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4 empreendedores que crescem junto com os games

O mercado brasileiro de jogos eletrônicos movimentou 1,2 bilhão de dólares no ano passado — 20% mais do que em 2012. Conheça quatro empreendedores que estão aproveitando o momento para expandir suas empresas

Andreas Diegues, da Click Jogos (Daniela Toviansky / EXAME PME)

Andreas Diegues, da Click Jogos (Daniela Toviansky / EXAME PME)

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Da Redação

Publicado em 17 de setembro de 2014 às 12h19.

São Paulo - A fase atual do mercado brasileiro de jogos eletrônicos é das mais animadoras. No ano passado, os gastos dos brasileiros com games em todas as plataformas alcançaram 1,2 bilhão de dólares, um quinto mais do que em 2012.

“Até 2016, os gastos deverão crescer em média 15% ao ano no Brasil”, diz Peter Warman, presidente da consultoria holandesa Newzoo, que faz pesquisas mundiais sobre o setor. “É mais do que o dobro do que estimamos para o mercado global.” Em 2013, os brasileiros também compraram mais consoles.

O faturamento com a venda de aparelhos cresceu 12,3%, de acordo com a consultoria GfK. A seguir, conheça as histórias de quatro pequenas e médias empresas que estão crescendo ao aproveitar as oportunidades do mercado brasileiro de games. Para seus empreendedores, o jogo está só começando.

Moedas de mentirinha

Quanto você acha que gastaria para decorar seu quarto com um piano cor-de-rosa, uma cadeira gótica e um vaso com plantas tropicais? Não faz a mínima ideia? Nós também não — mas os empreendedores Fabio Nascimento, de 36 anos, e Glaucia Gregio, de 40, podem ajudar.

“Dá mais ou menos 22 habbo moedas”, diz Glaucia. Habbo moeda é a moeda usada no mundo virtual do Habbo Hotel, um jogo em que bonequinhos de pixels podem montar quartos de pixels com objetos — adivinha do quê? — como os descritos acima. Toda essa conversa seria muito maluca, a não ser por um detalhe importante.

Para comprar habbo moedas é preciso desembolsar dinheiro de verdade. A cotação é a seguinte: 1 real vale 3 habbo moedas. É aí que a coisa começa a fazer sentido para Glaucia e Nascimento. Eles são donos da ­E-Prepag, empresa paulistana que mantém um sistema de pagamentos para jogos virtuais.


Noutras palavras, a E-Prepag é uma espécie de operadora de câmbio em que é possível trocar reais por moedinhas do mundo dos games. Deu para entender? Ufa.

Em 2013, a E-Prepag movimentou estimados 32 milhões de reais — 75% mais do que no ano anterior — em transações financeiras de jogadores que compram alguma coisa dentro de seus games favoritos. Por meio da E-Prepag, é possível comprar créditos para gastar em mais de 1 000 jogos para computador.

Entre os mais conhecidos estão o Fifa, que simula partidas de futebol, e o Need for Speed, jogo de corrida de rua. Há quatro maneiras de ter acesso aos créditos. A mais simples é comprando pelo site da E-Prepag. Ao final da compra, o jogador recebe um código, que deverá ser digitado no site do jogo — e que dará acesso às moedas de outros mundos.

Quem não costuma comprar pela internet pode adquirir cartões pré-pagos de 20 reais em supermercados e livrarias. Ainda é possível fazer a compra em pequenos estabelecimentos comerciais, como bancas e papelarias, por meio de uma maquininha como a de recarga de celular. Há também uma rede de lan houses credenciada para utilizar um sistema próprio da E-Prepag, que funciona via internet. “Temos mais de 50 000 pontos de venda espalhados pelo país”, diz Nascimento.

Um desses lugares é a Wnet Lan House, que fica no bairro Igarapé, em Porto Velho, capital de Rondônia. Desde outubro de 2012, o empreendedor Eduardo Silva, de 29 anos, é um parceiro da E-Prepag. Os clientes são adolescentes que, todas as tardes, lotam os 12 computadores reservados para jogos.

Os créditos são usados em games como Point Blank, em que agentes de um governo fictício combatem revolucionários rebeldes, e GunBound, cujo objetivo é bem mais nobre — proteger a princesa Rena do avanço das forças do mal que ameaçam o longínquo Planeta de Lond. “Perto de 15% do meu faturamento vem da venda de créditos para jogos”, diz Silva.


Sempre que alguém compra créditos da E-Prepag a empresa fica com uma comissão que varia de 10% a 20% do valor total. A comissão dos lojistas é negociada de acordo com o volume de vendas. Todos os anos, Glaucia e Nascimento participam de feiras internacionais nas quais procuram os representantes das publicadoras internacionais dos jogos do momento para tentar estabelecer novas parcerias.

