Alexandre Magno e Maurício Medeiros, da WeShape (Marcelo Almeida)
Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h48.
Nos próximos quatro anos, mais de 60 novos shopping centers devem ser inaugurados no Brasil — sem contar outras dezenas de projetos que estão para sair do papel. Incorporadoras, administradoras e redes de varejo que depois vão ocupar os pontos de venda quando tudo estiver pronto estão atrás de fornecedores para construir, decorar e manter cada um desses centros comerciais. Por trás da explosão está o aumento do poder aquisitivo dos brasileiros e o dinheiro de investidores no setor. Esse mercado começou a se aquecer há pelo menos quatro anos — desde 2006, mais de 70 shoppings foram inaugurados no país. Até 2014, as quatro principais incorporadoras planejam investir pelo menos 2 bilhões de reais. "Há um enorme potencial de negócios para empreendedores interessados em fornecer para shoppings", diz Luiz Fernando Veiga, presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers, que reúne as principais empresas do setor. Nas próximas páginas estão histórias de cinco pequenas e médias empresas que já estão aproveitando essas oportunidades. São casos como o da curitibana WeShape, que faz projetos que ajudam os lojistas a atrair consumidores. Há também o exemplo do Grupo Linx, de São Paulo, de sofwares especiais para o varejo. A reportagem mostra ainda dois pequenos e médios negócios que têm conquistado clientes ao oferecer produtos e serviços para cortar custos — a baiana Omni Light, que faz projetos para diminuir o consumo de energia, e a carioca Astech, que vende equipamentos para reduzir gastos com segurança.
Atração no ambiente
O trabalho da WeShape convida o consumidor para entrar na loja
O arquiteto Maurício Medeiros, de 42 anos, passa boa parte de seu tempo livre olhando vitrines em shopping centers. "É uma fascinação que eu tenho", diz. "Fico atento ao modo como a luz incide sobre os produtos, como os itens foram organizados e de que outra forma aquela cena me estimularia a entrar na loja e a comprar algo." O interesse de Medeiros por vitrines não deixa de ser uma obrigação profissional. Ele e o publicitário Alexandre Magno, de 45 anos, são sócios da paranaense WeShape, agência de Curitiba que vem crescendo nos últimos anos ao ajudar redes de varejo a superar um desafio frequente para quem mantém um ponto num shopping — fazer com que a loja seja notada em meio às distrações do ambiente, como a decoração dos corredores, o burburinho dos demais consumidores e as vitrines das lojas vizinhas. "Existe muita coisa disputando a atenção dos clientes", afirma Medeiros. "É preciso saber como fisgá-los."
Neste ano, as receitas da WeShape devem chegar a 5 milhões de reais, 42% mais do que em 2009. Boa parte do faturamento vem de clientes que estão aumentando sua presença nos shoppings, como a rede Quiosque Brahma (espécie de microcervejaria da fabricante de bebidas AmBev) e as lojas de material esportivo Nike Sportswear. Parte do trabalho da WeShape é descobrir maneiras de tornar uma loja mais confortável e atraente. "O resultado que nossos clientes esperam do nosso trabalho é o aumento nas receitas", diz Medeiros.
Para atingir esse objetivo, às vezes a WeShape sugere modificações nas vitrines ou um redesenho dos móveis e expositores. É o que vem sendo feito para um dos clientes da WeShape, a rede de perfumes e cosméticos O Boticário. A WeShape está desenvolvendo o projeto de um espaço nas lojas da rede onde os clientes ficarão mais à vontade para experimentar amostras de perfumes e cosméticos.
Em casos muito extremos, a recomendação da WeShape pode ser até mudar uma loja de lugar dentro do shopping. "Às vezes, um ótimo ponto para uma sapataria não é bom para uma relojoaria", diz Medeiros.
