Inteli: chegada da primeira turma de alunos de graduação (Inteli/Divulgação)
Luísa Granato
Publicado em 29 de abril de 2022 às 18h44.
Última atualização em 30 de abril de 2022 às 09h20.
Já se fazem faculdades como futuramente. Essa é a frase que descreve o primeiro ano Instituto de Tecnologia e Liderança (Inteli), a primeira faculdade com ensino baseado em projetos do país.
Criada em 2020, com uma doação de R$ 200 milhões da família de André Esteves, sócio sênior do BTG Pactual, a iniciativa sem fins lucrativos é liderada também por Roberto Sallouti, CEO do BTG Pactual, e outros sócios do banco. Desse momento inicial, partindo de uma ideia para resolver a grande questão da falta de mão de obra especializada em tecnologia no Brasil, foram muitos aprendizados.
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“2021 foi nosso último ano pré-operacional. A gente conseguiu colocar a operação de pé em tão pouco tempo que nem eu acredito. Foi tudo, não só o prédio, mas o modelo, contratar professores, criar processos, o sistema e ainda o software”, conta Maira Habimorad, CEO do Inteli, em entrevista para a EXAME.
O ensino é tão diferente que foi necessário juntar diversos conceitos de metodologias ágeis com o método de aprendizado por projetos para criar uma forma de gerir a jornada do aluno.
E assim foi necessário criar um software próprio do zero para o Inteli, apenas uma das conquistas que saíram do papel antes da primeira turma entrar pelas portas da faculdade.
O primeiro processo seletivo foi realizado em 2021 e recebeu mais de 2.350 inscrições. Em fevereiro, os 170 alunos selecionados, de todas as regiões do Brasil, iniciaram seus estudos.
O conteúdo de quatro anos do currículo dos quatro cursos disponíveis na instituição, Engenharia da Computação, Engenharia de Software, Ciências da Computação e Sistemas de Informação, foi pulverizado ao longo de 16 módulos.
Os alunos estudam os conceitos antes da aula e chegam para o professor já com as dúvidas e muita vontade de colocar a mão na massa. Existe uma área específica da instituição que capta projetos a partir de problemas reais de empresas parceiras para que os alunos resolvam.
Neste primeiro trimestre, as turmas apresentaram projetos prontos, com produtos funcionando. E a CEO não poderia estar mais orgulhosa do resultado.
“Qualquer aluno que você perguntar o que aprendeu até aqui, ele vai falar que aprendeu a programar em uma linguagem ou outra, mas o que eles vão falar que é mais legal vai ser: aprendi a me organizar, aprendi planejamento, a ceder opinião, a ouvir, a me comunicar”, diz.
Agora o desafio é receber mais uma turma – e manter o engajamento de todos até a primeira formatura em 2025.
Serão mais 120 vagas para iniciar o curso em agosto. As inscrições estão abertas até 29 de maio pelo site. São elegíveis estudantes de todo o país e que tenham concluído o terceiro ano do ensino médio.
Para quem se interessou, no domingo, dia 1, será realizado o Inteli Day. O encontro presencial é uma oportunidade para candidatos e familiares conhecerem o prédio da faculdade e tirarem dúvidas sobre o modelo acadêmico e o processo seletivo.
O Inteli estará de portas abertas das 10 às 14 horas na Avenida Professor Almeida Prado, 520, em São Paulo. Confira como participar pelo site.
Acho que o que eu aprendi é algo que eu já sabia, mas só vivenciando que vi mesmo. Acho que é algo importante quando vai construir algo novo, e novo de tantos jeitos e em qualquer perspectiva que olhe. É no modelo acadêmico, no papel dos professores, no corpo de alunos diverso, no modelo de chamamento público, em sermos sem fins lucrativos e com mentalidade de setor privado. De todas as perspectivas, é muito inovador no modelo operacional.
A primeira coisa que aprendi, que sabia a teoria e vivi na prática, é que não tem como inovar sem errar. O [André] Esteves fala: erra rápido, barato e do seu tamanho. E foi o que vivemos. Não é intuitivo dentro do universo acadêmico ser tomador de risco, esse universo é perpetuador da tradição. Então, como criar uma cultura de conforto com o erro? Mais do que conforto, errar é a premissa. Errar é uma certeza, então temos que combinar que ao errar é para levantar a mão, dizer que errou, pedir ajuda e a gente vai resolver junto. E isso ajuda a criar uma cultura de maior aprendizado e com foco na construção.
Outra coisa que aprendi, na operação em si, do modelo acadêmico, foi no dia que terminamos o primeiro módulo e os alunos apresentaram os projetos prontos para os parceiros de mercado. Eu estou acompanhando aqui desde o início e nem sabia o que dizer. O que a gente sacou ali é que achamos uma mistura perfeita entre autonomia e acolhimento. Os alunos têm muita autonomia, ao ponto que nas primeiras semanas, quem veio da rotina de estudo tradicionais para vestibular, disse que ficou se sentindo sem saber muito o que fazer. E agora, eles chegam no final das 10 semanas para apresentar um projeto com posse do conteúdo, com apresentações sofisticadas. A qualidade me deixou sem palavras.
Acho que a primeira coisa a dizer é que, se olhar isoladamente cada parte do projeto, nada é inovador. A gente não inventou nada. Project based learning, metodologia ágil, resolução de problemas reais. Não inventamos essas coisas, elas estão no mercado.
O que a gente fez tem mais relação com atitude do que ação. Foi a coragem de questionar o modelo tradicional e de trazer todas as coisas que a gente sabe que funcionam fora para dentro da graduação. Então, nada disso é inovador, o que é inovador é fazer como fizemos.
