Revista Exame

Os preços irresistíveis das churrascarias

Fartura e qualidade por pouco dinheiro. Qual é a mágica por trás dos preços irresistíveis das churrascarias?

EXAME.com (EXAME.com)

EXAME.com (EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 2 de setembro de 2011 às 15h24.

Domingo, 22 de abril, 11 e meia da manhã. Edson Camargo, dono da churrascaria Super Grill da Vila Maria, na Zona Norte de São Paulo, observa ansioso os primeiros clientes que começam a chegar no amplo salão. Para a casa fechar o dia no lucro, é preciso que até as 23 horas pelo menos 500 pessoas passem pelas 80 mesas. Cada cliente pagar 14,90 reais pela refeição.

Gaúcho de Sarandi, Camargo vive ao redor de grelhas e espetos desde que chegou a São Paulo, em 1979. Começou como copeiro numa churrascaria e, poupando 70% do salário, levou dez anos para se tornar sócio em outro restaurante. Há quatro anos, montou seu próprio negócio. Hoje possui três churrascarias que, juntas, faturam 400 000 reais por mês.

Camargo protagoniza apenas uma entre as centenas de histórias de sucesso ligadas a um negócio que cresce a uma taxa de 10% ao ano desde 1995. Passam pelas 180 churrascarias da Grande São Paulo 2 milhões de fregueses por mês, a preços que variam de 9 a 30 reais. "Nem no Sul as pessoas são tão apaixonadas pela carne", diz o também gacho Ari JosNedeff, de 53 anos, sócio da rede Novilho de Prata, com nove restaurantes na metrópole, e presidente da Associação das Churrascarias de São Paulo (Achuesp).

Por trás de tamanha procura, existe um motivo tão sedutor quanto o cheiro da carne na brasa: o preço. A grande maioria dos restaurantes do ramo pratica o sistema de rodízio, que curiosamente foi inventado em Registro, cidade paulista na beira da rodovia BR-116, num restaurante para caminhoneiros.

Graças ao rodízio, é possível servir, a preços irresistíveis, um almoço com variados tipos de carne, acompanhado por um generoso bufê que, nas melhores casas, chega a incluir iguarias como sashimi de salmão e salada de coração de alcachofra. Numa churrascaria à la carte com tal requinte e variedade uma comilança equivalente não sai por menos de 50 reais.

Qual a mágica para cobrar preços tão baixos? "A churrascaria do tipo rodízio opera de um modo diferente do restaurante tradicional", afirma Camargo. "Como já sabemos com antecedência o que o cliente vai comer, o planejamento fica mais fácil." Numa churrascaria, não há o risco de um pacote de lulas ficar encalhado no congelador até seguir para o lixo. Tampouco é preciso pagar um alto salário para um chef de cozinha - afinal, o manuseio do espeto dispensa treinamento sofisticado.


O preço baixo e o intenso movimento de público formam um círculo virtuoso que se completa com a compra de carne em grandes quantidades. Em fornecedores especializados, as churrascarias se abastecem por preços entre 20% e 30% abaixo da média do mercado. Esse é o desconto oferecido pelo Frigorífico Independência, que vende carne para 80 rodízios de São Paulo, num total de 180 toneladas por mês.

O quilo de costela sai por 3 reais, o de cupim e o de fraldão custam 4 reais e a carne mais cara, a picanha nobre, atinge a faixa dos 12 reais. "S no conseguimos preos melhores porque a carne para churrascaria precisa atender a um padro especfico que nem todos os frigorficos seguem", afirma o consultor Marcos Kieling. "Enquanto o cliente comum quer a carne o mais magra possvel, o churrasqueiro prefere os cortes com muita gordura, que realam o sabor do prato."

A aparente simplicidade da carne em rodzio engana os desavisados. Para vender comida de qualidade a preos populares, a churrascaria trabalha com margens de lucro de apenas 10%, bem abaixo dos 25% da mdia dos restaurantes. A palavra de ordem, ento, evitar o desperdcio - um duro desafio num negcio em que a fartura um dos principais atrativos. "O segredo controlar a circulao das carnes malpassadas, que podem ser assadas novamente e voltar para o rodzio, garantindo a sada de todo o estoque", diz Olavo Pton, outro scio da Novilho de Prata.

Os donos de churrascarias garantem que ainda h muito campo para crescer em São Paulo, mas recomendam cautela na escolha do lugar. "A concorrncia enorme", afirma Nedeff, o presidente da Achuesp. Na dcada de 70, quando as casas de rodzio de carne comearam a se multiplicar na cidade, muitos optaram por se instalar nas imediaes da Marginal Tiet. A preferncia se deve ao intenso movimento de caminhes na regio, bero do primeiro restaurante do gnero na cidade, a Churrascaria Bela Rio, inaugurada em 1972. Hoje o trecho da Marginal entre as pontes da Freguesia do e Aricanduva abriga, somadas as vias adjacentes, 15 churrascarias.

Além da localizao - e, claro, da opulncia do cardpio - um requisito bsico para o sucesso dos rodzios est na afirmao da imagem gauchesca. O cuidado vai do figurino, ao estilo bombacha-e-bota, ata escolha de nomes associados aos pampas. Regra fundamental: os garons e demais auxiliares costumam ser oriundos dos trs Estados meridionais - Paran, Santa Catarina e, em dois teros dos casos, do Rio Grande do Sul. "Os sulistas se adaptam com mais facilidade a esse servio porque j esto acostumados com o churrasco desde a infncia", afirma Aleixo Ongaratto, dono da Churrascaria Fogo de Cho.

O mtodo mais frequente de recrutamento de mão de obra também é o mais simples - a indicao por parentes e amigos que j trabalham no ramo. Entre os maiores exportadores de churrasqueiros se destacam os municpios da serra gacha, como Nova Brscia e Sarandi. O motivo? que foi de l que vieram alguns dos pioneiros do negcio na metrpole. "Eu j trouxe mais de 200 jovens para trabalhar em So Paulo", afirma Edson Camargo, da Super Grill. No ltimo domingo de abril, ao contabilizar o movimento do seu restaurante na Vila Maria, Camargo se mostrava satisfeito. "Atendemos hoje 580 pessoas, 80 a mais do que o necessrio."

Acompanhe tudo sobre:ChurrascariasPreçosRestaurantes

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda