Filmes: empreendedores brasileiros investem em negócios 'tipo Netflix' (lolostock/Thinkstock)
Mariana Desidério
Publicado em 20 de julho de 2017 às 06h00.
Última atualização em 20 de julho de 2017 às 06h00.
São Paulo – É fato que a Netflix conquistou os brasileiros. Apesar de não revelar quantos assinantes tem por aqui (no mundo são impressionantes 100 milhões de usuários), o CEO da empresa já apelidou o Brasil de “foguete” pela rapidez no aumento das adesões ao serviço. Não à toa, o Brasil foi o primeiro mercado internacional da Netflix, que desembarcou por aqui há cerca de seis anos.
Tudo isso, contudo, não é o suficiente para intimidar alguns empreendedores brasileiros que decidiram investir negócios semelhantes ao da gigante americana: streaming de filmes pela internet.
“Lá atrás as pessoas falavam que éramos loucos, que nosso negócio não daria em nada”, conta Luiz Guimarães diretor de negócios e conteúdo do Looke, o principal serviço brasileiro do setor, que tem sede em São Paulo.
O negócio foi criado pelas empreendedoras Célia Regina Queiroz e Renata Vicente há cerca de um ano e já atendeu 600 mil usuários. Diferente da Netflix, que oferece apenas a possiblidade de uma assinatura mensal para acessar os filmes e séries do catálogo, pelo Looke o usuário pode comprar o filme para ter em sua biblioteca pessoal, ou ainda alugar um título específico. Dentre os filmes disponíveis para aluguel estão lançamentos e títulos que saíram do cinema há pouco tempo, como “A Bela e a Fera” e “Logan”.
“Tem gente que quer ter o filme, ainda existem os cinéfilos, e o sensacional é que você pode acessar sua biblioteca de qualquer lugar”, afirma Guimarães. Em geral, o aluguel de um filme como "Logan" sai por R$ 9,99. Já as assinaturas mensais custam entre R$ 16,90 e R$ 25,90.
Outro diferencial é que, no Looke, todos os títulos podem ser baixados pelo usuário para serem assistidos off-line, possibilidade que foi criada pela Netflix para alguns títulos apenas.
Por conta dessas particularidades, Guimarães afirma que o Looke não se considera um concorrente da Netflix. “Somos um serviço complementar. Pesquisas mostram que apenas um serviço de filmes pela internet não atende toda a necessidade do usuário, então a tendência é que ele assine mais de um”, defende.
“Além disso, hoje vemos um movimento de especialização dos serviços. A Netflix está se direcionando mais para a distribuição de conteúdo próprio, então temos recebido chumbos de pedidos de usuários por títulos que não estão disponíveis. Tem muita coisa que está perdendo prateleira”, completa.
Atualmente, o Looke tem cerca de 10 mil títulos em catálogo, sendo que as negociações têm sempre um prazo de validade, então, enquanto novos títulos entram, outros saem do acervo (assim como ocorre na Netflix). Diferente de seus concorrentes maiores, há um espaço especial para produções nacionais e também para curtas.
A empresa não divulga o número de usuários assinantes, mas afirma que cerca 600 mil já usaram a plataforma de alguma forma (assinatura, aluguel ou compra de títulos). O total investido no negócio até agora também não é revelado.
Há cerca de um ano no mercado, o Looke está focado agora em se consolidar entre o público brasileiro, mas já considera expandir seu serviço para outros países, inicialmente para a América Latina. Neste momento o negócio busca investimento da ordem de 15 a 20 milhões de reais.
Para Guimarães, o grande obstáculo para empreender neste setor no Brasil é justamente a dificuldade de conseguir investimento. “É muito legal ver aonde a gente já chegou. Mas o que nos deixa um pouco chateados é a falta de recursos e a dificuldade de conseguir investimento por aqui. Porque na verdade estamos desenvolvendo esse negócio desde antes da Netflix ser o que é hoje, se tivéssemos tido aporte para desenvolver mais rápido, quem sabe onde já estaríamos hoje?”, questiona.
Outro serviço brasileiro de distribuição de filmes é o Oldflix. Como o próprio nome sugere, o serviço é focado em disponibilizar na internet filmes antigos – de 1930 a 1990. Baseada em Natal (RN), a plataforma surgiu em 2014, mas será relançada no mês que vem, após alguns ajustes técnicos.
“A proposta é ser uma plataforma que atenda ao publico retrô. Queremos atingir os saudosistas. Para nossa surpresa, porém, grande parte dos interessados é formada por jovens”, afirma Manoel Ramalho, um dos sócios do negócio, que é uma empresa familiar onde atuam também sua mulher Wilma Fernandes e seu filho Wagner Ramalho, CEO da empresa.
A ideia surgiu de uma demanda do público, explica Manoel Ramalho. O grupo é dono de um canal de televisão local, a TV União de Natal, e percebeu a procura por esse conteúdo ao transmitir alguns filmes antigos no canal.
“Exibimos filmes antigos pela TV e recebemos muitos pedidos para disponibilizar o conteúdo na internet. Fomos pesquisar esse mercado e vimos que não existia nada interessante. Tem muita coisa gratuita, mas que vem com vírus, ou então sem continuidade, uma série pela metade, ou com qualidade ruim. Então decidimos criar o serviço”, conta Ramalho.
Lançada inicialmente em 2014, a plataforma recebeu 48 mil cadastros em uma semana, o que levou a problemas técnicos. “Foi uma explosão de usuários. Isso congestionou a nossa plataforma. Agora estamos preparados para milhões de assinaturas”, garante o empreendedor.
Assim como o Looke, o Oldflix não se posiciona como um concorrente direto da Netflix. “A concorrência nos beneficia quando leva o assinante a conhecer o produto dela. Nossa pretensão não é competir, temos a humildade de saber que existem grandes plataformas no mercado. Se atingirmos 10% do público que a Netflix atinge hoje, já seremos uma grande empresa nacional nesse setor”, afirma o empreendedor.
Atualmente, o Oldflix tem cerca de 1.200 títulos disponíveis. Diferente das outras plataformas, porém, a ideia é que os filmes permaneçam no acervo – e não saiam depois de um período. Dentre os títulos disponíveis estão "Mr. Bean", "Arquivo X" e "Django". “Somos tipo uma máquina do tempo. Quer voltar no tempo, vai no Oldflix”, brinca Ramalho. No Oldflix a mensalidade é R$ 16,90, que dá acesso a todo o acervo.
Até agora, os donos investiram cerca de 1,3 milhão de reais no negócio, incluindo aí o valor dispendido para compra de licenças dos filmes. A plataforma está sendo relançada e a expectativa é que o negócio atinja o ponto de equilíbrio em um ano.
Para Ramalho, a maior dificuldade por enquanto é a qualidade da internet no Brasil. “Nosso maior gargalo é o acesso à internet no país. A capilaridade dela e a qualidade. Quanto à concorrência, quanto mais plataforma surgirem, melhor”.