Metamorfose ambulante
A Linx cresceu muito ao se adaptar às mudanças do varejo
Nos últimos anos, os sócios Alberto Menache, de 37 anos, e Nércio Fernandes, de 47, aproveitaram a expansão dos shoppings nas grandes cidades para impulsionar o próprio negócio, o Grupo Linx, de São Paulo. Em pouco mais de uma década, eles transformaram uma empresa modesta que vendia sofwares para lojistas dos bairros paulistanos do Brás e do Bom Retiro — dois centros de comércio popular — num fornecedor de serviços para grandes cadeias de varejo como Zara, C&A e Hering. " crescimento dos shoppings de 2000 para cá foi importantíssimo para nossos negócios", diz Menache. "Sem os grandes centros comerciais e as redes de varejo que crescem junto com eles, dificilmente teríamos um volume de negócios para sustentar o desempenho que tivemos na última década."
Em 2010, as receitas da Linx devem chegar a 130 milhões de reais, 62% mais que no ano passado. Menache e Fernandes acreditam que a Linx está preparada para crescer ainda mais com a ebulição de shoppings que começam a ser inaugurados. Diferentemente da última década, agora há empreendimentos em regiões onde a presença dos shoppings era tímida, como no interior do Sul e do Sudeste e nos centros maiores do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. "Em cada novo shopping há 200 ou 300 clientes em potencial", diz Menache.
O que a Linx oferece para conquistá-los é um pacote de sistemas que permite às redes de varejo administrar boa parte do ciclo de vendas. Esses sofwares servem, por exemplo, para controlar o fluxo de caixa e o recebimento das vendas por cartão de crédito e para administrar a reposição de estoque dos armazéns para as lojas. “Conseguimos prestar serviços para toda a cadeia do varejo”, diz
Menache. "Nosso principal alvo são as grandes redes, que precisam de tecnologia para administrar filiais, ou franqueados, que podem
estar em qualquer shopping do país."
A trajetória do Grupo Linx é um exemplo de como as mudanças num mercado podem abrir oportunidades para pequenos e médios negócios capazes de se adaptar. Em parte, o crescimento da empresa é fruto da profunda alteração no varejo brasileiro nos últimos anos. Quando a Linx foi fundada, em 1985, havia menos de uma dezena de shoppings no país e a maior parte dos consumidores tinha nas lojas de ruas comerciais praticamente a única opção para as compras. O cenário hoje é bem diferente. Desde 2000, a participação dos shoppings nas vendas anuais do comércio varejista subiu de 13% para quase 20%. "Percebemos os primeiros sinais dessa mudança no final dos anos 90", diz Menache. "Desde então, concentramos nossa energia em conquistar clientes que cresciam nos shoppings."
Uma das primeiras medidas que Menache e Fernandes tomaram para ganhar mais clientes nos shoppings foi em 2003. Naquele ano, eles criaram a Linx Telecom — braço do negócio que oferecia aos lojistas uma conexão com a internet para que outros sofwares do Grupo Linx pudessem trocar informações com seus fornecedores, seus centros de distribuição e operadoras de cartões de crédito. "Foi um passo importante, pois na época a conexão de internet era mais cara e nem sempre o custo podia ser absorvido pela loja".
Com o desempenho dos últimos anos, o Grupo Linx vem adotando uma estratégia mais agressiva. Em fevereiro, a empresa recebeu um aporte de capital do BNDESPar, braço de participações do BNDES, que ficou com 21,7% do negócio. Parte dos recursos foi usada na aquisição de cinco empresas de tecnologia para o varejo — as duas últimas compras foram uma empresa paulista e outra gaúcha, na primeira semana de dezembro.
Ajuste no fIgurIno
A Expor recupera no Brasil a rentabilidade que foi perdida com as exportações
No início de outubro, um lote de manequins saiu da fábrica da Expor, em Avaré, no interior paulista, com destino a um shopping prestes a ser inaugurado no município de Sete Lagoas, em Minas Gerais — o primeiro da cidade, hoje com mais de 400 000 habitantes. Os bonecos foram comprados por redes de vestuário que estavam se preparando para abrir as lojas. O mineiro Marcos Andrade, de 43 anos, viu no negócio dois motivos para comemorar. "Primeiro, fiz uma boa venda para os comerciantes que vão abrir negócios no shopping", disse Andrade. "Segundo, comecei a esperar pelos pedidos de quem tem loja na rua, que quase sempre reage à chegada desses centros comerciais com investimentos para reformar um ponto de venda ou redecorá-lo."
