Nova estratégia: Holly Sheppard começou a preparar costelas defumadas em casa para conseguir sobreviver aos meses de crise (Amr Alfiky/The New York Times)
Carolina Ingizza
Publicado em 20 de agosto de 2020 às 17h01.
Última atualização em 20 de agosto de 2020 às 17h35.
Durante um sábado recente, enroladinhos de lagosta com brioche tostado e camarão ao coco com aioli de manga deveriam ser servidos aos 210 convidados de uma festa de casamento. Um bar mitzvah para 180 convidados incluiria s'mores chamuscados e uma fonte de chocolate.
Para David Cingari, da David's Soundview Catering, de Stamford, em Connecticut, esses eventos, assim como a comida que seria servida durante uma festa de aniversário de casamento, deveriam dar um lucro total de 6.600 dólares.
Em vez disso, ele se virava como podia, servindo enroladinhos de lagosta, tacos de dourado-do-mar e smashburgers ao lado de coquetéis como o Painkiller ("Analgésico"), para clientes que respeitavam as regras de distanciamento social em um restaurante temporário, inaugurado em meados de junho. O lucro? Cerca de 600 dólares.
O restaurante, David's at the Landing, é a terceira empreitada criada pelo catering de Cingari desde o início da pandemia do coronavírus, que causou uma parada repentina no faturamento da empresa, habituada a ganhar 7 milhões de dólares ao ano. "Receberíamos 300.000 dólares só com festas de formatura neste semestre, mas agora acabou", disse.
Os bufês americanos estão em maus lençóis. Muitos acreditam que sofrerão queda de 80% a 90% no faturamento deste ano. Os refeitórios corporativos para as quais fornecem pessoal e alimentos continuam fechados. Os eventos foram cancelados ou adiados para o ano que vem. E os que chegaram a ser realizados foram muito menores.
"Fizemos um casamento para 50 pessoas. Acabou sendo um churrasco de frutos do mar no quintal, em vez da festa para 250 pessoas que esperávamos", contou Cingari.
O colapso do setor afeta bartenders, garçons e outras pessoas que trabalham em meio período nesse tipo de evento.
"Se eu pensar apenas no caso de South Jersey, sei de outros caterings e salões que estão passando por graves dificuldades", afirmou Doug Quattrini, presidente da Associação Nacional das Empresas de Catering e Eventos e produtor de eventos no Sensational Host, de Maple Shade, em Nova Jersey.
Embora os donos de bufê afirmem estar levando prejuízo, muitos acreditam estar em uma situação melhor do que a do ramo de restaurantes. Em vez de pagar aluguéis caros em regiões nobres, como a maioria dos restaurantes, os bufês pagam menos por cozinhas maiores localizadas fora do circuito.
Além disso, os donos de bufê costumam fazer parte de um grupo de empreendedores mais ágeis, acostumados a realizar os desejos mais apaixonados de casais cheios de exigências e a superar os mais estranhos desafios logísticos. Essas características os ajudaram durante a pandemia.
"Temos muito conhecimento em logística. Quando você está habituado a servir alimentos em outros locais, sabe até como usar balsa para chegar a uma ilha particular sem acesso a automóveis. Somos criativos e, neste momento, as pessoas estão pensando em como remodelar seus negócios para lidar com as atuais necessidades", disse Peter Callahan, da Peter Callahan Catering, cuja especialidade são as miniporções, como minicheeseburgers e queijo quente em miniatura.
Com o colapso do tradicional circuito dos bar mitzvahs e casamentos, os serviços de catering começaram a procurar novas formas de ganhar dinheiro.
"Este é o ano da transformação", comentou Holly Sheppard, que trabalhou durante anos nas cozinhas de Nova York antes de abrir o próprio serviço de catering no Brooklyn, o Fig & Pig, em 2011.
Sheppard estava preparando uma refeição para 600 pessoas em meados de março quando o cliente ligou para cancelar o evento. A comida, que já tinha sido paga, foi doada.
Segundo Sheppard, depois disso, os cancelamentos e os adiamentos começaram. Dos 47 casamentos programados para este ano, 40 foram adiados para o ano que vem. Os outros foram cancelados.
Com a agenda praticamente vazia no segundo semestre, Sheppard cancelou o contrato de locação do apartamento onde vivia no Brooklyn, fechou um acordo com o proprietário do prédio onde fica sua cozinha — para pagar apenas o que pode por enquanto e compensar o restante no ano que vem — e voltou a viver em sua casa de Tillson, no estado de Nova York.
