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'Tremembé': assistir a séries de true crime faz mal? Psicólogo tem a resposta

Entenda como a psicologia explica o fascínio e os efeitos do consumo de produções true crime

Tremembé: o que explica o sucesso de séries true crime? (Amazon Prime Video/Reprodução)

Tremembé: o que explica o sucesso de séries true crime? (Amazon Prime Video/Reprodução)

Maria Eduarda Lameza
Maria Eduarda Lameza

Estagiária de jornalismo

Publicado em 8 de novembro de 2025 às 06h00.

Última atualização em 8 de novembro de 2025 às 11h28.

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'Tremembé' já é a série nacional com mais audiência no Prime Video desde a chegada da plataforma no Brasil em 2026. A produção true crime, lançada na última semana, em 31 de outubro, acompanha os bastidores da penitenciária localizada no interior de São Paulo.

A série é baseada nos livros do jornalista Ullisses Campbell e conta a história dos "famosos" que estão detidos em Tremembé. Entre os nomes mais conhecidos estão Suzane von Richthofen, Elize Matsunaga, Daniel e Cristian Cravinhos, Alexandre Nardoni e Roger Abdelmassih. Os crimes cometidos por esses personagens incluem estupro e assassinato de pais, cônjuges e crianças.

Além de ser a melhor estreia brasileira nesse streaming, 'Tremembé' também é um dos assuntos mais comentados nas redes sociais. Essa não é a primeira vez que uma produção sobre crimes reais toma conta do debate público. Em 2022, o podcast 'A Mulher da Casa Abandonada' expôs a história de Margarida Bonetti.

Ela vivia em em um casarão deteriorado no bairro de Higienópolis, uma área nobre de São Paulo. Foragida do FBI, ela voltou ao Brasil após ser acusada, junto com o marido, Renê Bonetti, de manter uma mulher em condições análogas à escravidão nos Estados Unidos por mais de 20 anos. A vítima foi submetida a abusos físicos e emocionais, tendo ossos quebrados e direitos negados. Enquanto Renê foi preso, Margarida escapou e se refugiou na antiga casa dos pais.

O podcast revelou detalhes sobre os crimes e a vida da protagonista, gerando enorme repercussão nas redes sociais. O interesse público transformou o casarão em atração turística, com pessoas visitando, fotografando e até vandalizando o local. Após o lançamento do podcast, a casa foi alvo de tiros e vandalismo, levando Margarida a abandoná-la. O sucesso foi tanto que, em 2025, a história virou uma série documental, também do Prime Video.

Sucesso true crime

Entre janeiro de 2018 e março de 2021, as séries documentais registraram um aumento de 63%, sendo o true crime o maior subgênero dessa categoria. Esses dados são de um relatório da Parrot Analytics, uma empresa global de rastreamento de mídia. O estudo ainda revelou que, em 2023, o Brasil correspondeu por metade de toda a demanda por histórias de crimes reais na América Latina, o que, segundo a companhia "reforça o papel central do país no crescimento do gênero."

A Netflix e a Max detêm juntas 60% da oferta de true crime, mas a Parrot Analytics afirma que a demanda continua muito maior do que essas duas plataformas conseguem atender. A concentração de produções e a tendência de crescimento do gênero no país podem explicar o investimento do Prime Video nesse tipo de produção nacional.

Mas, afinal, o que explica o tamanho interesse em obras sobre crimes reais? Em entrevista à EXAME, O psicólogo e pesquisador da Universidade de São Paulo, André Rizzi, afirma que existe uma curiosidade mórbida por trás do fascínio por true crime. “O maior motivo que leva as pessoas a consumirem esse tipo de conteúdo é tentar entender a mente dos criminosos, a psicologia do que leva alguém a cometer um crime, o que é o bem e o mal.”

Perfil dos fãs de crimes reais

Rizzi cita um estudo feito este ano pela Universidade de Graz, uma das maiores e mais antigas da Áustria. A partir da análise de uma série de testes e questionários feitos com diferentes grupos focais, os pesquisadores concluíram que o publico de true crime é majoritariamente feminino, entre 70% e 93%.  O perfil também é composto por pessoas mais jovens e com maior renda.

O professor destaca que existe uma diferença entre o tipo de conteúdo criminal consumido por homens e mulheres. “Mulheres consomem especialmente podcasts e livros; homens, mais séries, filmes e vídeos no YouTube.” André Rizzi afirma que essa distinção é importante para entender os efeitos que o true crime tem em cada público, mas, um fator constante é o peso da autenticidade: "as pessoas gostam de coisas reais."

É muito diferente assistir a um crime real de ver uma ficção ou jogar um videogame violento, explica o especialista. “No true crime, a pessoa sabe que é real, e isso muda completamente a forma como o cérebro reage."

Regulação emocional

A preferência feminina por esse gênero pode ser explicada por um conceito da psicologia chamado 'regulação emocional'. O especialista explica que, para mulheres, consumir conteúdos sobre crimes reais é uma forma de habituação com a violência que ajuda a regular as emoções sobre essa temática. "O consumo tem um caráter de proteção."

"É o que chamamos de vigilância defensiva, quase um mecanismo de autopreservação. É como se fosse um treino mental inconsciente para identificar perigos, reconhecer perfis de agressores e evitar situações de risco", afirma Rizzi. “True crime funciona como uma espécie de simulação mental, ensinando estratégias de enfrentamento e prevenção.”

Quando a violência atrai

Para uma parcela menor do público, o motivo por trás do fascínio por true crime é a adrenalina do perigo. Rizzi diz que "homens tendem a se atrair mais pelo suspense, pela excitação emocional e pela violência explícita". A pesquisa traçou o perfil de parte dos homens que se interessam principalmente por séries e filmes de crimes reais e encontrou o que a psicologia chama de 'personalidade antagonista'.

Essa personalidade apresenta três características principais:

  • Agressividade;
  • Baixa amabilidade e pouca empatia;
  • Traços de narcisismo, manipulação e até psicopatia subclínica, isto é, quando não existe um diagnóstico formal.

Tais atributos são o que o especialista chama de 'tríade sombria'.

Assistir true crime faz mal?

Outro dado que o estudo austríaco revelou é que, ao contrário do que André Rizzi imaginava, assistir true crime não necessariamente aumenta a ansiedade e pode, na verdade, diminuí-la. “Ver um filme de terror ou uma série de crime real serve, em certa medida, para a gente aprender a lidar com o medo. É como treinar o corpo na academia: ao se estressar um pouco, o organismo se fortalece. O mesmo vale para a mente", diz.

Rizzi ainda explica que a forma como essas produções são construídas, por meio de trilha sonoras que geram suspense e a criação de narrativas envolventes, também faz parte do processo de regulação emocional: "criar tensão de propósito aumenta a tolerância ao fator estressor e pode até ter um efeito psicoterapêutico, especialmente em podcasts e livros.”

Por outro lado, esse processo de habituação tem um efeito colateral que o especializa caracteriza como preocupante: a normalização da violência. “As pessoas passam a ver casos de crime com naturalidade, o que pode diminuir a sensibilidade social.” Ainda não há estudos que analisem os impactos coletivos das produções sobre crimes reais.

“Não sabemos ainda se o consumo de true crime pode, a longo prazo, aumentar a violência, mas existe essa possibilidade."

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