A explosão de novos shoppings no Brasil não poderia chegar num momento mais apropriado para a Expor. Em média, 30% da produção da empresa é exportada para os mercados americano, europeu e asiático. Nos últimos tempos, com o real valorizado, a Expor
tem enfrentado dificuldades para manter seus produtos competitivos no mercado externo. "Em volume, estamos vendendo mais para os clientes de fora do país, mas a rentabilidade das exportações está em queda", diz Andrade. "O mercado brasileiro tem ajudado a recuperar nossas margens."
Os negócios no Brasil também estão ajudando a empresa a retomar o crescimento, afetado no ano passado pela crise do primeiro semestre, quando muitos clientes no exterior cancelaram encomendas. Neste ano, as receitas devem chegar a 30 milhões de reais, 30% mais que em 2009. "Geralmente fazemos bons negócios com lojistas de shoppings", diz Andrade. "Eles investem mais em novidades e trocam os manequins com mais frequência que os donos de lojas de rua."
Manequins podem ser considerados um instrumento bastante tradicional para o varejo — principalmente se comparados a ferramentas
que hoje ajudam essas redes a aumentar as vendas, como sofwares para avaliar o perfil dos clientes ou projetos de arquitetura e iluminação feitos para induzir o consumidor a comprar mais por impulso. Mas o segredo da sobrevivência dos manequins pode estar
justamente na capacidade que esse tipo de objeto tem para dar ao consumidor uma sugestão bastante clara de como se vestir e combinar as peças. "Numa liquidação, o manequim é imbatível", diz Andrade. "Se houver encalhe, basta vestir as peças num boneco
desses que, em pouco tempo, as vendas aumentam." Andrade diz que, nas lojas de roupas, as peças que os manequins vestem podem representar até 70% das vendas.
Durante muito tempo, pouca coisa mudou nos manequins. Recentemente Andrade vem investindo no desenvolvimento de modelos
que fujam do comum. Um exemplo é a linha de manequins e-models. Para produzir uma dessas peças, a Expor precisa submeter uma modelo a uma espécie de scanner em três dimensões para copiar as formas de seu corpo eletronicamente (daí a origem do nome e-models). No ano passado, Andrade negociou com a rede de varejo C&A a produção de um manequim com as formas do corpo da modelo Isabeli Fontana. "Num manequim como esse, nosso objetivo é repetir no boneco algo da personalidade de quem serviu de modelo", afirma Andrade. "É possível reproduzir alguma posição ou uma expressão no rosto, por exemplo."
Para continuar crescendo, Andrade está trabalhando na ampliação da rede de representantes no Brasil. Uma das primeiras medidas é contratar mais vendedores para a Expor em regiões que estão em franco crescimento, como o Nordeste, onde há muitos shoppings prestes a ser inaugurados ou em diferentes etapas de construção. A empresa já possui representantes nessa região, mas precisa de mais gente para atender melhor os clientes, sobretudo quem compra manequins pela primeira vez. É o caso de franqueados de redes de vestuário que acabaram de abrir o negócio e não têm grandes ideias de como vestir um manequim."É comum encontrar clientes assim nos shoppings que ficam fora dos grandes centros”, afirma Andrade.
À luz das lojas
A Omni ajuda os shoppings a encontrar formas de reduzir os custos com energia
As empresas que administram shoppings costumam pagar caro para manter o ambiente cheio de luzes e refrigerado pelo ar-condicionado — em média, as despesas com energia elétrica representam 45% de seus custos. O baiano Eduardo Barbalho Cardoso,
de 36 anos, encontrou nessas contas de luz uma oportunidade de negócio. Ele é dono da Omni Light, que fabrica luminárias e faz projetos para reduzir o consumo de eletricidade. Nos últimos dois anos, um quinto das receitas da empresa, que em 2010 devem chegar a 15 milhões de reais, foi obtido com projetos e venda de material elétrico para lojistas e administradores de shoppings. "Eles estão ávidos por encontrar formas de reduzir custos", diz Cardoso. "A animação é grande quando digo que é possível diminuir a fatura de energia."
