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Franquias: o que aprender com elas

As boas práticas desse sistema de expansão que podem ser copiadas em sua empresa

Roberta e Patricia Zocchio, da Experimento: usando as reclamações para melhorar o atendimento (Daniela Toviansky / EXAME PME)

Roberta e Patricia Zocchio, da Experimento: usando as reclamações para melhorar o atendimento (Daniela Toviansky / EXAME PME)

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Da Redação

Publicado em 26 de novembro de 2014 às 17h04.

São Paulo - O setor de franquias tem batido recordes no Brasil nos últimos anos. O faturamento das redes, o número de marcas e a abertura de lojas crescem mais de 10% ao ano desde 2003 (veja gráficos nas próximas páginas). Há lições importantes a tirar? O consultor Marcelo Cherto, especializado em canais de vendas, afirma que sim.

“Franquia é um sistema replicante”, diz Cherto. “O original tem de ser bom, senão não dá certo.” Para crescer de forma consistente, portanto, uma rede de franquias precisa que certas práticas de gestão estejam próximas do estado da arte. Nas páginas a seguir, listamos cinco delas. Para cada prática escolhemos, com a ajuda de especialistas, uma franquia exemplar.

A Multicoisas, rede de lojas de utilidades para casa, acompanha os indicadores financeiros dos franqueados para enxergar erros e consertá-los logo. Na Casa do Construtor, que aluga equipamentos para construção civil, o franqueado recebe diretrizes para contratar corretamente. Processos bem definidos e uma consultoria de campo permitem encontrar desperdícios nas clínicas odontológicas da Sorridents.

Na Experimento, as reclamações dos clientes viram um programa de melhoria no atendimento. E, na Ornatus, um sistema de parcerias permite desenvolver novos fornecedores. Conheça suas histórias.

FINANÇAS
Lindolfo Martin, da Multicoisas - Compare indicadores de desempenho

Como funciona

Na Multicoisas, rede de utilidades para casa sediada em Campo Grande, há um departamento só para levantar dados do desempenho financeiro dos franqueados. Um sistema conectado aos caixas de 177 lojas captura a evolução de 21 indicadores. Uma parte é formada pelos mais óbvios, como faturamento, receitas por cliente e tíquete médio por operação. Outros são mais específicos e minuciosos.

É o caso dos que mostram, em tempo real, o nível do estoque de cada uma das 4 000 mercadorias oferecidas na rede conforme são vendidas e chegam novos carregamentos. “Medimos indicadores da cadeia toda e cruzamos com os de cada loja”, diz Lindolfo Martin, de 61 anos, fundador da Multicoisas. “É um grande check-up.”

Para que serve

Toda manhã, cada franqueado recebe um relatório do desempenho de sua loja comparado à média das demais. “É um diagnóstico do que deve ser consertado”, diz Martin. Com base no levantamento, a Multicoisas faz um plano para ajudar os franqueados a melhorar. “Há uma meta e um horizonte para atingi-la”, diz Martin.

O administrador Maurício Rincon, dono de duas lojas em São Paulo, recebeu ajuda. Seus estoques demoravam cerca de três meses para girar — um terço mais do que a média. “Esse indicador estava piorando ultimamente”, diz Rincon. “Eu estava muito preocupado.”

Em agosto de 2012, Rincon foi chamado pela matriz para fazer um curso sobre estoques. Na Multicoisas, os franqueados podem escolher produtos de 400 fornecedores que entregam as 4 000 mercadorias do catálogo. No curso, Rincon fez um exercício: comparou o mix de suas lojas, localizadas em bairros com moradores de alto poder aquisitivo, ao de outras que atendem um consumidor parecido.

“Descobri que eu estava dando importância demais para itens caros porque pensava que só os de alto padrão teriam saída”, diz Rincon. “A experiência dos outros me mostrou que os itens baratos é que vendem mais, independentemente do público.”

Rincon mudou cerca de 600 produtos — panelas de 400 reais, por exemplo, deram lugar a modelos de 150 reais, e itens baratinhos, como capinhas de celular, foram incluídos. “O giro ficou no mesmo nível da média”, diz ele. “A meta agora é aumentar o tíquete médio.”

PESSOAS
Altino Cristofoletti Junior, da Casa do Construtor - Faça manuais para acertar na contratação

Como funciona?

Uma das primeiras coisas que um novo franqueado da Casa do Construtor — rede de locadoras de equipamentos para obras, como andaimes e betoneiras — recebe é um manual enorme. Nele, há uma série de instruções para preencher cada um dos 2 100 postos de trabalho existentes nas 200 unidades da rede, espalhadas em cidades do país inteiro. Ao todo, são 34 cargos.

A lista começa com funções operacionais, como mecânicos e motoristas, e vai até os gerentes e supervisores. Para cada vaga, há indicações de qual é a formação, a faixa etária e o comportamento necessários.

