O presidente Peña Nieto, do México: a reforma trabalhista reforçou a imagem do país (Ronaldo Schemidt/AFP)
Da Redação
Publicado em 6 de abril de 2013 às 08h00.
São Paulo - Nos três dias em que a presidente Dilma Rousseff ficou em Roma para encontrar o papa Francisco não faltou tempo para amenidades. Dilma fez turismo nas igrejas de Santa Maria Maggiore e São Paulo Extramuros e esteve com o companheiro José Graziano, ministro do governo Lula responsável pelo Fome Zero e hoje diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, com sede na capital italiana.
Sobrou um intervalo até para encontrar Borut Pahor, presidente da Eslovênia, país de 2 milhões de habitantes. Enfim, uma agenda leve. Teria dado tempo de sobra para que a comitiva desse uma passada em Madri, a apenas 3 horas de voo de Roma. Ali, nossas autoridades poderiam receber uma aula sobre como reformas econômicas podem fazer a diferença mesmo em situações extremas. Em 2012, o PIB na zona do euro teve uma retração de 0,6%.
Na Espanha, quarta maior economia do bloco, caiu 1,4%. Mas, enquanto outros países escolhem a negação dos problemas — a Itália, por exemplo, está desde fevereiro numa indefinição política que deixa o governo acéfalo —, os espanhóis foram à luta. O governo de Mariano Rajoy, do Partido Popular, não tem medido esforços para fazer a economia voltar a crescer e diminuir o desemprego que atinge um em cada quatro espanhóis. Os resultados, ainda tímidos, começam a aparecer.
O caso das reformas trabalhistas realizadas nos dois países é ilustrativo. Na Espanha, as mudanças feitas no ano passado reduziram as indenizações por demissões, diminuíram os impostos trabalhistas, ampliaram a idade de quem pode ser contratado como estagiário e tornaram a admissão e a demissão mais fácil para as pequenas empresas, as que mais empregam. “A reforma foi a mais importante em quase três décadas porque é estrutural e torna o país mais competitivo no cenário europeu”, diz o economista Sandalio Gómez, professor da escola de negócios Iese, com sede em Barcelona.
Efeito de longo prazo
Como mostra um estudo recente do FMI, A Promoção Imediata do Crescimento na Europa, reformas trabalhistas têm um período longo de maturação. Num primeiro momento, é comum a flexibilização do mercado de trabalho aumentar as taxas de desemprego, pois as empresas aproveitam as mudanças para demitir e aumentar a produtividade. No caso espanhol, a taxa de desemprego aumentou de 24% para 26% desde a aprovação da reforma.
No médio e longo prazo, no entanto, o saldo é positivo. Quando a economia começa a se recuperar, as empresas recontratam mais rapidamente. “Se você protege demais os empregos, interfere nas forças de mercado que conduzem à produtividade e ao crescimento. É melhor deixar o mercado agir e proteger os indivíduos diretamente, com seguros como o do desemprego”, diz o americano Michael Spence, vencedor do prêmio Nobel de Economia de 2001. Pelos cálculos do FMI, cinco anos depois de reformas trabalhistas, o PIB medido em dólares costuma ter um avanço adicional de 0,50%. Se somadas a outras reformas econômicas, o percentual pode chegar a 5%.
Na Espanha, começam a aparecer os primeiros sinais positivos da flexibilização. Nos últimos meses, três montadoras de automóveis anunciaram planos de expansão. A Volkswagen irá investir 1 bilhão de dólares nos próximos cinco anos na fábrica em Landaben, na região do País Basco. A Ford decidiu fechar uma fábrica na Bélgica e transferir a produção para sua unidade de Valência. Em fevereiro, a Renault anunciou que irá contratar 1 300 trabalhadores nas suas quatro fábricas espanholas até o final de 2016. Estima-se que a produção de veículos no país cresça 11% neste ano.
O histórico recente da Itália no quesito leis trabalhistas é completamente outro. O governo do ex-primeiro-ministro Mario Monti fez o que pôde. Em junho de 2012, o Parlamento reduziu a multa por demissão e facilitou a contratação temporária, mas não mexeu no essencial: o direito de a Justiça ordenar a reintegração de trabalhadores que não foram demitidos por justa causa. Como os juízes decidem em favor dos empregados em metade dos casos, as empresas costumam apelar para a demissão em último caso.
Num ambiente em que é tão difícil mandar embora um trabalhador, a decisão de contratar é sempre demorada. O desemprego na Itália — de 11,7% — está um pouco abaixo da média da zona do euro, mas por um efeito estatístico: muitos italianos deixaram de procurar emprego. “As mudanças nas leis ajudaram um pouco a entrada dos jovens no mercado, mas não foram profundas o suficiente”, diz o economista Tito Boeri, diretor da Fundação Rodolfo Debenedetti, com sede em Milão e especializada em temas trabalhistas. De janeiro a setembro de 2012, a Itália atraiu apenas 1,2 bilhão de dólares em investimentos estrangeiros. No mesmo período, a Espanha recebeu 11 bilhões.
De certa forma, México e Brasil replicam na América Latina os papéis adotados por Espanha e Itália na Europa. A partir de novembro de 2012, o México passou a permitir a contratação de funcionários por determinado número de horas e a assinatura de contratos de teste entre empresas e empregados. Essa reforma, somada às realizadas pelo presidente Enrique Peña Nieto, reforçou a imagem do país como o novo “queridinho” do mercado. Enquanto isso, no Brasil, os impostos trabalhistas ainda equivalem a 41% do lucro das empresas, índice muito acima da média mundial. Sem dúvida, Dilma poderia ter trocado o turismo em Roma por uma visita de trabalho à Espanha.