Os dois se conheceram em 2003, quando seus pais se tornaram sócios de uma empresa que vendia sistemas de recarga para celulares, a Rede Prepag, que chegou a ter mais de 100 000 pontos de venda em todo o Brasil e foi vendida em 2006.

“Nossos pais sempre eram procurados por empresas de games que queriam oferecer créditos para os jogos por meio do sistema montado para recarga de celulares”, diz Nascimento. “Depois que eles se desfizeram do negócio, decidimos criar a E-Prepag para atender a essa demanda.”

Para os próximos anos, Glaucia e Nascimento pretendem operar em outros países da América Latina — região onde o mercado de games movimentou 3 bilhões de dólares no ano passado, 11% mais do que em 2012. A expansão deverá começar por países como Peru e Chile. “Nossa rede já está consolidada no Brasil. Agora pretendemos conquistar novos mercados”, afirma Glaucia. “A E-Prepag está pronta para passar de fase.”

Fábrica de joguinhos

Não se deixe enganar pela cara de malvado que o publicitário Mitikazu Lisboa, de 36 anos, faz na foto aí à esquerda. Quer saber a verdade? Lisboa vive com a cabeça num mundo encantado, onde ursinhos coloridos precisam acumular um montão de guloseimas para ficar mais resistentes e poderosos.

Esse é o cenário de Candypot, um dos jogos de maior audiência da desenvolvedora paulistana Hive Digital, da qual Lisboa é dono. Criado há quase dois anos, o Candypot pode ser acessado de redes sociais como Facebook e Orkut e em smartphones e tablets. Nas lojas de aplicativos Apple Store e Google Play, onde está disponível desde março de 2013, o joguinho já foi baixado por 300 000 pessoas.

“No ano passado, mantivemos uma média de 60 000 acessos diários em 17 países”, afirma Lisboa. “É um crescimento de 70% em relação à média de acessos do ano anterior.”

A Hive Digital faturou 9 milhões de reais em 2013, quase um terço mais do que em 2012. Joguinhos como o Candypot e o Poker Hall — em que é possível disputar partidas de pôquer com várias pessoas ao mesmo tempo pelo Facebook — foram responsáveis por 35% do faturamento em 2013.


O restante veio da produção de jogos para campanhas publicitárias de empresas, como Intel, P&G e Ambev. “Mantemos uma agência de marketing digital própria para administrar as campanhas dos clientes que utilizam os nossos jogos”, afirma Lisboa.

Qualquer pessoa pode ter acesso gratuito aos jogos da Hive no Facebook ou nas lojas de aplicativos Apple Store e Google Play. De onde vêm as receitas, se não é preciso pagar para jogar? “Ganhamos dinheiro sempre que alguém compra um item dentro do jogo para melhorar seu desempenho”, diz Lisboa.

Por preços que variam de 0,99 a 50 dólares, é possível adquirir doces mágicos que dão mais tempo de vida aos ursinhos do Candypot e ter acesso a fichas extras para apostar nas partidas do Poker Hall.

Os jogos da Hive Digital seguem um modelo de remuneração conhecido como freemium, uma mistura de free (gratuito) e premium. “O jogo é dado de graça, mas quem quiser avançar de fase mais rapidamente precisa pagar com o cartão de crédito ou convidar mais amigos para jogar”, afirma Lisboa.

Entre os títulos famosos que geram receitas pelo modelo freemium estão o Farm­ville, produzido pela desenvolvedora americana Zynga, em que é possível criar a própria fazendinha, e o Clash of Clans, da finlandesa Supercell, que simula estratégias de guerra entre vilarejos fictícios.

Os jogos para redes sociais e para celulares e tablets têm provocado verdadeira revolução no mercado mundial de games. Até 2008, quando as lojas de aplicativos da ­Apple e do Google ainda não existiam, os jogos para smartphone tinham relevância praticamente nula — e os games em redes sociais, como Facebook e Orkut, ainda engatinhavam.

Estima-se que, em 2012, o faturamento global desses tipos de game tenha ultrapassado o de jogos de console. Uma pesquisa feita pela consultoria Canalys apontou que das 25 empresas que mais faturam com aplicativos em todo o mundo, apenas uma não é de games.

No Brasil, os jogos para redes sociais e para dispositivos móveis representaram um quarto do total de gastos dos jogadores em 2013, de acordo com a Newzoo, consultoria holandesa especializada no mercado de games. “A tendência é que esses jogos ganhem mais importância à medida que crescem as vendas de smartphones e o acesso à internet se torna mais democrático no Brasil”, diz Lisboa.


Disneylândia virtual

As tardes do paulistano Leonardo Pereira, de 9 anos, costumam ser bem atarefadas. Leonardo estuda o 5o ano do ensino fundamental e, quando não está fazendo o dever de casa ou jogando bola com os amigos da vizinhança, ele gosta de pilotar um carro de Stock Car e de sair para dar umas voltas com sua Ferrari. Calma — Leonardo não é nenhum motorista prodígio, muito menos aprendiz de Riquinho Rico.

Esses são os carros que ele usa em seus jogos favoritos de computador. “Jogo pelo menos 1 hora por dia”, diz. “O mais da hora é a sensação de deixar todo mundo comendo poeira.”

Além de passear e de apostar corridas, Leonardo gosta de brincar de estacionar o maior número de carros no menor tempo possível — alguém ainda duvida que ele vai se tornar um bom motorista? — e de jogar sinuca pelo computador. O lugar onde ele encontra tudo isso é o site Click Jogos, criado pelo empreendedor paulista Andreas Diegues, de 24 anos.

Assim como Leonardo, 15 milhões de crianças e adolescentes de 8 a 14 anos acessam o Click Jogos todos os meses. Eles têm à disposição cerca de 17 000 jogos, separados por grandes categorias: ação e aventura, futebol e carros. “Costumo dizer que somos um parque de diversões virtual”, afirma Diegues.

Em 2013, o Click Jogos alcançou um faturamento de 21 milhões de reais, mais do que o dobro do ano anterior. Algo em torno de 90% das receitas vêm da publicidade veiculada no site. Além dos tradicionais banners e vinhetas, alguns anunciantes também patrocinam páginas com jogos exclusivos.

É o caso da Unilever, que mantém uma seção com jogos do personagem Max — um leão criado para divulgar a marca de sucos Ades — e da fabricante de brinquedos Mattel, que patrocina as páginas de jogos da boneca Barbie e dos carrinhos Hot Wheels. Os outros 10% do faturamento vem da cobrança de pequenas transações feitas em jogos que operam pelo modelo freemium.


“Há uma grande oportunidade a ser aproveitada com os jogos que são parcialmente pagos”, diz Ronaldo Bastos, de 39 anos, um dos sócios do Click Jogos. “No ano passado, os gastos dos usuários no site praticamente triplicaram em relação a 2012.”

Com tanta oferta de games, será que os pais dos visitantes do Click Jogos não ficam preocupados por seus filhos passarem tanto tempo em frente ao computador? Segundo uma pesquisa encomendada pelo Click Jogos à consultoria Na Mosca, especializada em entretenimento e marketing digital, a resposta é não.

Quase 80% das mães de crianças e adolescentes consultadas disseram acreditar que os videogames podem ajudar no desenvolvimento cognitivo e no raciocínio lógico da molecada. 

Se olharmos para o exemplo de Diegues, as mães consultadas na pesquisa têm certa razão. Jogador de videogames desde criança, ele fundou o Click Jogos aos 15 anos — na época, foi sua mãe, a empresária Cristina Diegues, de 57 anos, quem emprestou o nome para a empresa ser aberta.

“Aprendi a programar com 12 anos e comecei a criar sites por pura diversão”, afirma Diegues. Seu próximo desafio é adaptar o Click Jogos aos dispositivos móveis, como smartphones e tablets.

O primeiro passo foi dado em janeiro deste ano, quando a empresa lançou dois aplicativos para essas plataformas em parceria com desenvolvedoras nacionais e internacionais. “Se a criançada está disposta a jogar em novas plataformas, nós vamos acompanhar”, diz Diegues.


Games de prateleira

Na noite de 11 de março de 2013, quem passou pela avenida dos Holandeses, uma das principais vias de São Luís, no Maranhão, presenciou uma cena inusitada. Perto da meia-noite, cerca de 200 pessoas se reuniam na altura do número 10 517 para esperar pela abertura da loja de jogos e consoles UZ Games.

O pessoal estava lá para o lançamento do God of War — Ascension, jogo de ação e aventura em que o guerreiro espartano Kratos precisa reunir forças para combater Ares, o deus grego da guerra. “Foi a maior festa”, diz o empreendedor Roberto Lazera Junior, de 27 anos, dono da loja.

“Teve distribuição de brindes, torneio de jogos e apareceu até um sujeito fantasiado de guerreiro de Esparta.” Naquela noite, a loja de São Luís faturou, em pouco mais de 2 horas, o equivalente a uma semana de vendas.

Histórias assim são comuns nas 75 lojas que compõem a rede da UZ Games, fundada pelo paulistano Marcos Khalil, de 45 anos. “Sempre que fazemos um evento de lançamento, as lojas ficam lotadas de fãs querendo ser os primeiros a levar o jogo para casa”, diz Khalil.