“É uma descrição minuciosa das tarefas atribuídas a cada função e como deve ser o profissional que irá executá-las”, diz o engenheiro Altino Cristofoletti Junior, de 54 anos, fundador da rede, e quem escreveu o manual.

O manual existe desde 1998, quando o franqueamento do negócio começou — cinco anos após o nascimento da primeira unidade, em Rio Claro, no interior paulista. “Durante esse tempo, a matriz foi um grande laboratório”, diz o sócio Expedito Arena, de 60 anos. “Aprendemos muito ali.”

Para que serve

O manual ajuda a identificar candidatos adequados às particularidades da rede. Os vendedores, por exemplo, não precisam ter experiência em vendas. “É melhor recrutar jovens de cursos técnicos de construção civil”, diz Cristofoletti. “A função está mais para a de um consultor do que a de um vendedor.”

Os franqueados dão sugestões de melhorias e, uma vez por ano, o manual pode ser revisado. Recentemente, o perfil dos motoristas foi ampliado. Antes, só quem era mais quietinho na entrevista era selecionado — a lógica é que um motorista precisa ficar 100% concentrado no volante. Agora os mais tagarelas também têm chance. “Estamos fazendo um teste”, diz Arena. “Alguns motoristas mais expansivos têm aproveitado as entregas para prospectar novos negócios.”

O transporte é um ponto sensível no negócio. Os mecânicos, por exemplo, devem ter feito um curso profissionalizante e aparentar calma na entrevista de emprego. Além disso, eles não devem ser jovenzinhos. “Descobrimos que pessoas com mais de 30 anos costumam ser mais cuidadosas com os equipamentos”, diz Arena.

CONTROLE
Cleber Soares, da Sorridents - Tenha consultores para conferir os processos

Como funciona

Na Sorridents, rede de clínicas odontológicas populares com sede em São Paulo, o franqueado aprende 28 processos para o dia a dia do negócio. “São diretrizes para encontrar clientes, manter os custos sob controle e perseguir a eficiência”, diz o dentista Cleber Soares, de 38 anos, sócio da rede.

Faz parte das obrigações do franqueado promover palestras de saúde bucal em indústrias e lojas. “É um jeito bom de tornar a clínica conhecida na vizinhança”, diz Soares. As recepcionistas, por sua vez, realmente recepcionam, levando os pacientes novos para conhecer todos os profissionais da unidade. “Muitas pessoas estão indo ao dentista pela primeira vez”, afirma Soares. “Esse ritual simples as deixa mais à vontade.”

A preocupação com as despesas gerou controles detalhados. O estoque da unidade tem seu gestor, que o franqueado nomeia entre os funcionários que já fazem parte da equipe. O gestor monta kits com materiais como gaze, algodão e cola, que serão usados em cada atendimento. Antes da consulta, o joguinho é colocado num pote de plástico e entregue ao dentista. Ao fim da consulta, o pote tem de voltar às mãos do gestor. Ele separa os materiais não utilizados para montar novos kits e descarta o resto.

Para checar se os processos são cumpridos, a Sorridents emprega consultores de campo. O trabalho começa assim que uma clínica da rede é inaugurada. Na primeira semana de funcionamento, a gestão fica sob responsabilidade de um consultor, contratado pela franqueadora. “Demonstramos in loco como os processos devem ser seguidos em todos os detalhes”, diz a consultora Carla Moruzzi.

Depois que o franqueado ganha autonomia, o consultor passa a fazer visitas pelo menos a cada seis meses. O mesmo consultor fica de prontidão para tirar dúvidas a qualquer momento pelo WhatsApp, por Skype ou por telefone mesmo. Os consultores também acessam um sistema com indicadores de cada ponto, como evolução de faturamento e tipos de tratamento agendados.

Para que serve

O sinal amarelo acende quando um indicador de uma unidade começa a dar pane. “Muitas vezes o problema é reflexo de falhas na execução dos processos”, diz Carla. “É hora de procurar o franqueado e entender o que está acontecendo.”

Nas três clínicas do dentista Carlos Herrera, de São Paulo, o gasto com insumos estava subindo, correndo o risco de ultrapassar a faixa recomendada pela franqueadora. A consultora foi lá e logo descobriu a origem do problema. Herrera havia nomeado as secretárias para gerir o estoque.

“Quando o movimento era muito grande, elas não conseguiam buscar os potes para reorganizar os materiais não utilizados, e muita coisa ia parar no lixo”, diz Herrera. A consultora sugeriu mudar de lugar o armário do estoque — algo que havia dado certo em um caso parecido. “O estoque ficou perto do balcão das secretárias, que não se perderam mais nos processos”, diz Herrera. Desde então, o gasto com insumos caiu 25%.

