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O homem que vive da vaidade com a marca Racco

Luiz Felipe Rauen vendeu de tudo um pouco — banana, pipoca, anúncios em listas telefônicas e empreendimentos mobiliários — até fundar a fabricante de cosméticos Racco

Luiz Felipe Rauen, dono da fabricante de cosméticos Racco.  (Herbert Coelho)

Luiz Felipe Rauen, dono da fabricante de cosméticos Racco. (Herbert Coelho)

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Da Redação

Publicado em 3 de julho de 2011 às 08h00.

Oparanaense Luiz Felipe Rauen, de 59 anos, ainda era garoto quando começou a vender frutas de porta em porta na periferia de Curitiba. Foi o início de uma trajetória que o levaria a ser engraxate, entregador de pães, vendedor de anúncios e dono de construtora, entre outras ocupações.

Hoje Rauen comanda uma rede de 400 000 vendedoras que vão à casa das consumidoras para oferecer cosméticos da Racco, empresa que fundou no final dos anos 80. A inspiração para criar a marca surgiu no período em que sua mulher, Gisela, tornou-se revendedora de marcas como Avon e Natura.

“Percebi que vaidade era um bom negócio”, diz Rauen. Em 2010, a Racco faturou 720 milhões de reais. Numa conversa com Exame PME, Rauen contou sua história e falou sobre seus planos para os próximos anos.

Comecei a trabalhar aos 10 anos de idade, no início da década de 60. Todos os dias, ao chegar da escola, eu comprava bananas de um vizinho para revender nas ruas do meu bairro, na periferia de Curitiba, onde morava com minha mãe e três irmãos.

Eu saía com um carrinho cheio de frutas e, poucas horas depois, voltava com ele vazio. Entregava metade do que ganhava à minha mãe e guardava o restante numa lata no porão.

Quando um circo chegava à vizinhança, eu procurava o dono e me oferecia para vender pipoca e amendoim. Atuava de maneira diferente dos outros garotos que também vendiam guloseimas.


Enquanto eles ficavam quietos esperando os clientes, eu puxava conversa com todo mundo. Por isso, vendia mais.

Mais ou menos nessa época, precisamos nos mudar para um casebre que havia sido usado como galinheiro. Minha mãe tentou ajeitar tudo para que pudéssemos viver lá com tranquilidade, mas o lugar cheirava mal. Às vezes, antes de pegar no sono, eu ficava imaginando como seria bom ter uma fábrica para produzir um monte de coisas para vender.

Não sabia exatamente que tipo de item eu queria fabricar, mas fazia questão que fosse algo bastante limpo e perfumado, bem diferente do quarto pequeno onde dormia.

Ainda garoto, eu engraxei sapatos, distribuí panfletos e entreguei pães. Aos 18 anos, me mudei para o Rio de Janeiro para me alistar no Exército, pensando em seguir a carreira militar.

Fui eliminado no exame médico devido às cicatrizes de um acidente na infância, quando sofri queimaduras causadas por gordura quente.

Como já estava fora de casa e precisava me manter, comecei a procurar emprego. Consegui trabalho como vendedor de anúncios em guias de ruas. Com as comissões, comprava passagens de avião para visitar minha mãe em Curitiba, o que era um luxo para a época.

Em 1973, depois de três anos no Rio de Janeiro, larguei o emprego e voltei a Curitiba para ficar mais perto da família. Eu continuava disciplinado com dinheiro e ainda guardava metade do que ganhava. Juntei minhas economias e me tornei sócio de um amigo numa construtora.

Os negócios iam bem, mas eu estava insatisfeito. Passava boa parte do meu tempo vendo projetos, conversando com engenheiros e resolvendo problemas nas obras. Não tinha quase nenhum contato com os clientes. Em 1976, um amigo me ofereceu um emprego como vendedor da Xerox.


Decidi vender minha parte na construtora e aceitar o trabalho, que era bem remunerado e me permitiria fazer o que eu mais gostava. Nessa época, eu já namorava a Gisela, com quem casei pouco antes de começar no novo emprego. Estamos juntos até hoje.