Lá, ela comprou um defumador e está aprendendo as técnicas necessárias para oferecer churrascos como uma opção no bufê.
"Quero fazer churrasco de beira de estrada no interior de Nova York até que os casamentos voltem a ser realizados. Vou sobreviver a isso tudo. Fechar as portas não é opção. Eu me viro como posso", garantiu Sheppard.
Cingari também trabalhou duro no setor de restaurantes durante quatro décadas e não vai permitir que o coronavírus acabe com seu negócio.
Depois de trabalhar como chef no hotel Grand Hyatt, em Nova York, Cingari abriu um restaurante, o David's American Food and Drink, em Stamford, em 1987.
Mas, depois de uma década de trabalhos intermináveis, rotatividade constante de funcionários e noites insones, temendo não conseguir pagar os 13.000 dólares mensais de aluguel, Cingari decidiu fechar o restaurante em 1997 e se concentrar exclusivamente nos serviços de catering.
A empresa foi um sucesso e, no fim do ano, a David's Soundview Catering já contava com 85 funcionários que preparavam alimentos em uma cozinha industrial de quase 600 metros quadrados.
Para Cingari, o primeiro sinal de que as coisas não seriam normais neste ano surgiu no fim de fevereiro, quando ele foi notificado de que os funcionários de uma empresa com sede no Japão, localizada em um dos prédios em que ele gerenciava o refeitório corporativo, iniciaria trabalhos remotos como medida emergencial. Uma semana depois, um grande banco internacional decidiu fazer a mesma coisa.
"Depois disso, foi um efeito dominó. Em três semanas, todos os refeitórios estavam fechados e os eventos agendados foram cancelados", disse.
Cingari conta que recebeu dinheiro do Programa Federal de Proteção Salarial para cobrir o pagamento de cerca de 80 funcionários da empresa.
À medida que as empresas fechavam as portas e as pessoas começavam a ficar em casa em meados de março, Cingari mudou o foco do negócio. Ele percebeu que as pessoas estavam arrecadando dinheiro nas redes sociais para fornecer refeições para trabalhadores da saúde e resolveu fazer o mesmo. O dinheiro doado por meio das campanhas de redes sociais cobriu os custos com alimentos e insumos.
"Como tínhamos uma enorme cozinha industrial, podíamos produzir uma grande quantidade de refeições. Assim, começamos a preparar milhares de refeições por dia durante muitas semanas para alimentar hospitais e trabalhadores", afirmou, embora não tenha lucrado com a empreitada.
A iniciativa perdeu força com a queda no número de casos do coronavírus em Connecticut, no fim da primavera boreal.
Então, Cingari mudou novamente e passou a vender produtos de supermercado difíceis de encontrar, como papel higiênico e lenços desinfetantes, além de refeições prontas que custavam 50 dólares e alimentavam uma família de quatro pessoas. Ele contou que, no início de junho, vendeu cerca de 60 refeições em uma noite de sábado. "Não chegou nem perto do que ganhávamos antes, mas era melhor do que nada."
Mas isso deixou de fazer sentido quando o estado autorizou o oferecimento de refeições a céu aberto. No último fim de semana dessa empreitada, Cingari vendeu apenas cinco refeições.
Por isso, no início de julho, ele mudou de rumo mais uma vez. Em um dos prédios de um parque de escritórios onde ele gerencia o refeitório, ele tinha acesso a uma área interna de refeições e a um pátio aberto com vista para o Porto de Stamford.
Agora, Cingaria abriu um restaurante temporário no pátio, o David's at the Landing. O empresário contou que, durante uma noite de sábado recente, o tempo de espera para uma mesa no restaurante — com lugar para 65 pessoas, de acordo com as normas de distanciamento social — era de quase 2 horas.
"Não acredito que voltei a ter um restaurante. Alguém me dê um tiro! Mas, pelo menos, o negócio está cobrindo os custos e dando um pouquinho de dinheiro para as oito pessoas que trabalham lá", comentou Cingari.
Essa empreitada também não vai durar muito tempo e provavelmente fechará as portas em meados de setembro, quando as temperaturas começarem a cair em Connecticut.
Cingari esperava que o refeitório corporativo retomasse pelo menos parte da atividade no segundo semestre. Mas, com o aumento do número de casos do coronavírus em várias partes do país, ele duvida que isso possa ser realidade.
"Só penso nisso dia e noite. Espero que outra mudança seja feita em setembro para nos manter ativos até janeiro. Tem de haver alguma saída. Muitas pessoas boas trabalham comigo e tenho experiência demais para não encontrar um caminho", completou.