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O ex-boia-fria hoje fatura R$ 600 milhões

Inconformado com a ideia de viver de colheita em colheita no interior de São Paulo, Aparecido Viana tentou a sorte na capital. Hoje, ele é dono de uma imobiliária especializada no ABC paulista que deve faturar 600 milhões de reais em 2011

Viana: "Criei uma extensa rede de relacionamentos que foi fundamental para a expansão da empresa" (Daniela Toviansky)

Viana: "Criei uma extensa rede de relacionamentos que foi fundamental para a expansão da empresa" (Daniela Toviansky)

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Da Redação

Publicado em 23 de janeiro de 2012 às 05h00.

O empreendedor Aparecido Viana tinha 14 anos quando deixou para trás uma vida de trabalho árduo como boia-fria nas fazendas de café, batata e arroz do interior paulista para morar com a família em São Caetano do Sul, na região do ABC, na época um polo industrial emergente. Na cidade, ele trabalhou em metalúrgicas, indústrias plásticas e foi escrevente de cartório até conseguir um emprego como corretor de imóveis.

Foi o começo de uma trajetória que levou Viana a abrir a própria imobiliária, a Aparecido Viana Imóveis, no começo dos anos 80 — uma empresa com receitas de 600 milhões de reais em 2011. Nesta entrevista a Exame PME, Viana, hoje com 62 anos, conta sua história e fala sobre seus planos para o futuro.  

Nasci em Bálsamo, uma peque­na cidade perto de São José do Rio Preto, no interior de São Paulo. Sou o quinto de seis filhos. Não tive uma infância fácil. Vivíamos na roça e a família inteira trabalhava como boia-fria durante a colheita de café, arroz e milho.

No período da entressafra, co­mo não havia trabalho, inventei uma atividade. Juntava esterco no pasto das fazendas da região, transformava em adubo e oferecia, junto com pequenos serviços de jardinagem, aos moradores da cidade. Costumo dizer que fui o primeiro corretor de esterco da região.  


Quando completei 14 anos, minha família decidiu mudar-se para a cidade grande. Em maio de 1963, chegamos a São Caetano do Sul. Éramos seis pessoas morando num cortiço com quarto e cozinha. O banheiro ficava do lado de fora. 

Eram tempos em que a região formada por São Caetano, São Bernardo e Santo André — o ABC paulista — estava em desenvolvimento, com a chegada de grandes indústrias. Arrumei trabalho numa empresa de plástico e depois numa de cerâmica. Nos anos seguintes, tive vários empregos, desde auxiliar administrativo numa metalúrgica até auxiliar de escrevente de cartório.

Nunca me limitei a trabalhar só no meu horário de expediente. Entrava cedo, saía tarde e assumia responsabilidades acima das que meus patrões esperavam.

Em 1976, o dono de uma imobiliária em que eu já havia trabalhado como auxiliar de escritório me chamou para voltar à empresa. Ele queria que eu tomasse conta da área administrativa, cargo que eu já havia ocupado em outras empresas. Sua proposta era que eu passasse algum tempo em vendas para conhecer melhor o funcionamento da imobiliária.

Para quem já havia vendido um bocado de coisa, até esterco, achei que poderia fazer um bom trabalho, mesmo num prazo curto. Telefonei para todos os meus conhecidos oferecendo casas, terrenos e apartamentos. Em dez dias, vendi dez imóveis, mais do que qualquer corretor da imobiliária já havia conseguido em tão pouco tempo.

Naquele mês, ganhei uma comissão 24 vezes maior do que o salário combinado com o meu patrão. Depois disso, meu patrão pediu para eu continuar como corretor.  Ele continuou no administrativo.

Percebi que para vender um imóvel era preciso criar e manter laços pessoais com os clientes em potencial. Em vez de ficar sentado esperando as pessoas me procurarem, eu visitava gente que poderia comprar um imóvel. Durante anos, tive compromissos quase todas as noites.


Não perdia uma oportunidade de comparecer a jantares, eventos sociais e festas. Conheci muita gente. Com o passar do tempo, criei uma extensa rede de relacionamentos que se tornou fundamental para meus negócios. Já vendi imóveis para três gerações da mesma família.  

Depois de fazer um caminhão de amigos, achei que era hora de testar minha habilidade para influenciar as pessoas. Quando conhecia alguém que planejava construir uma casinha para vender, eu o apresentava a outra pessoa que estava erguendo um sobrado. Mostrava aos dois como poderiam unir forças para investir num prédio maior, de três ou quatro andares.

Na oportunidade seguinte, eles já conseguiam erguer uma construção maior. Foi assim que surgiram os primeiros projetos de incorporação imo­biliária de São Caetano do Sul. Eu nunca me tornei sócio. Apenas facilitei os negócios e garanti o direito de vender os imóveis.

Em 1983, decidi que era hora de montar minha própria empresa. Foi quando fundei a Aparecido Viana Imóveis. O negócio começou com uma boa clientela, entre as quais incorporadoras que eu já atendia como corretor desde jovem.

Os negócios com imóveis residenciais iam bem, mas comecei a perceber problemas nas vendas de salas comerciais e escritórios. As grandes indústrias estavam deixando o ABC paulista, e as prefeituras locais nada faziam para atrair novas empresas.  

Um dos problemas é que ninguém se interessava em construir edi­fícios comerciais em São Caetano do Sul. Em 1992, havia apenas dois prédios de escritórios na cidade. A legislação municipal impedia a construção de edifícios mais altos e, além disso, as empresas de serviços evitavam se instalar lá. A maioria era afugentada pela alíquota do imposto sobre serviços, mais alta do que nos municípios vizinhos.


Muitos dos vereadores da ci­dade eram meus conhecidos. Alguns haviam sido até meus clientes. Sempre que eu encontrava algum deles, começava com uma ladainha sobre os problemas que atrasavam os negócios imobiliários e pedia que fizessem alguma coisa para alterar as leis. Não sei ao certo quanto pesou minha influência, mas o fato é que, em 1996, a legislação foi alterada.

Mesmo com a mudança na legislação, as grandes incorporadoras e construtoras não se interessavam pela região. Continuei, então, formando grupos de investidores com amigos e pessoas próximas, que juntavam dinheiro para comprar terrenos e construir prédios comerciais. Minha empresa trabalhava como administradora do negócio e fazia a gestão financeira das obras, além de vender as salas e os escritórios.  

No final dos anos 90, fui procurado por executivos da fabricante de equipamentos refratários Magnesita. A empresa era proprietária de uma imensa área ociosa de 400 000 metros quadrados em São Caetano do Sul, que pertencera a uma cerâmica desativada. Primeiro, propus avaliar a área para tentar vendê-la.

Depois, sugeri transformar o terreno num bairro que reunisse serviços, moradia e lazer num mesmo lugar. A Magnesita gostou da ideia e segui adiante. Foi assim que surgiu o meu projeto mais ambicioso: o Espaço Cerâmica, com prédios comerciais, residenciais, 122 lotes para construir casas, shopping center e hospital.  

Em 2005, começamos a viver um grande momento. As grandes construtoras e incorporadoras brasileiras abriram o capital na Bolsa de Valores. Com bastante dinheiro em caixa, passaram a buscar oportunidades de investimento na região do ABC. Consegui atrair para o Espaço Cerâmica empresas como Rossi, Gafisa e Multiplan, que me contrataram para vender seus empreendimentos. Esses negócios ajudaram a Viana a dar um salto. Em cinco anos, quadruplicamos nossas receitas.

O ABC paulista sempre foi meu principal mercado, mas já vendi imóveis em São Paulo, no Guarujá, em Curitiba, em Goiânia e em Miami. Sempre adorei o contato direto com os clientes, mas hoje já não tenho tanto tempo para isso. Estou passando parte das responsabilidades para outras pessoas. Meus três filhos e uma nora também trabalham comigo na imobiliária. E tenho uma equipe de diretores com autonomia para tomar decisões.

Hoje me concentro mais em planejar o futuro da Viana. Eu quero atuar mais fortemente em planeja­men­to, urbanização ou reurbanização de áreas. Tenho uma equipe de 500 corretores, que precisam ter algo novo todos os dias para vender.

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