Jeroslau Pauliki, fundador da rede Lojas MM. (Marcelo Almeida)
Da Redação
Publicado em 2 de março de 2011 às 08h46.
O paranaense Jeroslau Pauliki, de 66 anos, é um dos muitos descendentes de imigrantes europeus que, no início do século passado, deixaram seus países para procurar uma vida nova no sul do Brasil. Pauliki é filho de um ucraniano que se estabeleceu nos arredores de Ponta Grossa, nos Campos Gerais do Paraná. Ali, há 32 anos, ele fundou a Lojas MM, que faturou cerca de 400 milhões de reais em 2010. “A empresa começou como uma pequena loja num bairro de periferia”, diz Pauliki. “Os primeiros clientes eram gente humilde, como meus pais.” As Lojas MM cresceram com a decisão de vender fiado para consumidores pobres. Hoje, há 140 lojas MM em cidades do Paraná e de Santa Catarina. No final de 2010, Pauliki anunciou seu interesse em comprar parte das lojas do Baú da Felicidade, do Grupo Silvio Santos, no Paraná. “Ainda há muito espaço para crescer no estado”, diz Pauliki. Neste depoimento a Exame PME, ele fala sobre como foi empreender no sul do país e seus planos para o futuro.
Nasci numa família humilde de imigrantes ucranianos em 1944, na cidade de Arapoti, no Paraná. Meu pai era operário e minha mãe dona de casa. Tenho só uma irmã, mais nova. Comecei a trabalhar muito cedo, aos 8 anos, para ajudar meus pais a pagar as contas. Meu primeiro trabalho foi fazer e vender pirulitos. Depois, fiz um pouco de tudo. Fui vendedor de verduras, cobrador de ônibus, auxiliar de oficina mecânica e barbeiro.
Meu grande sonho de adolescência era conseguir um emprego como auxiliar de escritório. Aos 18 anos, fiz um curso de datilografia e de redação comercial. Pouco tempo depois, fui contratado para uma vaga numa madeireira. Foi uma ascensão social.
Logo no primeiro dia levei uma bronca. Eu precisava datilografar um texto em várias cópias, mas não sabia usar o papel-carbono. Algumas vias saíram borradas e outras com o texto replicado no verso, porque eu coloquei o carbono ao contrário na máquina de escrever. Meu chefe, ao ver a confusão, disse: “Esse moço não vai dar para nada”. Levei um choque. Foi como se um buraco tivesse se aberto na minha frente. Mas me esforcei para melhorar e me manter no emprego.
Em 1978, aos 34 anos, trabalhava como gerente numa fornecedora de materiais para tapeçarias e marcenarias em Ponta Grossa. Também estudava economia numa faculdade da cidade. Um dia, fui cobrar um cliente numa cidade vizinha. Ele não tinha como pagar e quitou a dívida com móveis, que coloquei à venda. Vendi tudo rapidinho. Percebi, então, que estava diante de uma oportunidade. Já vinha notando, em várias cidades pequenas para onde viajava a trabalho, muitas lojas simples de móveis. Convidei um colega de trabalho para ser meu sócio e abrimos uma loja dessas.
Nenhum de nós tinha dinheiro guardado para investir. Eu vendi uma Brasília amarela e meu sócio pegou empréstimo com um parente. Abrimos a loja num pequeno galpão, que pertencia a meu sócio, onde funcionava um bar no bairro da Ronda, na periferia de Ponta Grossa. Demos uma boa arrumada no lugar e o batizamos de Mercado de Móveis Ponta Grossa. Compramos um caminhão para fazer entregas e algumas mesas, cadeiras, cômodas e baús, além de fogões a lenha e a gás.
Nossa ideia era atender consumidores sem crédito e que, por isso, não podiam comprar em grandes lojas tradicionais. Muita gente acha que só porque o Paraná é um estado rico, não há gente pobre por lá. Mas há. A maior parte delas é de lavradores e colonos — gente muito simples, como meus pais. Aprovávamos o crediário com base na palavra deles, sem pedir nada como garantia. Era olho no olho. Foi arriscado. Muitos amigos diziam que estávamos malucos, que a empresa quebraria logo. Mas não foi assim. A loja deslanchou.