Trabalhei na Xerox durante sete anos, até que, em 1985, decidi em­preender de novo. Investi quase tudo o que tinha na construção de uma rede de hotéis.

Achava que, com aquele negócio, teria mais contato com os clientes. Foi um engano. Acabei me tornando um empreiteiro, construindo hotéis que depois meus funcionários administravam.

Nessa época, Gisela ganhava um bom dinheiro vendendo cosméticos. Percebi que aquele era um bom negócio e que talvez houvesse espaço para criar uma empresa de venda direta de cosméticos. Era a chance de realizar o sonho de infância — ser dono de uma fábrica de algo limpinho e cheiroso.

Convidei meu irmão e dois amigos para serem meus sócios na Racco. Depois um funcionário que era químico e poderia supervisionar o desenvolvimento dos cosméticos também entrou para a sociedade.

Eu me dedicaria ao departamento comercial. Passamos dois anos pesquisando o mercado até lançar o primeiro catálogo, com mais de 70 produtos, em 1987.

Nos fins de semana, eu e Gisela organizávamos reuniões para recrutar revendedoras para a Racco. Para atraí-las, optei por uma política de remuneração agressiva. A maioria das empresas de venda direta pagava comissões de 30%.


Na Racco, até hoje a comissão é de 70%, divididos entre quem vendeu e as pessoas que a indicaram para trabalhar com a gente. Assim, criei uma espécie de rede em que todo mundo se esforça para ter bons resultados e cada um cobra dos outros o melhor desempenho.
Sou fascinado por vendas diretas.

Com esse modelo, posso manter um exército de revendedoras motivado para levar meus produtos até o cliente. Se tivesse de negociar com varejistas, provavelmente minha marca seria só mais uma na prateleira. O inconvenien­te é que, às vezes, o consumidor tem pressa. Por isso, tenho feito grande esforço para reduzir os prazos de entrega.

Nesse setor, o cliente recebe seus pro­dutos em média uma semana após a compra. A Racco entrega em três dias, e a meta para este ano é diminuir a espera para menos de 48 horas.

A Racco tem uma longa trajetória de crescimento. No decorrer dela, também enfrentei alguns obstáculos, como a saída dos sócios que me ajudaram a fundar a empresa. Há alguns anos, começamos a divergir sobre quais as melhores estratégias para o negócio. Eu queria manter metas agressivas, enquanto eles eram mais conservadores. Em 1993, acabei comprando a participação deles.

A saída dos sócios foi um choque. Até então, eu pouco me envolvia na administração cotidiana. Meu trabalho era cuidar das vendas e fazer a empresa aumentar as receitas.


Quando eu e Gisela nos tornamos os únicos donos, ficamos presos no escritório desempenhando funções que não eram nossa especialidade. Gradativamente, contratamos profissionais qualificados e nos afastamos novamente da gestão administrativa e financeira.

Hoje, me concentro nos aspectos estratégicos para o crescimento da empresa. Recentemente, por exemplo, desenvolvi uma linha de suplementos vitamínicos e alimentos funcionais, como shakes dietéticos, sopas prontas e bebidas light — um tipo de produto voltado para o bem-estar e para a vida saudável, algo que tem muito apelo entre as consumidoras de cosméticos.

Fui muito cauteloso nessa di­versificação, porque, nesses quase 25 anos em que estou no mercado, vi de­zenas de concorrentes desaparecer por ter perdido o foco. Também estou dedicando parte do meu tempo a internacionalizar os negócios da Racco, hoje presente em vários países, como Bolívia, Paraguai, Angola, Estados Unidos e Portugal.

Nos próximos anos, eu pretendo profissionalizar ainda mais a gestão da empresa. Tenho recebido muitas propostas de investidores. É difícil passar um mês sem que apareça alguém interessado em comprar parte da empresa. A eles, costumo dizer que só aceito fechar negócio se nossa forma de trabalhar for mantida.

Afinal de contas, criamos uma grande família, formada atualmente por mais de 400 000 revendedoras que dependem da Racco para continuar prosperando e melhorando de vida.

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