Revista Exame

3 bilhões de reais da CSN para nada

Benjamin Steinbruch, dono da siderúrgica CSN, gastou a dinheirama acima comprando ações da concorrente Usiminas. E perdeu 1 bilhão de reais

Benjamin Steinbruch, da CSN: dono de 16% das ações de uma rival problemática (Murillo Constantino/EXAME.com)

Benjamin Steinbruch, da CSN: dono de 16% das ações de uma rival problemática (Murillo Constantino/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 21 de junho de 2012 às 09h21.

São Paulo - Há investimentos que dão errado, e há investimentos que dão muito errado. O empresário Benjamin Steinbruch, controlador da CSN, terceira maior siderúrgica do país em volume de produção, lida com as consequências de uma aposta que, até agora, vem se encaixando com exatidão na segunda categoria.

Em boa parte dos últimos dois anos, Steinbruch arquitetou e executou um plano que, se desse certo, reduziria drasticamente a liderança da Gerdau na fabricação de aço. O objetivo era unir sua CSN à rival Usiminas, segunda maior do país. Discretamente, ele começou a comprar ações da Usiminas na bolsa de valores.

Ação vai, ação vem, acabou gastando um valor estimado em  3 bilhões de reais por analistas do HSBC  — virou dono de 12% das ações com direito a voto, 20% das preferenciais e, disparado, o maior acionista individual. Mas, desde o fim do ano passado, o plano foi desmoronando.

Primeiro, a siderúrgica ítalo-argentina Techint comprou, em novembro, o controle da Usiminas. No início de abril, a Comissão de Valores Mobiliários julgou que a Techint não era obrigada a estender a oferta aos minoritários — ou seja, que os demais acionistas, Steinbruch incluído, não receberiam o mesmo preço por ação pago pela Techint para entrar no bloco de controle da empresa.

Pouco depois, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, órgão de defesa da concorrência, impediu Steinbruch de indicar representantes para o conselho de administração da Usiminas, direito que ele teria pela fatia que detém. Por isso, nem palpitar na estratégia da concorrente ele vai poder.

Ao fim do processo, Steinbruch acabou dono de 16% do capital total da Usiminas. No cenário que se desenha hoje, não é uma posição de causar inveja a ninguém.

De concreto, o plano de transformar a CSN na maior empresa de aço do Brasil fez com que, até agora, Steinbruch perdesse cerca de 1 bilhão de reais — sem ter nada em troca. Isso porque suas ações na Usiminas valem, hoje, 30% menos do que valiam quando foram compradas. É uma situação ingrata — e sem solução simples.

Para Steinbruch, a maneira mais rápida de se livrar do problema seria vender sua participação na bolsa. Mas inundar o mercado com mais de 160 milhões de ações poderia baixar ainda mais o valor de um papel cujo preço caiu 40% nos últimos 12 meses — no mesmo período, o Ibovespa caiu 14%.


Outra possibilidade seria encontrar um comprador para toda a sua participação na siderúrgica. Mas a que preço? E quem estaria disposto a gastar tanto para não apitar em nada no dia a dia da Usiminas? A empresa tem um bloco de controle formado pelos japoneses da Nippon Steel e pela Techint — juntos, eles detêm 23% de participação.

"É pouco provável que os controladores se interessem pela parte de Steinbruch, já que isso não traria mais direitos a eles”, diz Jonathan Brandt, analista de siderurgia e mineração do banco HSBC. “Com os problemas na empresa, há investimentos mais emergenciais por fazer.”

Além disso, os dividendos pagos pela Usiminas caíram à metade no último ano, tornando uma eventual participação na empresa menos atraente. Procurados, nem Steinbruch nem os executivos da Usiminas deram entrevista.

Das três grandes siderúrgicas brasileiras, Usiminas e CSN são as que competem de forma mais direta. Ambas têm como principal produto os aços planos vendidos para diversos segmentos industriais (a Gerdau, maior do país, é líder em aços longos, usados, por exemplo, na construção civil).

