Revista Exame

Mesmo com lucro menor, Petrobras segue gigante no Brasil e aposta em 'transição energética'

A presidente da Petrobras, Magda Chambriard, defende projetos de combustíveis fósseis, como a exploração na Foz do Amazonas, enquanto aposta em energias renováveis, com a volta do etanol ainda neste ano

Magda Chambriard, presidente da Petrobras: “Quem apostar contra a Petrobras vai perder dinheiro” (Leandro Fonseca /Exame)

Magda Chambriard, presidente da Petrobras: “Quem apostar contra a Petrobras vai perder dinheiro” (Leandro Fonseca /Exame)

Publicado em 25 de setembro de 2025 às 22h00.

Desde a primeira edição de Melhores e Maiores da EXAME, em 1974, a Petrobras sempre foi destaque no ranking entre as cinco maiores empresas em faturamento, conquistando o primeiro lugar por 12 vezes até 2023. Como a maior companhia do Brasil, a estatal representa 5% da receita das empresas Melhores e Maiores deste ano, somando 490 bilhões de reais em receita bruta em 2024.

O ano passado, no entanto, foi bem desafiador para a companhia, que encerrou 2024 com lucro líquido 70% menor em comparação a 2023, passando de 125 bilhões para 37 bilhões de reais. A desvalorização cambial devido às tensões do Oriente Médio e a antecipação de investimentos em grandes projetos, como a plataforma do Campo de Búzios, são alguns dos motivos que justificam a queda do lucro, que aconteceu mesmo com uma receita praticamente estável (um recuo de apenas 4%), somando 490 bilhões de reais em 2024.

Apesar da pressão no último ano, a estatal continua gigante. Com faturamento equivalente a cerca de 3% do PIB brasileiro, segue como a maior empresa do país e já apresenta resultados positivos em 2025. No segundo trimestre deste ano, a companhia saiu de um prejuízo de 2,6 bilhões de reais no ano passado para um lucro de 26 bilhões de reais, uma variação positiva de 28,6 bilhões de reais em comparação ao mesmo período de 2024. A melhora recente foi impulsionada por aumento de produção, câmbio favorável com valorização do real diante do dólar e ganhos de eficiência nos campos do pré-sal, especialmente em Búzios — campo que gerou um grande investimento em 2024.

Com o desafio de novas perfurações, como a Foz do Amazonas, e da transição energética, a empresa se movimenta ao apostar no que a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, chama de adição energética.

“Todas as renováveis [etanol, biodiesel, eólica e solar] sempre tiveram a participação e o empurrãozinho da Petrobras. No passado recente saímos do etanol, mas nossa meta é voltar ainda neste ano. Estamos falando de um futuro que terá a combinação de fontes fósseis e renováveis”, diz Chambriard, que viu em sua gestão a diretoria da estatal ter pela primeira vez maioria de mulheres na liderança.

“Na década de 80, quando eu entrei na Petrobras, mulher não podia embarcar em plataforma nem pernoitar em instalações de campo. Hoje temos mulheres embarcadas, chefiando refinarias e liderando grandes áreas.”

Em entrevista exclusiva à EXAME, durante visita à redação para participar do podcast “De frente com CEO”, Magda Chambriard, presidente da Petrobras, compartilha os desafios de sua trajetória e os próximos passos da estatal - que continua em movimento.

Plataforma no Campo de Búzios: unidade atingiu 225.000 barris por dia (Petrobras/Divulgação)

  

Diante dos desafios e das oportunidades do mercado, qual será o papel do pré-sal para a estatal nos próximos anos?

Nossos estudos mostram que até 2030/2032 teremos aumento de produção, mas depois virá o pico e o declínio, que precisará ser compensado com novas reservas. É por isso que estamos fazendo tanto esforço em exploração e na busca de novos horizontes. Estamos investindo na margem equatorial [como se fosse um complemento da produção do pré-sal daqui a uns seis a dez anos] e na Bacia de Pelotas, no Rio Grande do Sul, ambas muito promissoras.

Há alguns embates sobre a exploração na Foz do Amazonas. Quais são os riscos envolvidos?

Bom, primeiro vamos falar um pouquinho sobre o que é a Bacia da Foz do Amazonas. Porque, quando falamos da Bacia da Foz do Amazonas, parece que é ali na Ilha de Marajó, mas não é lá, não. Estamos querendo furar a 540 quilômetros da Ilha de Marajó, a 185 quilômetros do Oiapoque, mar adentro, numa lâmina d’água que é de mais de 2.000 metros, ou seja, a área que nós estamos querendo perfurar é uma área distante, de águas ultraprofundas. Não tem nada a ver com a Ilha de Marajó, não tem nada a ver com a Foz do Amazonas — é um infortúnio do nome. Então, quem não está preocupado com a praia de Copacabana deveria relativizar a preocupação em relação à perfuração nas águas ultraprofundas do estado do Amapá.

O mercado fala muito hoje sobre energia renovável. Quais são os planos da Petrobras nessa agenda?

Se o etanol começou no Brasil, foi graças à Petrobras. Isso vale para o biodiesel, cuja inserção só aconteceu com o apoio da companhia. Todas as renováveis [etanol, biodiesel, eólica e solar] sempre tiveram a participação e o empurrãozinho da Petrobras. No passado recente saímos do etanol, mas nossa meta é voltar ainda neste ano, ampliar o biodiesel e avançar em combustíveis carbono neutro, eólica e solar. Estamos presentes nessa agenda, seja com projetos, seja com aquisições, seja com pesquisa e desenvolvimento, e por isso defendemos o que chamamos de “adição energética”.

O que significa, na prática, esse conceito de “adição energética”?

