Heloisa Teixeira: escritora e professora teve grande relevância no cenário intelectual do país nos últimos 60 anos (Academia Brasileira de Letras/Divulgação)
Repórter
Publicado em 28 de março de 2025 às 12h32.
Última atualização em 28 de março de 2025 às 13h32.
Morreu nesta sexta-feira, 28, no Rio de Janeiro, a acadêmica, escritora, pesquisadora e professora emérita da UFRJ, Heloisa Teixeira, aos 85 anos. A notícia foi confirmada pela Academia Brasileira de Letras e pela editora de seus livros.
Reconhecida como uma das principais pensadoras do feminismo brasileiro, Heloisa Buarque de Hollanda, nome com o qual era conhecida até então, surpreendeu ao revelar, em entrevista ao jornal O Globo em 17 de julho de 2023, que estava tomando uma decisão ousada: aos 83 anos, optou por abandonar o sobrenome herdado de seu primeiro marido, o advogado e galerista Lula Buarque de Hollanda, já falecido, e adotar exclusivamente o sobrenome materno.
Onze dias depois, ela tomou posse na Academia Brasileira de Letras já com a nova identidade: Heloisa Teixeira.
Essa mudança de nome, a essa altura da vida, seria impensável para muitos, mas não para Heloisa, que sempre se manteve conectada às novas ideias e à arte contemporânea. Em um gesto simbólico de sua transformação, ela chegou a tatuar o novo nome nas costas.
Nascida em 26 de julho de 1939, em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, Heloísa Teixeira formou-se em Letras Clássicas pela PUC-Rio em 1961. Em 1964, iniciou sua especialização em teoria da literatura e foi admitida como professora auxiliar de ensino na UFRJ, onde se tornou titular em 1969.
Sua trajetória acadêmica seguiu com mestrado e doutorado em Literatura Brasileira pela UFRJ, além de pós-doutorado em Sociologia da Cultura na Universidade de Colúmbia, em Nova York. Ao longo de sua carreira, manteve seu foco nas relações entre cultura e desenvolvimento, com ênfase em áreas como poesia, relações de gênero e étnicas, culturas marginalizadas e cultura digital.
Entre 1983 e 1984, Heloisa foi diretora do Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro (MIS/RJ) e, em 1986, fundou a Coordenação Interdisciplinar de Estudos Culturais (Ciec) na UFRJ, laboratório de pesquisa focado nas questões literárias de raça e gênero, movendo seu foco de pesquisa da literatura marginal para essas novas áreas.
Sua vasta produção acadêmica inclui livros como 26 Poetas Hoje (1976), Macunaíma, da Literatura ao Cinema (1978), Impressões de Viagem; Cultura e Participação nos Anos 60 (1979), O Feminismo como Crítica da Cultura, Guia Poético do Rio de Janeiro, Asdrúbal Trouxe o Trombone: Memórias de uma Trupe Solitária (2004), e Enter — Antologia Digital e Escolhas, Uma Autobiografia Intelectual. Em obras como Marginais Anos 70, Heloisa refletiu sobre a cultura alternativa da época, e mais recentemente, lançou Rebeldes e Marginais: Cultura nos Anos de Chumbo (1960-1970) e Confissões de uma Mulher Divorciada.
Sua trajetória pessoal está intimamente ligada à cultura brasileira das últimas seis décadas. Um exemplo emblemático disso é a festa de Réveillon de 1968, descrita no livro 1968 — O Ano que Não Terminou, de Zuenir Ventura, que aconteceu na casa dela e de Lula, decorada com sucata de demolição. Este evento, que contou com a presença de figuras como Glauber Rocha e Millôr Fernandes, foi marcante para a sociedade carioca, com 17 casamentos desfeitos durante a noite.
Nos últimos anos de sua vida, longe de se conformar com a aposentadoria, Heloisa continuou a produzir intensamente. Lançou os livros Onde é que estou? e Pensamento Feminista Hoje, além de estrear no Canal Brasil uma série que investigava as lutas femininas e a influência do pensamento decolonial.
Em abril de 2023, Heloisa foi eleita para a 30ª cadeira da Academia Brasileira de Letras, sucedendo Nélida Piñon. Ela se tornou a décima mulher a ocupar esse cargo na história da instituição.