Então, por que fazer desse jeito? A gente não acredita mais que o modelo puramente teórico de ensino vai entregar a proposta de valor que queremos. Esse modelo entrega outras propostas de valor, então não é que um é ruim e o outro bom também. A gente sabia onde queria chegar: que era a formação de líderes do futuro para a área de tecnologia. E não seria possível entregar essa proposta de valor sem os modelos que combinamos.
A metodologia juntando tudo é inovadora e foi criada por nós. Se você olhar a diretriz curricular de engenharia de computação, o documento que tem que guiar qualquer construção do curso, não tem nenhum lugar que diz que precisa ter disciplinas, que não pode usar projetos. Na verdade, ele incentiva o uso de metodologias ativas e organização no formato de competências.
Então, todas as competências que existiam organizadas em disciplinas foram para os projetos trimestrais, de 10 semanas, com conteúdo que é exatamente o mesmo em qualquer curso. A gente conseguiu fazer uma arquitetura de currículo que alocasse o conteúdo diretamente com a necessidade prática.
Então, o que acontece é que o aluno entende para que serve aquilo que está estudando na teoria. Entende parábolas, vetores, álgebra euclidiana, pois dentro das 10 semanas ele aplica aquilo no projeto. Essa intimidade entre teoria e prática é o que ajuda na fixação do conteúdo.
E quando eles terminam esse projeto, eles têm um senso de realização e algo para mostrar. Um produto que funciona. Uma coisa concreta no lugar de uma nota que seria que resultado que teria para medir. É outra métrica para medir a conquista até ali. Qualquer aluno que você perguntar o que aprendeu até aqui, ele vai falar que aprendeu a programar em uma linguagem ou outra, mas o que eles vão falar que é mais legal vai ser: aprendi a me organizar, aprendi planejamento, a ceder opinião, a ouvir, me comunicar.
Tenho que tirar o chapéu para eles. De maneira geral, em relação à experiência anterior deles, é muito fora da zona de conforto. É fundamental para os professores aprenderem a trabalhar como um time de professores. Não aquele que dá o mesmo curso em disciplinas diferentes, mas tem que trabalhar a turma, o projeto e o conteúdo em conjunto. É um alto nível de alinhamento completamente diferente. Ao mesmo tempo que usamos metodologia ágil com os alunos, os professores também fazem a review da semana para falar o que funcionou na semana, se um falou algo diferente do outro, quais as dificuldades e o que precisa alinhar melhor.
Depois, eu estou no Slack, disponível para os alunos falarem comigo. Eles também falam com o professor e ele precisa estar lá. É necessário educar a comunidade sobre como se relacionar. E por último, temos turmas muito diversas, no mesmo grupo tem gente de diferentes rendas e estados, como Sergipe, Bahia, São Paulo... E eles precisam administrar também as diferenças culturais disso.
2021 foi nosso último ano pré-operacional. A gente conseguiu colocar a operação em pé em tão pouco tempo que nem eu acredito. Foi tudo, não só o prédio, mas o modelo, contratar professores, criar processos, o sistema e ainda o software. Então, o conjunto da obra ficou pronto e recebemos a primeira turma.
Definitivamente, tenho muito orgulho do programa de bolsas. Na linha de concepção, o programa incita a discussão sobre o significado do que é mérito. Meritocracia virou um conceito rechaçado, mas com o programa a gente conseguiu trazer para a discussão algo mais interessante. A gente questionou o que é mérito. Aqui é: independentemente de onde vieram, materializaram o seu diferente para ir além. Às vezes, uma conquista de vida é ganhar a olimpíada de matemática. Mas muitas vezes a história de vida da pessoa foi ter perdido a fonte de renda da família e precisar ajudar a reorganizar para gerar renda de outra forma. E isso também é mérito.
Tivemos a oportunidade de criar um processo seletivo que reacende a discussão do que é mérito e materializa formas de trazer um público diverso e com a motivação comum de usar seu talento para melhorar a sociedade brasileira. É um ponto mais filosófico, mas me orgulho de ter executado essa visão.
E mais importante foi ver como esses alunos chegaram e como estão 10 semanas depois. O que conseguiram fazer, produzir e entregar. Mais do que isso, a sensação de realização e orgulho deles. Entre nossos parceiros, temos o Roger Chammas, vice-diretor da fundação de medicina da USP. Na entrevista que fiz com ele sobre esse início, ele me disse que o que mais chamou atenção foi que ele tinha perdido a fé na educação, achava que ser professor não era uma coisa legal.
E que a experiência [do Inteli] ressignificou a crença no poder da educação. Ele disse que aprendeu com a experiência. Ele, que é membro da academia brasileira de ciências e um dos maiores pesquisadores de câncer do Brasil, veio aqui e disse que aprendeu. Isso me orgulha muito.
Pensando no que vem pela frente, já tivemos muitas boas notícias nos primeiros meses de operação. O saldo foi positivo. Agora precisamos manter esse nível de energia e engajamento. Olhar para a operação para que perpetue isso para além dos quatro meses iniciais. Todo dia é o primeiro dia. Temos que manter o foco e ter olhar atento para o percurso completo de formação em 2025. Ainda falta muito.
Aí, o segundo desafio é dizer não. Tenho que selecionar muito bem entre as centenas de oportunidades que existem de coisas para fazer. À medida que ganhamos visibilidade, surgem ideias novas e tenho que fazer um exercício criterioso e dizer muito mais não do que sim.
E, em terceiro lugar, vem o novo processo seletivo. Já se criou aqui uma comunidade tão especial, conectada e integrada. Como a gente garante que vamos trazer gente nova para a comunidade que tenha relação com ela? Então vamos precisar fazer a integração com a segunda turma chegando para que se preserve a essência comunitária.
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