CLIENTES
Roberta e Patricia Zocchio, da Experimento - Use as reclamações para melhorar o atendimento

Como funciona

Há três anos a Experimento — empresa de intercâmbio estudantil com sede em São Paulo — passou a fazer pesquisas com clientes das 33 agências da rede para saber se eles ficaram satisfeitos com o serviço. “Desde então, ler esses relatos faz parte de minha rotina”, diz a pedagoga Patricia Zocchio, de 51 anos, sócia da Experimento.

São três modelos de questionário. Quem fez uma cotação de preços, mas não comprou nada ainda, recebe perguntas sobre o atendimento. Alguns exemplos: O vendedor tirou dúvidas? Serviu cafezinho? Nos casos de clientes com pacotes comprados, o foco está nas formas de pagamento: As opções eram suficientes?

O terceiro grupo é dos recém-chegados de viagem: O ensino foi de boa qualidade? As acomodações eram semelhantes às das fotos de divulgação? Recomendaria os pacotes da Experimento aos amigos?

A cada pergunta, o entrevistado deve dar uma nota, de ruim a excelente, e pode fazer comentários. “Até agora foram 15 000 respostas”, diz a administradora Roberta Zocchio, de 49 anos, irmã e sócia de Patricia.

Para que serve

Os questionários respondidos são armazenados num banco de dados. Periodicamente, são gerados rankings das lojas que alcançaram as avaliações mais altas. Reclamações e dúvidas são encaminhadas à unidade responsável por aquele atendimento específico. “O franqueado deve procurar o cliente e dar uma solução”, diz Patricia. “Pelo sistema é possível checar se o franqueado contatou o cliente e se o caso foi resolvido.”

Os questionários foram importantes para melhorar a relação com os clientes. No início das pesquisas, a maioria das reclamações era da falta de opções de parcelamento. Na época, a rede já financiava pacotes em até dois anos. “Descobrimos que muitos vendedores não diziam isso aos clientes simplesmente por não saber calcular o valor das parcelas”, diz Patricia.

Dois anos atrás, a Experimento montou um curso online de matemática financeira básica para cerca de 150 vendedores. “Ensinamos a calcular juros”, diz Patricia. “Desde então, as reclamações do pagamento caíram 30%.” Atualmente, o curso faz parte do treinamento de quem vai trabalhar na rede.

FORNECEDORES
Jae Ho Lee, do Grupo Ornatus - Faça parcerias para comprar grandes volumes

Como funciona

Desde 2002, quando fundou a Morana, a primeira de seis redes de franquia que hoje está sob o guarda-chuva de seu grupo, o Ornatus, o empreendedor Jae Ho Lee, de 50 anos, tinha uma premissa muito clara. “A relação com os fornecedores teria de ser feita com uma boa dose de transparência e em clima de parceria — e não com aquela hostilidade típica das negociações entre grandes compradores e pequenos vendedores”, diz Lee.

Não era apenas uma questão de princípios. Com vendas aumentando a taxas anuais de 20% e 70 novas lojas sendo inauguradas por ano (já são 330), o Ornatus corre o risco de não ter o que vender se passar a esfolar seus melhores fornecedores.

Trata-se de uma gestão um tanto complexa. O Ornatus tem cerca de 1 000 fornecedores, que vendem insumos e produtos acabados para as lojas de bijuterias Morana e Balonè ou para os restaurantes Jin Jin Wok, Jin Jin Sushi, Little Tokyo e My Sandwich.

De modo geral, o sistema é igual para todos. Veja o exemplo da Morana. O fornecedor recebe uma série de informações — como a qual preço, no máximo, o produto pode ser vendido ao consumidor final, qual é a margem mínima que a Morana pode praticar e a quantidade que seria necessária para abastecer as lojas nos 12 meses seguintes. “Como as peças ainda estão na fase de encomenda, é possível discutir o que pode ser modificado na amostra de forma a baixar o custo do fornecedor”, diz Lee.

Para que serve

A parceria ajuda a desenvolver novos fornecedores. “São empresas pequenas, que não podem correr o risco de fabricar grandes quantidades no escuro”, diz Lee. Às vezes, o fornecedor não tem recursos para investir num aumento brusco da produção. Nesse caso, se a Morana tiver mesmo interesse nas peças, o dinheiro é antecipado para que o fornecedor o use para comprar insumos.

Foi o caso da Pluma, do Rio de Janeiro. Metade das 400 000 bijuterias ali produzidas por ano vai para a Morana. Desde que a parceria começou, em 2002, a produção multiplicou por 10. “Recentemente o pessoal da Morana sugeriu usar solda em alguns brincos em vez de amarrar as peças com metal”, diz Fausto Cavalari, da Pluma.“O custo coube em nosso bolso e foi possível aumentar as entregas.”

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