Nepomuceno, presidente da Mirabela: vendas garantidas até 2014 (Germano Luders)
Da Redação
Publicado em 29 de julho de 2011 às 15h57.
São Paulo - Na tarde de 26 de junho, cinco analistas de mineração representando bancos e fundos de investimento canadenses desembarcaram no aeroporto de Salvador com uma agenda pouco comum aos investidores que visitam o país. No roteiro, nada de minas da Vale ou da sul-africana Anglo American.
De lá, o grupo seguiu em outro voo para uma região até bem pouco tempo atrás ignorada no mapa da mineração mundial. É ali, nas cercanias de Itagibá, cidade de pouco mais de 15 000 habitantes a 370 quilômetros da capital baiana, que fica a mina Santa Rita, a maior descoberta de níquel no Brasil nos últimos 20 anos.
A jazida foi parar nas mãos de três investidores australianos após um rápido processo de licitação conduzido pelo governo da Bahia em outubro de 2003 — mas, tão logo foi adquirida, uma série de estudos comprovou que a reserva, inicialmente estimada em 18 milhões de toneladas, era na realidade quase dez vezes maior.
Feitas as contas, os australianos levaram cerca de 1 bilhão de dólares a mais que o esperado — e, de quebra, tornaram-se donos da terceira maior jazida de níquel do país. O governo baiano, é bom que se diga, não saiu perdendo. É que a negociação foi feita com base no pagamento de royalties até que a mina seja exaurida — ou seja, os australianos pagarão ao governo uma porcentagem do que retirarem. Os analistas gostaram do que viram.
"A base do projeto está quase completa. A Santa Rita deve se tornar em breve uma operação de nível mundial", escreveu David Charles, do banco de investimento GMP Securities, em seu relatório.
Embora desconhecidos por aqui, os australianos Bill Clough, Nicholas Poll e Craig Burton, que arremataram a Santa Rita, são veteranos no negócio de mineração. Clough é um dos fundadores da Serabi Mining, especializada na extração de ouro no Nordeste do Brasil, Poll trabalhou 20 anos na mineradora australiana WMC, adquirida pela também australiana BHP em 2005, e Burton investe em níquel na Austrália e na África há pelo menos dez anos (os dois últimos deixaram o negócio em 2010).
Para adquirir a jazida, o trio criou uma empresa chamada Mirabela Nickel, em alusão à fazenda onde se localiza a jazida. Para financiar a nova empresa, os três decidiram abrir o capital da Mirabela nas bolsas do Canadá e da Austrália em 2004 e 2007. A promessa de dinheiro fácil — o níquel descoberto na Santa Rita é do tipo sulfetado, raro e de fácil extração, o mesmo que o encontrado nas minas da Vale no Canadá —, aliada à expertise do grupo no setor atraiu bancos e fundos de investimento.
O americano J.P. Morgan e o Perpetual, um dos maiores bancos da Austrália, junto com outros investidores, injetaram 700 milhões de dólares na empreitada. “A Mirabela tornou-se um achado não só pela qualidade do níquel encontrado mas também por ter começado a operar rapidamente”, diz Geoff Breen, analista do banco RBC Capital Markets.
Parceria com o governo
Boa parte dessa agilidade pode ser creditada à maneira como a empresa se desenvolveu. Ao contrário do que geralmente acontece, os investidores da Mirabela já sabiam de antemão que se tratava de uma jazida de níquel quando decidiram entrar no negócio, graças a estudos preliminares realizados a partir de 1998 pela Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM), subordinada ao governo do estado.
A prospecção, no entanto, não havia avançado por uma questão de custos — no caso da Mirabela, estimava-se que os gastos com pesquisa poderiam facilmente superar 120 milhões de reais. "Para não arcar com isso, os governos repassam o restante da pesquisa à iniciativa privada", diz Paulo Camillo, presidente do Instituto Brasileiro de Mineração.
"A CBPM até imaginava que a Santa Rita poderia dispor de um volume muito maior de minério do que os 18 milhões de toneladas encontradas nos estudos iniciais, mas não tinha embasamento técnico para ter certeza. E gigantes como a Vale e a CSN acharam o projeto pequeno e não se interessaram."
Em vista disso, o governo baiano sugeriu que os australianos fizessem a prospecção por conta própria. Em troca, levariam a mina sem desembolsar nada pela jazida — apenas pagando royalties pelo minério.
Antes de realizar seu primeiro embarque, em 2009, a Mirabela já estava com toda a sua produção comprometida até 2014 em contratos fechados com a Votorantim e a finlandesa Norilsk, de cerca de 2 bilhões de dólares. "Vamos dobrar a produção até o final do ano que vem", diz Luis Carlos Nepomuceno, presidente da empresa. "A Mirabela tem muito espaço para crescer."