Escritório do Mercado Bitcoin: startup anunciou uma reestruturação total da empresa (Mercado Bitcoin/Divulgação)
Mariana Fonseca
Publicado em 16 de março de 2018 às 06h00.
Última atualização em 30 de janeiro de 2020 às 12h26.
São Paulo – A startup de compra e venda de criptomoedas Mercado Bitcoin tinha um grande pepino em mãos em dezembro de 2017. Um surto de valorização de moedas digitais, como a bitcoin, fez com que milhares de clientes entrassem ao mesmo tempo na plataforma – e a casa ainda não estava arrumada para isso.
Seus usuários viraram um exército de 700 mil pessoas no fatídico mês (no começo do mesmo ano, eram 200 mil). O negócio transacionava diariamente mais do que todo o volume financeiro de 2016. Com poucas pessoas na parte de operação, o Mercado Bitcoin teve de pedir maiores prazos para saques e depósitos. A decisão, diante da volatilidade inerente à bitcoin, virou insatisfação para os investidores focados no curto prazo.
Em 2018, a startup quer abandonar a organização de negócio principiante. O Mercado Bitcoin anunciou uma reestruturação total da empresa, que vai desde a adoção de um conselho consultivo até a criação de novas áreas internas.
Com a arrumação, a empresa que transaciona criptomoedas espera fazer seus 1 milhão de usuários tornarem-se 2,5 milhões neste ano. Tais investidores devem aportar ainda mais nas moedas digitais, fazendo o volume transacionado pelo Mercado Bitcoin crescer mais de 10 vezes.
O Mercado Bitcoin começou a operar em 2011, mas foi adquirido em 2013 pelos atuais sócios da plataforma: André Oda, Gustavo Chamati, Maurício Chamati e Rodrigo Batista.
No mesmo ano, a empresa foi formalizada e teve um investimento inicial de 300 mil reais, vindo dos próprios empreendedores. O ponto de equilíbrio entre receitas e despesas foi atingido ainda em 2013. O Mercado Bitcoin trabalha com outras criptomoedas, além da “tradicional” bitcoin: a bitcoin cash e a litecoin.
O negócio começou a perceber um crescimento anormal em abril de 2017, quando o Japão elaborou uma regulação que comparava a bitcoin às moedas estrangeiras, permitindo sua transação.
Na época, o Mercado Bitcoin possuía menos de 10 funcionários. “Percebemos que a empresa apontava para um crescimento maior do que estávamos preparados para lidar. Era apenas o começo, e tal percepção se confirmou ao longo do ano. No meio de 2017 surgiu a ideia de um conselho consultivo”, afirma Gustavo Chamati, sócio-fundador do empreendimento.
Porém, a real necessidade de organização só bateu à porta em em outubro, quando futuros de bitcoin passaram a ser negociados por duas operadoras americanas de bolsas: a Chicago Board Options Exchange (CBOE) e a Chicago Mercantile Exchange (CME).
A decisão dos Estados Unidos se traduziu no crescimento acelerado de novembro e de dezembro na empresa brasileira – e os problemas com o volume de transação.
Como solução de curto prazo, o negócio fez diversas contratações na área de operações e diz já ter capacidade para lidar com complexidade e velocidades altas em seu sistema. “O que aconteceu no ano passado foi um crescimento tão vertiginoso que a gente não conseguiria ter se preparado. Ninguém se planeja para crescer 25 vezes em um mês.”
Então, como um negócio pode prever dificuldades futuras? Para o Mercado Bitcoin, a resposta está em estruturação interna e inteligência de mercado.
A primeira grande decisão do Mercado Bitcoin foi reviver a ideia de criar um conselho consultivo. “Percebemos que precisávamos de ajuda. Nossa primeira medida foi trazer especialistas que pudessem discutir o que estávamos passando por meio de experiências parecidas e nos dar conselhos diretos”, diz Chamati.
Anunciado neste mês, o conselho consultivo é organizado nos comitês de Estratégia e Gestão; Relações Institucionais e Regulação; e Tecnologia e Inovação. Há executivos de empresas como Cetip/B3 e Netshoes e Rodrigo Batista, sócio-fundador do Mercado Bitcoin e presidente do conselho.
