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Por que você, empreendedor, não deve ligar tanto para um MBA

Um mundo que funciona a base de software requer novas habilidades e novas escolas. Entenda por que os MBAs estão perdendo seu glamour.


	O fim dos MBAs: alguém roubou o glamour de fazer cursos do tipo. E isso tem tudo a ver com a massificação da internet
 (Reprodução/Thinkstock)

O fim dos MBAs: alguém roubou o glamour de fazer cursos do tipo. E isso tem tudo a ver com a massificação da internet (Reprodução/Thinkstock)

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Da Redação

Publicado em 13 de maio de 2016 às 06h00.

Tem um famoso ditado no Silicon Valley que diz o seguinte: “Quando for avaliar uma startup nova, adicione 500 mil dólares para cada engenheiro e subtraia 250 mil para cada MBA” (Aaron Patzer, fundador do Mint).

Minha intenção aqui não é tirar onda da galera que fez MBAs, embora isso seja altamente tentador. Eu mesmo fiz uma escola de administração, em 2001, e seria difícil ganhar do Dilbert, então nem vou tentar.

A maioria das pessoas investindo tempo, dinheiro e esforço em um MBA concordaria sobre três vantagens fundamentais que ganharam com seus cursos:

1. A rede de alunos/ex-alunos;
2. O reconhecimento no mercado da sua habilidade de ser aceito em difíceis processos de seleção; e
3. A cultura business que adquiriu durante o programa.

MBAs floresceram em uma era, a segunda parte do século 20, na qual companhias viram a rápida comoditização de seus produtos. Na maior parte da economia dessa época, tudo se resumia a quão bem a empresa conseguia convencer o cliente de escolher a sua marca, o marketing, e quanto dinheiro você deveria gastar para alcançar mais pessoas, as finanças.

E essas são basicamente as duas coisas principais que você vai aprender no seu MBA. Como vender  e como ser financiado.

Naquela época, a Meca era indiscutivelmente Nova Iorque, com apenas duas ruas interessantes: Wall Street, para conseguir o dinheiro, e a Madison Avenue, famosamente ilustrada na série “Mad Men”, para gastá-lo. Mas aí veio a internet e mudou tudo!

Com todo mundo online, você precisa de tipos totalmente novos de intermediários para facilitar conexões entre usuários ("peer to peer"). Com bons programas, a necessidade de hierarquias complexas foi colocada em cheque. Plataformas digitais “lean” conectam pessoas e conseguem ter uma tração tremenda com pouquíssimos recursos e poucas pessoas.

Em 2014, o WhatsApp foi vendido por 19 bilhões de dólares para o Facebook. O aplicativo tinha alcançado 450 milhões de usuários ativos sem gastar um dólar com propaganda, tinha 55 empregados, entre os quais 32 engenheiros, e um time de atendimento ao cliente.

O único empregado com um MBA (da Índia) não era um dos fundadores e era famosamente chamado de “o cara do business”. O que ele realmente fazia por lá continua um mistério até hoje.

Deveria estar acendendo uma luzinha vermelha na reitoria dos MBAs quando uma das mais recentes e incríveis histórias de criação de valor  —  tanto para acionistas quanto para usuários  —  foi totalmente executada sem nenhum membro de um MBA das Ivy Leagues, nem mesmo remotamente envolvido. Mesmo o primeiro e único VC que o WhatsApp deixou participar da aventura tinha uma formação em ciências da computação.

Alguém roubou o brilho dos MBAs?

Sim, e foram os caras que ninguém esperava que roubariam nada de ninguém: os geeks. A revolução digital possibilitou que todo mundo acessasse todo mundo. Então, a sua habilidade de fazer parte do nexus ("centro") das velhas organizações intermediárias – o alto escalão da TV e da mídia impressa, bancos, grandes agências – está se tornando irrelevante.

Até mesmo no IPO do Google foram os “geeks” que ditaram os termos aos MBAs para uma abordagem mais igualitária e para evitar que corretores favorecessem seus melhores clientes. Os banqueiros ficaram em choque.

Estamos vendo uma vasta transferência de poder da “Elite MBA” em direção a “criadores de produtos digitais”. No novo jogo, pontos não dependem de quem você conhece, mas o quão bem o seu produto é aceito pelas multidões. Aprender a programar se tornou o novo pré-requisito para poder jogar.

No mundo do código, o seu ranking depende de downloads e usuários ativos. Sua idade, sexo, raça, escola ou origem não importam, desde que a sua invenção realmente resolva a “dor” de milhões de usuários.

É claro que startups ainda precisam de financiamento e marketing, mas marketing está se transformando em “growth hacking”, conceito no qual os empregados programam alguns “hacks” para engatilhar crescimento extremo. Em um setor tão emblemático como o automotivo, inventores de produtos também estão roubando a cena.

A Tesla acabou de conseguir que 400 mil clientes fizessem a compra antecipada de um carro que só ficara pronto no final de 2017/começo de 2018, sem um centavo gasto em propagandas de TV. Eles só fizeram um produto que as pessoas estavam esperando há anos: um lindo carro elétrico, acessível e de grande autonomia.

Em organizações com foco no produto, onde sua missão – Simon Sinek diria “o seu porquê” – ressona com a multidão, você não precisa gastar muito para botar a boca no trombone.

E, desde que você tenha um bom crescimento de usuários, você encontra verba facilmente com antigos programadores/empreendedores que se transformaram em investidores anjo e venture capitalists, isso quando não for encontrar em plataformas online de crowdfunding, como o Kickstarter, o que possibilita que os usuários te financiarem diretamente.

O fator chave para uma campanha de levantamento de fundos de sucesso não é mais o seu diploma, se é que já foi um dia, mas a tração dos seus usuários. Um produto lançado vale mais que milhares de planos de negócio.

E os benefícios que um MBA trazia estão sendo reinventados. O seu reconhecimento no mercado agora está ligado ao que você constrói e fala online, seu portfolio e seguidores. A sua rede é feita das tribos que adotam essas ideias (open source, wikipedia, meetups). A sua cultura de negócios depende da sua habilidade de continuar seguindo o que está acontecendo

Pensar que você pode confiar no que aprendeu na escola para o resto da sua vida, sem precisar de atualizações, não é só burro, como perigoso.

Curiosamente, a Goldman Sachs, uma das companhias dos sonhos de vários graduados em MBAs, recentemente tentou fazer um rebranding próprio como uma empresa de tech, ostentando que emprega mais engenheiros que o Facebook.

Achar que contratar mais engenheiros do que outras empresas o torna o mais “tech” da cidade é provavelmente o que um consultor com MBA vendeu pra eles em um powerpoint lindo. Essa tentativa de rebranding diz algo sobre a grande mudança que estou tentando descrever.

Os MBAs vão desaparecer completamente? Claro que não, mas o valor deles certamente será afetado pelo fato que as mentes mais brilhantes vão gradualmente decidir ter habilidades técnicas em formações de curto prazo, como bootcamps de código, para completar um diploma inicial em áreas mais passionais como Sociologia, Psicologia ou Artes.

Entender usuários e ser capaz de construir algo que eles utilizam é o novo Cálice Sagrado, e não a sua habilidade de se exprimir em bullet points sem rir, a parte mais difícil da minha carreira até hoje.

Então, como diria o Sr. Jones, seja fiel, beba um gole e acredite na sua habilidade de tornar a suas ideias em produtos reais. Aprenda a programar.

Texto escrito por Mathieu Le Roux, fundador da Le Wagon, e publicado em Endeavor. Veja o artigo original aqui.

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