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Neon corre atrás de novo banco parceiro — há 10 opções na mesa

Por trás da fintech inovadora, há um obscuro e enrolado banco. O banco quebrou; a fintech, não

Para tentar reverter a crise que se instaurou, a Neon Pagamentos corre contra o relógio para encontrar um novo parceiro bancário. (Banco Neon/Reprodução)

Para tentar reverter a crise que se instaurou, a Neon Pagamentos corre contra o relógio para encontrar um novo parceiro bancário. (Banco Neon/Reprodução)

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Naiara Bertão

Publicado em 4 de maio de 2018 às 18h43.

Última atualização em 4 de maio de 2018 às 18h44.

A notícia de que o Banco Central bloqueou nesta sexta-feira as contas do Banco Neon S.A, alegando irregularidades na instituição, levou a companhia a uma corrida para explicar a seus correntistas e ao mercado sua rocambolesca divisão societária. É uma divisão que escancara um lado pouco conhecido do mercado de bancos digitais no Brasil: por trás de todo o discurso de modernidade, as fintechs muitas vezes precisam se pendurar em instituições pra lá de tradicionais (e, no caso do Neon, prá lá de enroladas).

Há, basicamente, duas empresas. O Banco Neon S. A. até 2016 era o banco mineiro Pottencial, que teve seu nome alterado. Foi esta instituição que quebrou nesta sexta-feira. Mas o lado mais conhecido da empresa, seu braço digital, é a Neon Pagamentos, uma fintech que até 2014 era a empresa de cartões pré-pagos Controly. A Neon Pagamentos não sofreu intervenção – mas também não tem nenhum cliente. Todos os seus 600.000 clientes baixaram o aplicativo da Neon Pagamentos, mas na verdade têm seu dinheiro atrelado ao Banco Neon, instituição de tijolos que até esta sexta-feira era desconhecida pela imensa maioria de seus clientes.

Pedro Conrade, presidente da Neon Pagamentos, recebeu EXAME na sede da companhia, um escritório recém-inaugurado na zona oeste da capital paulista. Respondeu à mesma pergunta que vinha sendo feita desde o início da manhã por seus correntistas: “Mas não é a mesma empresa?”. Não, esclarece Conrade. O Banco Neon S.A. é responsável pela operação: empresta dinheiro no cartão de crédito e tem 600.000 contas de clientes sob custódia.

Os clientes da Neon não conseguiram abrir seu aplicativo nesta sexta-feira – recebiam uma pouco transparente mensagem de que o aplicativo estava “temporariamente fora do ar para melhorias”. Quem tentou ligar no atendimento ao cliente ouviu uma gravação semelhante. Na verdade, não puderam operar porque o dinheiro está numa instituição que teve sua liquidação extrajudicial decretada pelo BC.

Segundo o Banco Central, não há problemas com as operações das contas dos clientes que ingressaram no banco a partir da Neon Pagamentos. Ainda assim, os recursos depositados nessas contas estão bloqueados . Pelas regras do sistema financeiro, os correntistas que têm até 250.000 reais no Neon serão ressarcidos pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC) num prazo de até dez dias. De acordo com o BC, todos os depósitos são inferiores a 250.000 reais. Ainda segundo o BC, há um total de 22 milhões de reais nos cartões pré-pagos do Neon. Como esses recursos ficam depositados no Banco Central, estão à disposição dos clientes. O interventor responsável pela liquidação extrajudicial do Banco Neon é Cornelio Pimentel, ex-funcionário do Banco Central.

O episódio aconteceu apenas um dia depois de o Neon anunciar o recebimento de um aporte de 72 milhões de reais de diversos investidores. “A rodada de investimentos continua intacta”, disse um desses investidores. Segundo ele, os recursos não estão depositados no banco Neon, mas em outras instituições, e serão usados no plano de expansão desenhado pela fintech.

Noiva procura

Para continuar crescendo, o Neon precisa de um novo parceiro – de preferência sem os esqueletos no armário que tinha o Pottencial.

O Banco Neon nasceu em julho de 2016 a partir de uma joint-venture entre a Controly e o banco Pottencial, controlado da família Géo. No contrato de joint-venture ficou acordado que ao banco caberia a custódia e a abertura de contas, enquanto a startup seria a porta de entrada de clientes, que cuidaria do marketing e do atendimento ao usuário. As próprias operações e as equipes, assim como os controladores, continuaram separados. O ex-Pottencial, hoje com pouco mais de 40 funcionários, ficou em Belo Horizonte e continuou nas mãos da família fundadora. O Neon Pagamentos, de Conrade, continuou com a base em São Paulo, onde trabalham quase 200 pessoas. Ambos, contudo, passaram, a partir de 2016, a ter o mesmo nome. “Achávamos que seria melhor para não confundir o cliente, mas acabamos sendo prejudicados agora por isso”, diz Conrade.

Para tentar reverter a crise que se instaurou, a Neon Pagamentos corre contra o relógio para encontrar um novo parceiro bancário. EXAME apurou que pelo menos dez bancos de médio porte estão em conversas com a empresa. Se depender de Conrade, uma nova joint-venture será anunciada até o início da semana que vem. Mesmo se conseguir a proeza de fechar um negócio tão rápido, precisará lidar com dois problemas: a migração dos clientes de um banco para o outro, já que as contas estão registradas no balanço do ex-Pottencial, e o resgate de sua imagem no mercado, manchada pela intervenção.

Segundo o advogado Rodrigo Valverde, sócio do escritório SV Law e especialista do setor financeiro, o processo de troca de banco demoraria no mínimo seis meses. “Em se tratando de governo, tudo é possível, mas levaria entre seis a 18 meses. Seis para migrar a carteira de clientes e 18 meses para ter a parte financeira equalizada, que envolve o Fundo Garantidor de Crédito (FGC)”, diz Valverde. Já limpar o nome dependerá mais da habilidade de comunicação da fintech.

Tática contra a demora

O episódio escancarou uma prática comum no mercado de bancos digitais: nem sempre quem conquista os clientes é o mesmo que cuida do dinheiro. Como o processo para se criar um banco é burocrático e demorado – leva-se no mínimo dois anos no Brasil –, muitas empresas de tecnologia que querem atuar no setor financeiro acabam se plugando a alguma instituição já existente para poder oferecer serviços que não poderia sem o banco, tais como conceder empréstimos, abrir contas e gerenciar investimentos.

Foi assim que atuaram, por exemplo, todas as startups financeiras (as chamadas fintechs) de concessão de crédito – como Creditas, Geru e Lendico. O Nubank demorou dois anos para receber a autorização do Banco Central para atuar como financeira, o que só saiu em janeiro deste ano. A startup, então, não precisa mais de parcerias com bancos para montar a estrutura de captação de recursos e oferta de crédito. O Nubank precisou constituir um braço de negócio específico, a Nu Financeira.

Depois de pelo menos dois anos de estudo, só no fim de abril o Banco Central mudou sua própria regra para permitir que esse tipo de startup empreste recursos sem ter, necessariamente, a intermediação de um banco. Até 26 de abril, eles só podiam atuar como correspondentes bancários.

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