Estamos falando de um futuro que terá menos participação de fontes fósseis, mas ainda terá uma participação relevante, pelo menos pelas próximas três décadas, com participação crescente das energias renováveis. É por isso que, quando falamos de transição energética, falamos também de “adição energética”, ou seja, a combinação de fontes fósseis e renováveis.

Qual é o impacto dessa “adição energética” no desenvolvimento de um país?

Os países que mais consomem energia per capita são também os que têm maior desenvolvimento humano. O Brasil, por exemplo, é uma das dez maiores economias do mundo, mas ainda é um país pobre em energia quando olhamos a disponibilidade per capita. Para chegarmos ao nível de consumo da África do Sul, precisaríamos produzir 50% a mais; para nos aproximarmos da Europa, teríamos de colocar de pé praticamente outro Brasil em energia. Se queremos avançar nesse índice, precisamos gerar muito mais energia e, para isso, usar todas as fontes — fósseis e renováveis.

No caso do tarifaço de Donald Trump, a Petrobras sofrerá algum impacto?

Nosso principal mercado é o brasileiro. Exportamos muito para a Ásia e uma parte menor para os Estados Unidos. No fim, o petróleo foi excluído do tarifaço, então não sofremos esse impacto. E, de qualquer forma, podería-mos ter deslocado essa exportação para outros mercados.

O preço dos combustíveis continua sendo uma questão sensível. Por que a redução do preço da Petrobras não chega ao consumidor?

A Petrobras perdeu a ponta da distribuição e por isso hoje vendemos até a refinaria. Daí em diante, quem define o preço é a distribuidora e a revenda. Então, muitas vezes, quando reduzimos o preço, essa diferença vira margem de lucro da cadeia e não chega ao consumidor final.

Sobre a produção de fertilizantes, isso faz parte da estratégia da Petrobras?

Sim. Neste momento estamos colocando em operação fábricas que estavam hibernadas ou finalizando unidades que estavam próximas da conclusão. É o caso das Fafens [Fábricas de Fertilizantes Nitrogenados], na Bahia e em Sergipe, que voltam a produzir fertilizantes, além da unidade de Mato Grosso do Sul, que estamos concluindo. O objetivo é entregar fertilizantes ao país e, ao mesmo tempo, ampliar o mercado de gás natural.

Recentemente, a britânica BP anunciou uma das maiores descobertas em 25 anos no pré-sal brasileiro. Qual é o impacto disso para a Petrobras?

Pelo que eu ouvi falar na imprensa, a BP fez uma descoberta no pré-sal, mas, como toda descoberta, ela ainda precisa ser avaliada, e essa avaliação é que vai ditar o potencial da jazida, se isso é comercial ou não. No momento, a descoberta da BP está em fase bem inicial, mas ela não nos impacta, porque nós já temos muitas descobertas em desenvolvimento e ainda temos bastante coisa a desenvolver. O que eu posso dizer para a BP é: “Boa sorte, tomara que seja uma coisa bem grande, porque o Brasil merece”.

A diretoria da Petrobras conseguiu neste ano ter maioria feminina na direção pela primeira vez na história. Foi um processo intencional da sua gestão?

Eu simplesmente dei oportunidade igualmente para homens e mulheres. Hoje são oito diretores, quatro mulheres e quatro homens, e comigo são cinco mulheres. O que chamou atenção foi o equilíbrio. Isso mostra que a Petrobras aposta em diversidade e inclusão.

Você chegou a enfrentar barreiras de gênero no setor de engenharia?

Sim. Ainda na faculdade, trabalhando em obras do metrô no Rio de Janeiro, presenciei preconceito. Um dia, lembro que cheguei para acompanhar a concretagem e tudo parou. Depois, meu chefe explicou, rindo: “Eles acham que mulher na obra dá azar”. Isso mostra bem as barreiras daquela época. Hoje, felizmente, a realidade mudou bastante.

Você ingressou na Petrobras na década de 1980. Como era a estrutura da companhia para receber mulheres naquela época?

Era bem diferente. A assistência médica da Petrobras, por exemplo, cobria as mulheres dos engenheiros, mas não os maridos das engenheiras. E, quando perguntávamos o motivo, a resposta era: “Não queremos que eles explorem vocês”. Mulher também não podia embarcar em plataforma nem pernoitar em instalações de campo. Com o tempo, isso foi mudando. Hoje temos mulheres embarcadas, chefiando refinarias, liderando grandes áreas. A cultura evoluiu.

Como você enxerga a posição da Petrobras no cenário global?

A Petrobras é uma das grandes empresas de petróleo do mundo e a maior empresa do Brasil. Temos como pares a Shell, a BP, a Total, a Exxon, a Chevron e a Equinor no ranking global. Mas sempre gosto de reforçar que não existe futuro para uma petroleira sem exploração. Estamos investindo na margem equatorial e na Bacia de Pelotas, mesmo sabendo que a exploração envolve riscos elevados. Por isso, ampliamos nossa base de atuação: também buscamos oportunidades em outros países, principalmente na margem atlântica da África, que tem grande similaridade geológica com o litoral brasileiro. Ainda assim, nosso alvo sempre será o Brasil.

O que sustenta sua confiança no futuro da Petrobras?

A Petrobras é uma tremenda geradora de caixa. A produção sai todo dia e está aumentando. Antecipamos a entrada de plataformas, interligamos poços muito mais rápido [o que levava um ano hoje leva cerca de sete meses]. Em Búzios, uma única plataforma de 225.000 barris por dia atingiu a capacidade com apenas cinco poços — tem país que não produz isso. Quem diz que a Petrobras vai mal não está olhando direito. Por isso eu afirmo: “Quem apostar contra a Petrobras vai perder dinheiro”. 



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