Revista Exame

“A Índia precisa de uma Margaret Thatcher”

Para Gurcharan Das, um dos principais pensadores indianos, a ascensão da classe média vai transformar o panorama político de seu país e promover reformas liberais


	Gurcharan Das: "Metade dos indianos estará na classe média em 2020. É ela que vai forçar as mudanças"
 (BBC World Service/Creative Commons)

Gurcharan Das: "Metade dos indianos estará na classe média em 2020. É ela que vai forçar as mudanças" (BBC World Service/Creative Commons)

DR

Da Redação

Publicado em 13 de abril de 2013 às 15h04.

São Paulo - Há 17 anos, o indiano Gurcharan Das, ex-presidente da operação indiana da multinacional de bens de consumo Procter&Gamble, dedica-se a escrever sobre as idiossincrasias de seu país.

Formado em filosofia e política pela Universidade Harvard e autor de livros como India Unbound (“Índia desacorrentada”, numa tradução livre), Das defende reformas profundas nas instituições indianas — coisa que, diz ele, faria bem também ao Brasil. “Índia e Brasil se parecem muito.” Em recente visita a São Paulo, Das falou a EXAME.

1) EXAME - Até que ponto o modelo de crescimento indiano é sustentável?

Gurcharan Das - É quase heroica a forma como os empreendedores indianos prosperaram nos últimos anos. Ao contrário da China, temos uma sociedade forte sob um Estado fraco. Costumo dizer que a Índia cresce à noite, enquanto o governo dorme. Falta um Estado forte. E, assim como no Brasil, precisamos de instituições melhores. 

2) EXAME - Como seria esse Estado forte para a Índia?

Gurcharan Das - É bom salientar que um Estado forte não é um Estado autocrático. Nossos países precisam de um governo liberal fundado em três pilares: o estado de direito, a prestação de contas e a rapidez e eficiência das decisões. Também não falo de um Estado grande. Os melhores governos são pequenos e eficientes. 

3) EXAME - Por que as reformas realizadas na Índia na década de 90 não foram suficientes para alcançar esses objetivos? 

Gurcharan Das - As reformas atacaram os problemas de metade da economia. Falta a outra metade, que segue nas mãos do governo. As transações imobiliárias, por exemplo, são nebulosas, assim como as dos setores de mineração e educação. Quem quer abrir uma escola precisa conseguir 19 licenças — e cada uma delas corresponde a uma propina.

4) EXAME - O que falta para modernizar o Estado indiano?

Gurcharan Das - É necessário fazer privatizações e ter o governo na regulação do setor privado. Nosso Estado não se mexe onde se faz necessário, provendo segurança ou abastecimento de água. Mas é hiperativo onde não precisaria interferir. 

5) EXAME - O que é preciso fazer na Índia para que as mudanças que o senhor defende aconteçam? 

Gurcharan Das - O segredo para o nosso sucesso no futuro está na classe média. Veja como ela está crescendo rapidamente no Brasil. Na Índia, a classe média já representa um terço da população e será metade em 2020. Serão 600 milhões de pessoas. E a classe média é impaciente. Ela vai forçar as mudanças.

6) EXAME - Quanto tempo esse processo ainda pode levar? 

Gurcharan Das - Não dá para saber. Se tivermos sorte e elegermos um líder forte, um reformador ao estilo de Margaret Thatcher, há chance de que as mudanças sejam rápidas. 

7) EXAME - E por que até agora não emergiu um líder com essas características? 

Gurcharan Das - Um dos problemas da Índia é que nossos líderes são muito velhos. Metade da população do país tem menos de 26 anos. Não faz sentido, numa sociedade como essa, termos apenas líderes de 80 anos. O apoio a esse tipo de iniciativa virá da classe média, da juventude. Mas é sempre bom lembrar que vivemos em uma democracia, onde as pessoas votam — às vezes, nos candidatos mais estúpidos.

Acompanhe tudo sobre:ÁsiaClasse médiaEdição 1025ÍndiaMargaret Thatcherreformas

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda