Thiago Holzmeister, Pedro Bittencourt e Raphael Guimarães, da Green Ant: empresa fez rodada de venture capital por meio da plataforma Eqseed (Green Ant/Divulgação)
Mariana Fonseca
Publicado em 23 de julho de 2018 às 06h00.
Última atualização em 23 de julho de 2018 às 11h59.
São Paulo - Ganhar um novo investidor já é um passo e tanto para qualquer startup - agora, imagine ter 109 novos sócios de uma vez só. É o que acaba de acontecer com a Green Ant, um empreendimento de eficiência energética que protagonizou a maior rodada de investimento coletivo online em startups já vista nas terras brasileiras.
Os “anjos” investiram em média 15 mil reais cada um por meio da plataforma Eqseed, totalizando 1,6 milhão de reais e 12,5% de participação na empresa. O dinheiro ajudará a Green Ant a faturar dois milhões de reais neste ano. E mais rodadas polpudas em startups por meio da internet vêm por aí.
Se sua startup ainda não captou investimentos, não há melhor hora para começar. E, se você é um investidor, já deve estar sentido a queda na taxa básica de juros (Selic) há algum tempo. Os brasileiros mais antenados saíram da poupança e da renda fixa para procurar investimentos mais rentáveis - como negócios inovadores.
Essa forma de investir em startups, usando a internet e diluindo o aporte com outros usuários, é conhecida como equity crowdfunding. Após fazer o cadastro em plataformas como Eqseed, Kiva (antiga Broota) e Start Me Up, o futuro investidor pode acessar todas as captações pedidas pelas startups. É possível ver apresentações e informações do negócio, da documentação jurídica a vídeos explicativos, além do valor total pedido para certos objetivos. Além dos dados disponibilizados online, o usuário também pode entrar em contato com os fundadores das startups, seja em eventos presenciais ou chamadas virtuais.
O processo de investimento é 100% online. A startup só recebe o dinheiro se a meta de captação for atingida, em modelo de “tudo ou nada”: todo o valor será retornado aos investidores caso o total de dinheiro pedido não seja concretizado.
Isso não significa que só investimentos polpudos são aceitos. O grande trunfo do equity crowdfunding é que o aporte é diluído entre vários usuários. Na Eqseed, por exemplo, o mínimo para investir é de 5 mil reais por startup - a maioria dos usuários possui de três a cinco negócios no portfólio, para reduzir riscos. Eles, após alguns anos, podem vender sua participação e realizar os lucros da aposta, que chegam a 40% na plataforma.
O equity crowdfunding ganhou uma regulamentação própria no ano passado, o que trouxe mais segurança aos investidores. Mas, vale lembrar, ainda é um movimento tímido – a poupança é o investimento preferido de sete a cada dez brasileiros.
A Eqseed já fez 15 rodadas de investimento na sua plataforma, em um valor total de 12 milhões de reais - antes da Green Ant, todas as captações estavam entre 300 e 600 mil reais, o primeiro estágio de captação para uma startup que geralmente fatura até 100 mil reais no ano, com uma equipe de três a seis pessoas.
A Green Ant é o primeiro equity crowdfunding realizado para uma empresa que não está mais pedindo esse capital “semente” (seed), e sim um estágio superior: o de venture capital. Mais especificamente, uma faixa de investimento conhecida como “vale da morte” das startups: dinheiro para empreendimentos que já conseguiram capital para dar o pontapé inicial, mas não estão prontos para conversarem com fundos de investimento.
É uma área de grande demanda para os negócios inovadores - e não surpreende que as plataformas de equity crowdfunding apostem nesse nicho para ganhar mais relevância e darem mais opções de investimento. “Os investidores mostraram interesse em rodadas maiores e as empresas possuem uma procura clara. Essas startups são maiores, com receita mínima de um milhão de reais e mais clientes. O que não muda em relação ao seed é que selecionamos só empresas com modelos escaláveis e com potencial de mais investimentos expressivos no médio e longo prazo”, afirma Greg Kelly, fundador da Eqseed.
Há outras rodadas de valores similares em andamento, como os 1,5 milhão de reais da Onyo e os 1,6 milhão de reais da Beleaf no site Kria. A Eqseed planeja cinco rodadas acima de um milhão de reais, sendo que uma delas, a da cervejaria 3cariocas, terá um pedido de captação recorde de dois milhões de reais.
O “vale da morte”, talvez, seja a última oportunidade que os investidores pessoa física tenham para aportar nas startups - daí para frente, os fundos dominam a conversa. Na Green Ant, por exemplo, o timing para a entrada de investidores pessoa física provavelmente já passou. Além do 1,6 milhão de reais, a startup já havia captado um capital semente de 700 mil reais de investidores-anjo no início de 2016.
O negócio nasceu em 2015, do doutorando e consultor para geradores de energia Raphael Guimarães e do do doutorando e consultor para distribuidoras de energia Pedro Bittencourt. Os sócios queriam deixar a medição de energia mais transparente, dando visibilidade em tempo real do quanto foi consumido.
A Green Ant focou em atender clientes empresariais grandes, que podem pagar pelos seus medidores em troca de inteligência ao comprar equipamentos e firmar contratos. Alguns clientes são galpões de logística, shopping centers do grupo Allianz e comercializadoras de energia, que vendem eletricidade no mercado livre de energia para as distribuidoras.
Hoje, a Green Ant atende 22 clientes e cada um possui diversos medidores. A mensalidade média por ponto instalado vai de 180 a 400 reais, dependendo do raio de medição e da complexidade do projeto. Em 2017, a startup teve uma receita bruta de 1,2 milhão de reais. A expectativa para 2018 é atingir uma receita de 2 milhões de reais.
Com o aumento na carteira de clientes, a tendência é desenvolver medidores mais econômicos para pequenas e médias empresas e distribuidoras, como Eletropaulo, Enel e Light, que atendem residências.
Bittencourt conta que achou o modelo de equity crowdfunding mais interessante do que um fundo de investimento por “atrair diversas pessoas qualificadas e alinhadas com o interesse de crescimento da empresa, que nos ajudem a crescer”. A maioria dos 109 investidores são da indústria de energia elétrica ou do mercado financeiro. “É como ter mais de uma centena de consultores muito motivados, porque o retorno deles está em jogo, além de possíveis aberturas de canais comerciais por meio deles.”
Na rodada de 1,6 milhão de reais por uma participação conjunta de 12,5%, o valuation da Green Ant ficou definido em 12,8 milhões de reais. O investimento será usado para alavancar as operações especialmente com as comercializadoras de energia, indo além dos atuais estados atendidos, Rio de Janeiro e São Paulo. O objetivo é chegar a 30 clientes até o fim de 2018.
Uma consequência do investimento em equity crowdfunding é ter de se tornar uma sociedade anônima em cinco anos ou ao passar um faturamento de 4,8 milhões de reais anuais. A Green Ant quer se tornar uma S.A. em 2020, alguns anos antes do previsto. Para os 109 investidores da startup, esse será o momento da verdade.