Era natural, portanto, que um torcesse contra o outro. Eis, então, o aspecto mais bizarro da atual situação de Benjamin Steinbruch. A melhor solução para seu investimento é que a Usiminas ganhe mercado, dê lucro — dê certo, enfim, o que poderia impulsionar o valor de suas­ ações.

Mas nem isso está fácil. No último ano, as receitas da Usiminas caíram 8% e encerraram 2011 abaixo de 12 bilhões de reais, o mesmo nível de 2004. O lucro caiu 70% na comparação com 2010, de longe o pior resultado do setor e o mais baixo da Usiminas em uma década.

Colocar a empresa de volta nos trilhos não é uma tarefa trivial. Com a freada na economia dos países ricos, nações como o Brasil se tornaram prioridade para siderúrgicas chinesas, o que tirou espaço das empresas locais e baixou preços. A participação da Usiminas na venda de aço bruto, que já foi de 32% em 2008, hoje é de 27%.

A Usiminas é a empresa que mais depende da indústria automotiva, de onde vem um terço das receitas — e a venda de veículos caiu em março pelo terceiro mês consecutivo. Somando tudo, a produção da empresa diminuiu 25% em cinco anos, enquanto os custos subiram 20%.

Não por acaso, desde que assumiu o comando da Usiminas, em janeiro, a Techint elegeu como prioridade o corte de custos. Um grupo de 25 executivos da matriz acompanha de perto áreas como comercial e de operações à caça de gordura para queimar.  


Uma leva de cortes de custos, por mais necessária que seja, não será suficiente para fazer a Usiminas dar o salto que precisa. Com o mercado de aço na situação em que está hoje, todas as empresas do setor concentram investimentos na produção de minério de ferro. A gaúcha Gerdau está procurando um sócio para seu braço de mineração.  

A Usiminas já produz 50% do minério que utiliza em suas usinas, mas o número ainda é tido como pequeno (a CSN é praticamente autossuficiente tanto em minério quanto em energia, o que faz dela a mais rentável do setor). Além disso, a empresa está endividada demais.

Em maio, a agência de classificação de risco Moody’s rebaixou a nota da Usiminas e ameaçou repetir a dose caso a dívida não caia a um patamar inferior a quatro vezes sua geração de caixa (o número atual é de 4,8 vezes). Com uma empresa endividada e precisando investir, os controladores da Usiminas podem ser obrigados a fazer um aumento de capital na companhia — que poderia diluir a participação da CSN.

Futuro

Com tanto por fazer, pouca gente parece confiar numa virada. EXAME ouviu nove analistas de mercado responsáveis por acompanhar a Usiminas. Apenas um indica a seus clientes que aproveitem o momento de baixa para comprar mais ações. Quatro recomendam a venda.

E os outros quatro sugerem a “manutenção” das ações, um eufemismo que, entre os acionistas, equivale a algo como “pule do barco assim que possível”. Uma mostra de como está o mercado: as ações ordinárias da empresa caíram 7% no dia 16 de maio porque o banco americano Morgan Stanley a retirou de um de seus índices de ações latino-americanas.

No dia seguinte, as coisas não melhoraram nada: a ação da Usiminas teve um dos piores desempenhos entre aquelas que compõem o Índice Bovespa. Nos últimos tempos, o único momento de respiro aconteceu no dia 10 de maio, quando o jornal Folha de S. Paulo divulgou que o governo estaria estudando, a pedido de Steinbruch, um pacote de medidas para proteger as siderúrgicas brasileiras. Ele pedia ajuda, claro, para sua CSN. Mas, desta vez, para a concorrência também.

Acompanhe tudo sobre:Benjamin SteinbruchCSNEdição 1017EmpresáriosEmpresasEmpresas abertasEmpresas brasileirasIndústriaSiderurgiaSiderurgia e metalurgiaSiderúrgicas

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda