O consultor financeiro Gustavo Cerbasi: autor lançou um novo livro, voltado para quem pensa em abrir um negócio próprio (Gustavo Cerbasi/Divulgação)
Mariana Fonseca
Publicado em 11 de janeiro de 2017 às 06h00.
Última atualização em 11 de janeiro de 2017 às 06h00.
São Paulo – Qual é a parte mais complicada dentro de um negócio, para a maioria dos empreendedores brasileiros? Não é preciso pensar muito para descobrir que são as finanças: afinal, uma das grandes causas de mortalidade das empresas brasileiras jovens é não acompanhar rigorosamente as despesas e receitas do negócio.
Diferente da área de finanças pessoais, não há muitos materiais simples para entender como elaborar um bom orçamento empresarial. Por isso, o consultor financeiro Gustavo Cerbasi resolveu lançar uma nova obra, voltada a quem administra seu próprio negócio: “Empreendedores inteligentes enriquecem mais” (Editora Sextante).
Cerbasi é mais conhecido por ser o autor do best-seller de orçamento familiar "Casais Inteligentes Enriquecem Juntos", que inspirou o filme “Até que a Sorte nos Separe” (ambos de 2012). Em entrevista a EXAME.com, ele falou mais sobre o que é ser um “empreendedor inteligente” – e quais são os erros mais comuns de quem abre um negócio sem saber de números.
“As finanças costumam ser uma parte complicada para os empreendedores. Você pode ter um negócio de sucesso do ponto de vista não-financeiro e, mesmo assim, acabar fechando as portas", alerta o consultor.
"Isso vale até para a empresa mais básica: mesmo um camelô precisa saber se aquilo que vende trará resultado."
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:
EXAME.com – O que significa ser um “empreendedor inteligente”, pensando no título do seu livro?
Gustavo Cerbasi – O bom empreendedor une dois tipos de conhecimento: ele entende tanto do negócio (ter experiência no mercado, saber quais produtos ou serviços são bons e ruins) quanto de negócios (aprimorar técnicas de finanças, de marketing e de negociação).
Imagine que eu tenha desenvolvido um produto – uma torta, por exemplo. Eu posso ter a melhor torta do mundo, mas, se eu não souber comercializar, formar um preço adequado e posicionar-me quanto à marca, essa melhor torta do mundo só será consumida na minha família e eu não vou obter nenhum resultado financeiro com isso.
Por isso, é fundamental entender minhas fraquezas: se eu venho do setor de alimentação e não sei administrar um negócio, precisarei me associar a alguém especializado em gestão ou então estudar muito sobre o tema.
Por outro lado, se eu sou uma pessoa da administração e quero montar um restaurante, ou me associo a quem entende muito de alimentação ou me envolvo muito com esse mercado, para aprender aquilo que pessoas com experiência na área já dominam. É a combinação entre entender do negócio e de negócios que cria o empreendedor inteligente.
EXAME.com – Por que você decidiu focar mais no aspecto financeiro dos pequenos e médios negócios no seu livro?
Gustavo Cerbasi – As finanças costumam ser uma parte complicada para os empreendedores. Você pode ter um negócio de sucesso do ponto de vista não-financeiro e, mesmo assim, acabar fechando as portas.
Isso porque sua empresa pode agradar consumidores e desagradar concorrentes, pode estar vendendo, pode ter reconhecimento público e, ao mesmo tempo, pode não ver o lucro aparecer por conta de cálculos financeiros inadequados.
A proposta do livro é justamente fazer o novo empreendedor ou o microempresário com mais experiência entender por que o lucro não aparece no seu negócio, mostrando caminhos de organização para obter os resultados que o empreendedor espera e, assim, expandir-se.
O objetivo que eu tenho com o livro não é transformar o leitor em um auditor, em um contador ou em um profissional de finanças; e sim que ele continue a tocar seu negócio sem gastar mais de quatro ou cinco horas por mês no controle dos números.
O empreendedor deve direcionar seu tempo para controlar a qualidade do seu produto ou serviço; para conversar com seu cliente; e para negociar com seu fornecedor. Ter inteligência financeira empresarial é justamente isso: saber investir no que é essencial ao seu negócio.