Nos anos seguintes, inauguramos mais oito lojas em cidades do interior, como Ivaí, Irati e Castro. Eu sempre viajava para conhecê-las antes de abrir uma loja. Nessas andanças, constatei que o Paraná muda bastante conforme a região. O norte, por exemplo, onde ficam cidades grandes, como Londrina e Maringá, era mais movimentado e mais parecido com o interior paulista do que com o restante do interior paranaense. Ali não dava para anunciar a chegada da loja e esperar que isso, por si só, chamasse a atenção. Em cada lugar, tivemos de começar como uma empresa local para conquistar a confiança da população.
Em 1993, houve um conflito de interesses com meu sócio. A empresa crescia ano a ano, mas a taxas pouco expressivas. Meu estilo de gestão era mais agressivo que o dele. Eu também achava necessário dedicar mais atenção aos negócios. Chegamos à conclusão de que tinha chegado o momento de cada um seguir seu rumo e comprei a participação dele.
Os anos seguintes ao lançamento do Plano Real foram de bastante expansão. Com a economia estável, os consumidores puderam planejar as finanças da família e, com isso, as vendas da empresa dispararam. A partir dessa época, notei uma mudança rápida no perfil dos clientes. Com a chegada de grandes indústrias ao estado, apareciam cada vez mais consumidores que se mudavam do campo para a cidade. Também vinha mais gente de outros estados comprar móveis porque havia se mudado para o Paraná em busca de mais qualidade de vida.
Não queria para minha rede o mesmo destino de varejistas como o Mappin, de São Paulo, e as paranaenses Hermes Macedo e Móveis Pinheiro, que tinham fechado as portas. Por isso, em 1999, meu filho Márcio, que é administrador de empresas, começou a arrumar a casa. Ele trabalha comigo desde os 15 anos. Iniciou como office-boy e depois foi vendedor. Hoje, é superintendente. Márcio colocou em prática um plano para aprimorar a gestão. Entre as mudanças, estava a criação de uma controladoria, que levantou os custos por mercadoria vendida. Passamos a procurar onde eliminar desperdícios e aumentar a rentabilidade. Dali por diante, a empresa cresceu entre 10% e 15% ao ano.
Em 2003, quando tínhamos 34 lojas, pensei em abrir espaço nas prateleiras para novos produtos. Passamos a oferecer também celulares, notebooks, eletroeletrônicos e brinquedos. A diversificação ajudou a trazer uma nova clientela, inclusive gente de maior poder aquisitivo. As vendas explodiram. Em três anos, a empresa mais que dobrou de tamanho. A concessão de crédito ficou mais criteriosa, mas não nos afastou da vocação original de atender consumidores de baixa renda. Para parcelar as compras, bastava mostrar a carteira de trabalho e estar empregado há no mínimo dois anos.
Somente dois anos atrás decidi avançar para além das fronteiras do Paraná. Em 2008, compramos a rede varejista Vieira Móveis, de Santa Catarina. Foi uma decisão importante. Hoje, as 21 lojas catarinenses respondem por 25% das receitas. No mesmo ano, iniciamos as vendas pela internet. Também abrimos uma loja na cidade paulista de Itararé. Crescer maciçamente em São Paulo é um plano para um futuro mais distante. Pretendemos abrir novas lojas no mercado paulista somente a partir de 2013 ou 2014. Até lá, no curto prazo, manteremos o foco no Paraná, onde temos 119 lojas, e em Santa Catarina, onde acredito haver muito espaço para crescer.
Hoje, sou dono de uma cadeia de lojas de móveis que está presente em 127 cidades, dá emprego a mais de 2 500 pessoas e fatura 400 milhões de reais ao ano. Em 2013, quero ver a Lojas MM faturar seu primeiro bilhão. Quando isso acontecer, não pretendo mais estar à frente do negócio. Em dois anos, devo assumir a presidência do conselho de administração e passar o comando ao Márcio.
Quando olho para trás, penso que o sucesso da Lojas MM se deve a algumas decisões acertadas. Uma foi ter um sistema próprio de crediário. Outra, um rígido controle do caixa. Nunca peguei emprestado mais de 15% do faturamento. Às vezes, acho que eu poderia ter sido mais arrojado, em especial nos primeiros anos. Mas, no fim, está tudo ótimo. Sempre trabalhei com honestidade e paixão e me esforcei muito desde que ouvi meu primeiro chefe dizer que eu não dava para nada. Tenho de agradecer a ele por ter me dado o empurrão para andar bem além de onde eu poderia ir.