Revista Exame

Vida feliz na CBMM - o bônus foi de 9 salários para todos

Enquanto o Brasil lamentava o pibinho de 2012, a mineradora CBMM teve um ano ótimo. Cada um dos 1.800 funcionários ganhou nove salários de bônus. É o milagre do nióbio.


	CBMM: o Brasil tem 90% da reserva mundial de nióbio
 (João Lima/ Divulgação)

CBMM: o Brasil tem 90% da reserva mundial de nióbio (João Lima/ Divulgação)

DR

Da Redação

Publicado em 22 de fevereiro de 2013 às 22h30.

Araxá - O ano de 2012 não foi fácil para o Brasil. As más notícias econômicas pipocaram por todo lado. O pior aconteceu no fim do ano, quando ficou claro que a economia brasileira cresceria cerca de 1% em 2012. Mas, em dezembro, quem visitasse as montanhas de Araxá, no sudoeste de Minas Gerais, parecia estar entrando numa outra dimensão — uma dimensão em que absolutamente nada deu errado em 2012.

Ali, afinal de contas, está instalada a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), fortíssima candidata ao posto de empresa com a vida mais fácil do país. Apesar do nome genérico, a CBMM tem uma atividade muito específica. A mineradora tem, em Araxá, nada menos que 75% das reservas mundiais de nióbio, metal utilizado na composição do aço para torná-lo mais leve e flexível. O nióbio é usado em produtos tão diversos quanto foguetes e lâminas de barbear.

Como tem domínio absoluto do mercado mundial de um metal tão valioso, é difícil alguma coisa dar errado nas montanhas de Araxá. Quando EXAME­ visitou a sede da empresa, no fim de 2012, os 1.800 funcionários da CBMM estavam felizes da vida. Haviam acabado de receber nove salários, referentes à participação nos lucros. O bônus valeu para todos, inclusive o faxineiro. Enquanto o país lamentava o pibinho de 2012, a turma do nióbio gargalhava de alegria. 

Mas quem tem mesmo motivos para sorrir é a família Moreira Salles. Conhecido por sua trajetória no mercado financeiro, o clã tem há décadas um pé na mineração. Depois de criar o Unibanco, nos anos 20, a família se uniu ao Itaú e hoje tem 17% do maior banco brasileiro. A fatia vale cerca de 26 bilhões de reais. O que pouca gente sabe é que a família é dona da montanha mágica de Araxá desde os anos 70.

Em 2012, a CBMM faturou 4 bilhões de reais, 17% mais que no ano anterior. Sua margem de lucro é de 50%. Se não vale tanto, a participação acionária do clã na mineradora chega muito perto. Há dois anos, os Moreira Salles venderam participações minoritárias na CBMM para empresas chinesas e japonesas. A transação avaliou a mineradora em 26,9 bilhões de reais. A participação de 70% dos Moreira Salles na montanha de nióbio vale, portanto, quase 19 bilhões de reais.  


Além de ser encontrado nas rochas alcalinas de Araxá, o nióbio só foi achado — em proporções muito menores — em Goiás (onde é explorado pela Anglo American), no Amazonas e em regiões do Canadá e da Austrália. De acordo com a bolsa de Londres, o quilo de nióbio vale 90 dólares — ou 45 vezes mais do que 1 quilo de alumínio.

O metal vale muito porque, além de raro, é um componente fundamental em uma série de produtos industriais. Adicionando apenas 100 gramas de nióbio em cada tonelada de aço usada na produção de um automóvel, tem-se uma redução de 10% em seu peso, o que resulta em uma economia de 1 litro de combustível a cada 200 quilômetros percorridos. Em obras de infraestrutura, é possível utilizar nióbio para deixar o aço mais resistente e construir a mesma estrutura com um peso até 60% menor.

Tem-se, portanto, o melhor dos mundos. O tal nióbio vale muito dinheiro, Araxá tem 75% das reservas da Terra e a CBMM conta com uma capacidade para, no ritmo atual de exploração, vender o metal por mais 200 anos. Como se não bastasse tudo isso, a extração do nióbio de Araxá é de uma facilidade de causar inveja a qualquer minerador. O trabalho em nada lembra as custosas explorações de ouro, cobre ou minério de ferro.

O nióbio de Araxá fica na superfície. Os "mineiros" da CBMM, assim, jamais ficarão presos em túneis escuros em caso de acidentes. A exploração do nióbio da CBMM consiste em retirar a terra de uma enorme área de 4 quilômetros de largura por 4 de comprimento e levá-la para uma espécie de peneirão. É quando o nióbio, de cor azulada, é separado da terra comum para depois ser vendido para os clientes.

O negócio da CBMM é tão bom que até o lixo dá dinheiro. A empresa está desenvolvendo uma tecnologia que explora os rejeitos do minério e extrai novos elementos químicos que podem ser usados para a produção de itens como lâmpadas incandescentes e catalisadores automotivos. São as terras-raras, tão valiosas hoje em dia. É ou não é mágica a montanha de Araxá?


Tudo isso faz da CBMM uma empresa e tanto para trabalhar. Nenhum dos 1 800 funcionários recebe menos de 2 488 reais por mês — valor equivalente a quatro salários mínimos. Isso sem contar a já citada participação nos lucros. Além dos benefícios tradicionais, a empresa fornece terreno e material para que os funcionários construam sua casa. A CBMM subsidia também a educação dos filhos de funcionários, desde a pré-escola até a faculdade.

"Nossa rotatividade é menor que 1%. Podemos treinar nossos funcionários porque sabemos que eles vão permanecer conosco", diz Tadeu Carneiro, presidente da CBMM. É natural que a empresa acabe, também, sustentando Araxá. Os impostos pagos pela companhia correspondem a 70% da arrecadação do município. O time de futebol da cidade é patrocinado pela CBMM. O Araxá Futebol Clube conquistou a segunda divisão do Campeonato Mineiro em 2012. Até nisso o ano foi bom para a mineradora dos Moreira Salles.

Sócios asiáticos

Como era de esperar, a empresa está atraindo a atenção de investidores. Uma fatia de 30% da mineradora foi vendida em 2011 — até hoje não se sabe exatamente por quê, já que a empresa não tem problemas de caixa nem precisa fazer grandes investimentos. A CBMM se limita a dizer que a venda foi "estratégica".

Um consórcio japonês e um chinês dividem a fatia em partes iguais. Os chineses são os maiores clientes da mineradora, com 26% das vendas. Com parte do dinheiro da venda, Pedro Moreira Salles criou uma empresa de investimento, a Cambuhy, que tem 1 bilhão de dólares para fazer aquisições. Seu irmão, Fernando, é o membro da família responsável por administrar a CBMM.

A venda da participação aos investidores asiáticos acabou levando os holofotes para a CBMM. Recentemente, o Ministério Público de Minas Gerais anunciou que investigaria a natureza do negócio. Apesar de ganhar anualmente 25% dos lucros da mineradora, o estado de Minas não recebeu um único centavo dos 3,8 bilhões de dólares que a fatia na CBMM custou aos novos sócios japoneses e chineses.

O promotor de Justiça Eduardo Nepomuceno de Sousa afirma que em breve vai notificar a empresa e pedir explicações sobre a natureza de seu acordo com o estado de Minas Gerais, assinado, segundo ele, sem licitação nos anos 70. Todos estão de olho na montanha mágica de Araxá. 

Acompanhe tudo sobre:CBBMCBMMEdição 1033EmpresasIndústriaMineração

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda