Revista Exame

A agonia do BVA e a tentativa de reabertura pelos sócios

Os últimos dias do banco, hoje sob intervenção do Banco Central, e o que os sócios estão fazendo para tentar reabri-lo


	BVA: Ivo Lodo, ex-presidente do banco, usou até dinheiro próprio para tentar um resgate
 (Divulgação)

BVA: Ivo Lodo, ex-presidente do banco, usou até dinheiro próprio para tentar um resgate (Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 12 de novembro de 2012 às 18h21.

São Paulo - Empréstimos feitos por amigos, sócios em disputa, choradeira nos corredores e até ameaças de morte. Um pouco de tudo ocorreu na última semana de funcionamento do BVA, o sétimo banco de médio porte com problemas no país em menos de dois anos e que desde o dia 19 de outubro está sob intervenção do Banco Central.

Durante quase duas semanas, EXAME ouviu 12 pessoas, entre ex-profissionais do BVA, executivos de mercado e funcionários que participaram da negociação de empréstimos para o banco — sempre com a garantia de que seus nomes não seriam citados.

Os depoimentos ajudaram a reconstituir os dias anteriores à intervenção — e também indicam o que está por vir. Desde então, os sócios vêm tentando levantar recursos para reabrir o banco. Veja, a seguir, os principais detalhes do episódio.

Terça-feira 16 de outubro 

O fundador do BVA, o carioca José Augusto Ferreira dos Santos, reuniu documentos de bens que ele e Ivo Lodo, presidente do banco, tinham e podiam servir de garantia num empréstimo de 630 milhões de reais que estava sendo negociado com o Fundo Garantidor de Créditos (FGC), uma associação mantida pelos bancos.

O dinheiro era necessário para o BVA cumprir os requisitos mínimos de capital do Banco Central. Os principais bens eram uma fazenda em Mato Grosso e um loteamento industrial em São Gonçalo, no Rio de Janeiro. Segundo um ex-executivo do BVA, os bens valiam cerca de 1 bilhão de reais. O FGC achava que valiam a metade. Mas faltavam provas de que estavam disponíveis para servir de garantia. 

Inicialmente, outro sócio do banco, Carlos Alberto de Oliveira Andrade, dono da rede de concessionárias Caoa, e um dos maiores clientes do BVA, Cleber Faria, da família fundadora da Cervejaria Petrópolis, haviam se comprometido a participar do empréstimo com 500 milhões de reais. Segundo executivos que acompanharam as negociações, Andrade desistiu no meio do caminho.

Sem ele, Faria também desistiu e Ferreira dos Santos e Lodo decidiram tentar levantar todo o dinheiro com o FGC. (Procurados, os sócios não deram entrevista.)

Quarta-feira 17 de outubro

Os rumores de que havia problemas no BVA ganharam força, e os gerentes do banco passaram a receber ligações de clientes que queriam sacar recursos. De acordo com um ex-executivo da instituição, os gerentes eram orien­tados a informar que o banco estava passando por uma reestruturação, mas que não iria faltar dinheiro. A ordem era evitar os resgates de qualquer maneira.


Os clientes do BVA eram, principalmente, pequenos e médios empresários e alguns investidores individuais, atraídos pelas altas taxas oferecidas. Nesse dia, Ferreira dos Santos e Lodo disseram a alguns executivos do banco que havia grandes chances de o FGC conceder o empréstimo em poucos dias.

Quinta-feira 18 de outubro

O FGC informou aos sócios que as garantias eram problemáticas — alguns imóveis nem estavam registrados em cartório. Pressionados, Ferreira dos Santos e Lodo disseram a pessoas próximas que haviam levantado 100 milhões de reais — 20 milhões saíram do patrimônio pessoal de Lodo e o restante foi emprestado por amigos.

Eles também haviam acertado a venda do helicóptero Agusta Power, que pertencia ao banco e era avaliado em 14 milhões de reais. O plano dos sócios era anunciar essa injeção de recursos no dia seguinte, junto com a divulgação dos resultados do primeiro semestre e com o nome de David Barioni, ex-presidente da TAM, como novo presidente do banco.

O balanço, que estava dois meses atrasado, traria um prejuízo de 100 milhões de reais e uma ressalva dos auditores da KPMG, chamando a  atenção para a necessidade de uma capitalização. Mas os banqueiros mostrariam que a perda estava coberta. Quem visitou a sala de Lodo à tarde ouviu dele que o plano era vitorioso. 

No BC, porém, o clima era outro. Anthero Meirelles, diretor de fiscalização, passou o dia em contato com a direção do FGC para saber se o BVA havia entregado novas garantias para o empréstimo. Diante da negativa — e da informação de que haveria uma injeção de apenas 100 milhões de reais —, Meirelles e outros diretores do BC decidiram intervir. (Procurados, BC e FGC não deram entrevista.) 

Sexta-feira 19 de outubro

Por volta das 6 horas da manhã, os diretores do BC e o procurador-geral da instituição, Isaac Sidney, reuniram-se novamente e aprovaram, formalmente, a intervenção.


Às 9 horas, sete funcionários do BC de São Paulo entraram no escritório do BVA, que fica na avenida Faria Lima, e colaram na porta de vidro uma folha de papel sulfite com o decreto oficial da operação. Pelo menos dois funcionários foram ameaçados de morte por telefone por clientes revoltados com as perdas que teriam.

Segunda-feira 22 de outubro

O escritório do BVA foi ocupado pela equipe de interventores do BC, que realocaram os funcionários do banco. Quem trabalhava na área comercial, que ficou inoperante porque o banco parou de funcionar, passou a cuidar de atendimento aos ex-clientes e a ajudar o BC com informações.

O Banco Central contratou a consultoria PricewaterhouseCoopers para analisar os números da instituição e determinar o tamanho do prejuízo. A previsão é que a avaliação dure até dezembro deste ano. Além disso, a Polícia Federal abriu um inquérito para apurar se houve fraude. O BVA respondia por apenas 0,2% dos depósitos do sistema financeiro.

Terça-feira 23 de outubro

Às 11 horas, Oliveira Andrade foi ao escritório do FGC em São Paulo para dizer que tinha interesse em comprar o banco. De acordo com pessoas que analisaram os números do banco, ele teria cerca de 600 milhões de reais na instituição. “Para os sócios, seria interessante que alguém comprasse o BVA e liberasse o dinheiro bloqueado. Mas não há muitos interessados”, diz uma pessoa que está acompanhando de perto o BVA.

Se assumisse a instituição, Oliveira Andrade poderia unir as operações à sua financeira, que concede crédito para a compra de veículos. Em paralelo, Ferreira dos Santos e Lodo continuam conversando com o FGC para tentar salvar o BVA. Quem ficar com o BVA deverá desembolsar um valor suficiente para cobrir o rombo anterior e também os pagamentos feitos pelo FGC para ressarcir ex-clientes. Esse valor, hoje, ainda não é conhecido.

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