Com a ajuda deles, em 2013 a UZ Games alcançou receitas de 71 milhões de reais — algo em torno de 20% mais que no ano anterior. “Estamos presentes em 13 estados do país.”

O crescimento da UZ Games se deve a uma particularidade do mercado brasileiro de games. Enquanto as receitas globais dos jogos para console decresceram 1% em 2013 em relação ao ano anterior, por aqui as vendas cresceram quase 30% no mesmo período.

“O Brasil é uma exceção à regra no mercado mundial de games físicos”, diz Oliver Römerscheidt, diretor da consultoria alemã GfK, que mapeia a venda de jogos para console e aparelhos de videogame. O crescimento só não é maior por causa do alto custo dos aparelhos.


No Brasil, uma pessoa paga 65% mais por um console do que na França. No fim do ano passado, pipocaram pela internet ofertas de agências que vendiam pacotes de viagem para Miami ou Orlando, incluindo hospedagem, passagens de avião e a compra de um PlayStation 4, o último console da Sony.

O custo do pacote era semelhante ao que se pagaria só pelo aparelho no Brasil — 3 999 reais. “Essa realidade tende a mudar à medida que grandes empresas estão nacionalizando parte da produção dos aparelhos”, diz Römerscheidt. “Com isso, os preços dos consoles deverão caber no bolso de mais brasileiros.”

Para atender ao possível aumento da demanda nos próximos anos, Khalil tem feito pequenos ajustes no modelo de negócios da UZ Games. No ano passado, ele criou um modelo mais compacto de lojas cujo investimento inicial é metade do necessário para abrir uma unidade num shopping center.

“A intenção é abrir lojas em estações de metrô e pequenos centros comerciais de cidades do interior”, afirma Khalil. “Já temos seis unidades desse tipo em funcionamento.”

Outra medida foi fortalecer o braço da UZ Games na internet. Há pouco mais de um ano, além de manter a própria loja virtual, a UZ Games passou a administrar a venda de jogos, consoles e acessórios dos sites de varejistas como Walmart, Casas Bahia e Ponto Frio.

“Sempre que alguém compra um game nessas lojas, os produtos saem de nossos estoques e recebemos uma comissão pela venda”, diz Khalil. No ano passado, essas parcerias representaram 5% do faturamento da rede. “Essa parcela deverá dobrar em 2014.”


Mais do que diversão

Três áreas que representam mercados importantes para pequenas e médias empresas da cadeia de produção de jogos eletrônicos

1 Publicidade

Até 2016, os jogos criados para promover produtos e serviços e a publicidade veiculada em videogames deverão movimentar 7,2 bilhões de dólares no mundo todo — mais que o dobro do registrado em 2011. Uma pesquisa feita pela primeira vez no ano passado pela desenvolvedora paulistana Hive aponta que os investimentos em jogos para campanhas publicitárias no Brasil chegaram a 70 milhões de reais

Quem pode aproveitar: Desenvolvedores de jogos eletrônicos para plataformas, como celulares, tablets e redes sociais e estúdios de design e de animação em 3D

Quem são os clientes: Grandes empresas de bens de consumo e agências de publicidade e de marketing digital responsáveis por campanhas de divulgação de massa

2 Recursos humanos

Estima-se que 70% das 2 000 maiores empresas do mundo usem jogos eletrônicos para treinar seus funcionários e fazer campanhas para aumentar a produtividade no trabalho. Em 2013, o mercado mundial de jogos de engajamento alcançou receitas de 500 milhões de dólares em 2013 — e esse valor deverá ser cinco vezes maior até o ano de 2016

Quem pode aproveitar: Desenvolvedores que produzem jogos sob demanda para empresas de diferentes setores e escolas de negócios

Quem são os clientes: Consultorias de recursos humanos e empresas que precisam capacitar seus funcionários para funções que exigem alta precisão — como operar equipamentos em plataformas de petróleo e em usinas de extração de minério

3 Educação

Em 2012, o mercado mundial de jogos educacionais movimentou 1,5 bilhão de dólares. Até 2017, as receitas deverão chegar a 2,3 bilhões de dólares, um crescimento médio anual de mais de 8%.

Uma pesquisa feita nos Estados Unidos aponta que 70% dos professores consideram que esses tipos de jogo aumentam a capacidade de interação dos alunos e facilitam o aprendizado

Quem pode aproveitar: Desenvolvedores de jogos eletrônicos multiplataforma, estúdios de locução e efeitos sonoros e empresas que prestam serviços de tradução e revisão

Quem são os clientes: Editoras que produzem material didático para o ensino fundamental e médio, redes de ensino e secretarias públicas de Educação

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