EXAME.com – Quais são os erros financeiros mais cometidos por quem tem um negócio, e que acabam fazendo com que ele tenha de fechar as portas?
Gustavo Cerbasi – Tipicamente, os erros financeiros já nascem com a empresa, e não no meio do caminho. Essas falhas costumam aparecer logo no planejamento do negócio, por conta de uma falta de clareza sobre os meses que virão – e, claro, a falta de um orçamento correspondente. Isso vale até para a empresa mais básica: mesmo um camelô precisa saber se aquilo que vende trará resultado.
Outra falha tem a ver com o superdimensionamento. Por exemplo, imagine que eu tenha uma empresa e queira comprar um carro mais econômico, um ar condicionado eficiente e um smartphone melhor. Muitas vezes, estou pagando por uma estrutura que pode até fazer sentido em termos de benefícios marginais, mas que irá pesar quando faltar capital de giro na empresa. Eu terei de pegar um empréstimo e isso irá corroer qualquer vantagem que eu tive ao comprar um produto mais eficiente.
Em resumo, o superdimensionamento é você pagar mais caro visando um lucro que nunca irá aparecer, porque você irá cair em problemas financeiros. Principalmente no começo da empresa, é preciso dar fôlego financeiro e começar com equipamentos mais simples para ter bens de capital super eficientes só em um segundo momento.
O terceiro problema é a dificuldade que o empreendedor brasileiro tem em diferenciar empréstimo e financiamento. Como dissemos, quando ele tem dinheiro, compra equipamentos para sua empresa e faz reformas. Aí, no fim do mês, recorre a um empréstimo para pagar contas de energia, funcionários e impostos, por exemplo. Esse empréstimo que ele toma tem taxas muito maiores do que teria um financiamento dos equipamentos e das reformas, claro.
Lembre-se: a hora de negociar com o banco é a hora em que você menos precisa do dinheiro. Quando sua empresa tiver bons números, chegue ao banco e diga ao gerente “agora eu não preciso do seu crédito, a não ser que você ofereça condições melhores”. Assim, é possível obter uma linha de crédito a juros mais baixos para financiar seus bens empresariais. Você é o lado forte da negociação; já quando o dinheiro falta, a solução acaba sendo muitas vezes pegar a primeira oferta de crédito que tiver pela frente.
Saber negociar a condição de crédito ainda está muito longe da realidade brasileira. É algo que vem da pessoa física: o consumidor brasileiro costuma estar sempre afogado em cheque especial e faturas de cartões de crédito. Esse comportamento se espalha para a empresa.
Esses três erros, mesmo que não mostrem sua gravidade no início da empresa, ficam mais aparentes com o crescimento do negócio e o esgotamento do caixa. Podem, inclusive, inviabilizar o negócio e fazer a empresa fechar as portas precocemente.
EXAME.com – Qual é a grande lição que futuros empreendedores e pessoas que já empreendem devem aprender para realmente enriquecer, então?
Gustavo Cerbasi – Na verdade, a pessoa que já pensa em riqueza ao criar uma empresa tem que diminuir um pouco sua pressa: quem tem menos ansiedade irá alcançar resultados de forma mais rápida, mesmo que não pareça.
Se você monta um negócio e ele dá resultados, a última atitude que você deve tomar é embolsar o lucro para aumentar seu padrão de vida. Isso porque sua empresa será logo percebida por um concorrente como algo rentável, e este irá abrir algo igual ou próximo. Quando esse concorrente reinvestir os lucros em posicionamento de marca, tecnologia, treinamento de funcionários, logo atrairá mais consumidores, crescerá e irá fazer seu empreendimento deixar de existir – já que você não pensou em expansão.
Não importa se o negócio é pouco ou muito rentável: se você depender muito dos lucros dele no começo, você o matará aos poucos. É fundamental trabalhar para desenvolver seu empreendimento. Quando a concorrência chegar, verá quão distante ela está de você e irá desistir da disputa.
Por isso que se diz que qualquer negócio novo não deve suscitar expectativas de ganho no curto prazo: é preciso reinvestir os lucros para que o empreendimento ganhe musculatura e distância de competidores. Conseguir sustentar o sacrifício por alguns meses é necessário para alcançar o sucesso do seu negócio.