Embora os shoppings não sejam seus únicos clientes — a Omni também trabalha para hotéis, indústrias, construtoras e hospitais—, Cardoso considera esse mercado estratégico para o crescimento da empresa. É comum que, depois de fechar um contrato com a administradora, os lojistas o procurem para fazer projetos de iluminação para seus pontos de venda. "Além disso, os shoppings costumam renovar pelo menos uma parte das instalações elétricas, como lâmpadas e luminárias, a cada semestre", diz Cardoso. "Isso é importante porque nos proporciona receitas recorrentes que não conseguimos com outros tipos de cliente."
Para diminuir o consumo de energia nos shoppings, os engenheiros e técnicos da Omni estudam formas de usar lâmpadas mais eficientes — como as de LED, até 90% mais econômicas que uma convencional — sem perder os efeitos de luz projetados pelos arquitetos. Em alguns casos, a empresa também faz sugestões de fontes alternativas de energia, como no caso recente de um projeto para instalar, no teto do shopping, painéis de células fotovoltaicas.
Cardoso descobriu o potencial para crescer com os shoppings em 2002, pouco tempo depois de abrir a empresa. Ele criou a Omni após voltar de uma temporada em Portugal, onde cursou MBA e conheceu um empreendedor cujo negócio era fazer projetos para reduzir o consumo de energia das empresas. "Comecei da maneira mais simples", diz ele. "Eu visitava arquitetos e construtoras para vender lâmpadas fluorescentes compactas, que na época eram as mais econômicas." Numa ocasião, Cardoso foi convidado a participar de uma concorrência para fornecer as lâmpadas dos banheiros de um shopping de Salvador. Ele ganhou o contrato e percebeu o potencial
que havia para crescer com projetos de eficiência energética com esse tipo de cliente.
Os shoppings ajudaram a Omni a abrir novas frentes de negócio. "Fazemos projetos porque não basta ter uma lâmpada mais econômica se a instalação for feita de forma inadequada", diz Cardoso. A Omni também produz, numa fábrica em São Paulo, suas próprias luminárias. "Uma luminária que não reflete bem a luz pode anular os ganhos de eficiência”, afirma ele. Agora, Cardoso faz planos para ampliar sua atuação para outros estados da Região Nordeste. Nos últimos anos, quase 75% das receitas da Omni vieram de clientes da Bahia. "Já comecei a negociar com representantes que vão vender nossos projetos e serviços em Pernambuco e Sergipe", diz ele.
Câmeras no patinete
A Astech desenvolve equipamentos para a segurança dos shoppings
A empreendedora Simone Almeida, de 39 anos, encontrou nos shoppings o caminho para fazer negócios pelo Brasil inteiro. Ela é dona da Astech, do Rio de Janeiro, que produz sistemas de segurança e monitoramento. Até cinco anos atrás, seu principal negócio era fornecer câmeras e montar circuitos fechados de TV, desses utilizados para vigiar residências e condomínios de luxo. Na época, praticamente todos os clientes da empresa ficavam no estado do Rio — até que, no final de 2005, Simone foi procurada por um shopping carioca interessado em comprar câmeras para monitorar seus corredores. "Fechei o negócio e, pouco tempo depois, recebi o telefonema do gerente de um shopping nordestino que pertencia ao mesmo grupo", afirma ela. "Foi quando percebi ter encontrado uma boa oportunidade para alargar os horizontes de minha empresa." Desde então, os shoppings ganharam peso nos negócios da Astech e em 2010 vão responder por 52% das receitas, que devem chegar a 5,3 milhões de reais — praticamente o dobro do faturamento de três anos atrás. "Hoje, atendo shoppings em quase todos os estados brasileiros", diz Simone.
Um dos trunfos de Simone para manter a expansão da Astech é a capacidade de adaptar tecnologias já existentes de uma maneira que atenda às necessidades dos shoppings. Recentemente, ela juntou câmeras de circuito fechado de TV a um sofware que permite usar as imagens para contar quantas pessoas há pelos corredores — uma informação que pode ser útil para refazer o planejamento da segurança ou definir áreas em que é preciso tomar medidas para atrair mais consumidores. A empresa também equipou patinetes motorizados, usados pelos vigilantes, com câmeras que transmitem imagens em tempo real à central de segurança. "Com esse produto, um único funcionário pode monitorar até o triplo da área normal", diz Simone. "O shopping reduz custos com mão de obra e ainda melhora a qualidade do serviço."