, o Machado, Meyer sofreu uma cisão que levou cinco dos sócios mais jovens a fundar um novo escritório, o Souza, Cescon (hoje um dos líderes em fusões). Em 2003, o Demarest também deu origem a outra banca, o KLA, fundado por Fernando Koury, um respeitado especialista em fusões.

Nessa competição, os preços cobrados caem e cada escritório luta para manter sua carteira de clientes a despeito do assédio crescente. Apesar do momentâneo recuo em segmentos importantes, o Demarest mantém clientes estratégicos, como a CPFL, maior grupo de energia elétrica do país, que rende aos cofres do escritório 4,5 milhões de reais por ano.

"Entregamos a eles 95% de nossos serviços jurídicos, dos mais simples aos mais complexos", diz Sérgio Figueira, diretor jurídico da CPFL. Manter clientes como esses será um desafio para as bancas brasileiras num cenário cada vez mais competitivo.

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