O Mercado Bitcoin também investiu em novos funcionários e se mudou para uma sede de 1.500 m² e capacidade para 220 pessoas. O negócio possui hoje 90 membros e continua contratando.
A terceira e última medida do Mercado Bitcoin foi reestruturar o modelo de gestão da empresa com foco em velocidade de mercado. “Em uma startup todo mundo faz tudo e todo mundo se fala. Mas, com uma equipe de 90 pessoas especializadas, com demandas profissionais bem diferentes, precisávamos de uma estrutura maior e mais profissional.”
O Mercado Bitcoin elencou as principais necessidades da empresa e criou cargos além dos tradicionais. Como exemplo há o diretor de crescimento (“growth”), responsável por trabalhar demandas de crescimento e gerenciar projetos urgentes para a liderança de mercado. Outro cargo é o de diretor de experiência do consumidor, que deve possuir visão crítica e assumir o papel de defensor do cliente dentro do empreendimento.
Os diretores possuem responsabilidades específicas, mas também trabalham em times com objetivos comuns, chamados de “squads”. As equipes se dividem hoje em “clientes”, “inovação” e “processos.”
“Trouxemos pessoas que consigam responder rapidamente a nossos desafios e que estão tocando iniciativas que irão transformar a nossa empresa em nossos pilares de atendimento, experiência e produtos”, resume Chamati.
O Mercado Bitcoin está confiante em sua reestruturação e possui metas agressivas para este ano. A principal meta é aumentar seu volume transacionado de 4,5 bilhões de reais em 2017 para 50 bilhões de reais em 2018 – valor que considera para dizer ser a maior “corretora” de bitcoins brasileira.
O volume deve crescer tanto pelo crescimento de usuários, de 1 milhão para 2,5 milhões de cadastros, quanto pela pressão dos concorrentes. A maior competição deve forçar o Mercado Bitcoin a praticar margens de lucro menores, o que deve diminuir taxas e atrair mais investidores. Por conta desse aperto financeiro, o Mercado Bitcoin espera crescer quatro vezes em termos de faturamento – proporção bem menos acelerada do que a do crescimento do volume transacionado.
Para atrair mais clientes e aumentar sua participação de mercado, o empreendimento irá focar em educação sobre o que são as moedas digitais e como elas funcionam – incluindo seus riscos. O Mercado Bitcoin pretende falar tanto com os curiosos e pequenos investidores quanto com os que já possuem uma carteira de ativos financeiros.
“O bitcoin foi a porta de entrada para muita gente ao mundo dos investimentos e queremos que continue assim. O fato de a moeda ter sido apresentada como tecnologia quebrou a mentalidade de que investir não era para elas. Não é preciso associar-se a um banco ou possuir muito dinheiro para falar com um gerente. Desse ponto de vista, causamos uma disrupção”, defende Chamati.
Hoje, o número de investidores brasileiros em bitcoin se aproxima daqueles que apostam nos títulos do Tesouro Direto, do Governo Federal e já representa o dobro dos investidores em ações.
O CEO do Mercado Bitcoin diz não se preocupar com quedas bruscas no valor das moedas digitais. Na virada de 2017 para 2018 a bitcoin despencou 40%. Hoje, a moeda digital vale por volta de 9 mil dólares.
“Quem investe em bitcoins precisa aprender a lidar com a volatilidade e a insegurança. Tivemos vários altos e baixos ao longo do ano passado e tratamos tais movimentos de forma natural. As moedas não crescem de forma indefinida, e sim passam por ciclos de crescimento e realização de lucros, como qualquer ativo.”
Apesar de todos os apuros, 2017 foi um bom ano para o Mercado Bitcoin. O negócio cresceu 25 vezes em volume transacionado na comparação com o ano anterior. A expansão foi tão acelerada que a receita obtida serviu para o negócio planejar suas finanças – e, finalmente, poder ir além de reinvestir e passar a distribuir lucros.
Segundo o empreendimento, o futuro reserva uma projeção internacional e o incômodo de concorrentes como a CoinBase, maior inspiração do empreendimento. Por enquanto, é hora de se consolidar em terras brasileiras – e ter a certeza de que a cada está realmente arrumada.