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De barbudos para barbudos

A moda da barba grande cria um novo mercado para empreendedores: produtos para cuidar dos pelos faciais

PABLO ZANELLA: seus vídeos foram vistos 100.000 vezes por consumidores ávidos num mercado que fervilha  / Germano Lüders

PABLO ZANELLA: seus vídeos foram vistos 100.000 vezes por consumidores ávidos num mercado que fervilha / Germano Lüders

GK

Gian Kojikovski

Publicado em 22 de agosto de 2016 às 18h47.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h09.

Fazer a barba diariamente está cada dia mais fora de moda. O estilo hipster, que surgiu com os jovens do bairro Williamsburg, em Nova York, no começo da década de 2.000, se espalhou. Eles “fazem parecer que não se importam com nada”, segundo definiu a revista Time. O visual inclui roupas que exaltam os anos 70 e 80, cabelos mal arrumados, camisa xadrez e, claro, a barba.

Embora sempre tenha havido barbudos ao longo da história, a moda cresceu e virou uma moda, passando a ser utilizada por astros de Hollywood a executivos bem sucedidos. O estilo tomou tamanhas proporções que passou a preocupar a P&G, fabricante da Gillette, a lâmina de barbear mais vendida do mundo. A empresa admitiu em relatórios que isso prejudica seus negócios – mas que pensa que a moda é passageira.

Enquanto isso, a venda de lâminas de barbear nos Estados Unidos está parada desde 2011, quando atingiu 2,3 bilhões de dólares, e deve continuar assim pelos próximos anos. Em 2015, a P&G teve seu pior faturamento desde 2010 – 76 bilhões de dólares, quatro bilhões a menos que 2015 – puxado pela queda de vendas da linha Gillette. Mas enquanto alguns choram, outros vendem lenços. Ou produtos para cuidados com as barbas. Se você continua restrito a espumas e barbeadores, continua na pré-história do setor. Os moderninhos têm em seus banheiros shampoo, condicionador, óleo finalizador e a cera para bigodes.

“Com o tempo, imagino que os homens barbudos vão aderir a esses cosméticos, assim como passaram a usar outros”, diz Pablo Zanella, fotógrafo por profissão e barbudo que tem um canal sobre o assunto no YouTube com mais de 100.000 visualizações.

Enquanto o mercado muda, gigantes como a P&G continuam torcendo contra os barbudos (a companhia não tem um só produto cuidados com a barba). Resultado: o mercado está fervilhando de novatos.

Uma das pioneiras na produção desses cosméticos é a americana Beardbrand. Criada depois que o designer gráfico barbudo Eric Bandholz, 34, atravessou o país – foi de Washington a Portland – para participar do Campeonato da Costa Oeste de Barbas e Bigodes, em 2012 (sim, isso existe). Logo depois do campeonato, Bandholz lançou um blog e passou a fazer vídeos para o YouTube sobre o assunto. Logo vislumbrou o tamanho que o negócio poderia tomar e investiu em fazer produtos para cuidar de barbas. Com menos de um ano, a Beardbrand faturava mais de 600.000 reais por mês. Agora, o número passa dos dois milhões. Pouco, mas é um começo.

O site da marca diz que ela foi criada com o objetivo de “acabar com os estereótipos negativos sobre barbudos serem preguiçosos ou desleixados”, mostrando que eles cuidam da barba. O discurso, também usado por outras marcas, tenta tornar o estilo, que não era bem visto em muitos campos profissionais até pouco tempo, algo descolado. É comum que as fabricantes de cosméticos lancem também outros produtos exaltando a cultura urbana em seu portfólio, como camisetas com estampas engraçadinhas e até cervejas artesanais com rótulos supercoloridos.

O padrão pré-formatado de produtos e de marketing é o mesmo que chegou ao Brasil alguns anos mais tarde. O mercado de cosméticos para a barba é de 8 bilhões de reais no país segundo a consultoria Euromonitor. É o segundo maior do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. As novas pequenas marcas hipsters só têm uma fração desse bolo, mas crescem em ritmo intenso.

Por aqui, as marcas de produtos para barba passaram a surgir em meados de 2014. Uma das primeiras é a Sobrebarba, dos cariocas Samuel Tonin e Fernanda Kawazoe, ambos publicitários. As empresas não têm fábricas próprias, num fenômeno semelhante ao que acontece no mercado de cervejas artesanais. Os produtores desenvolvem as fórmulas, ou pagam para que alguém as desenvolva, e começam a produzir em fábricas terceirizadas. “Terceirizamos a produção e o marketing, e a publicidade é cem por cento online”, diz Juliano Leal, criador da Usebarba e designer, assim como Bandholz.

A marca, criada em Curitiba, começou vendendo somente pela internet no final de 2015. Depois, passaram a revender para salões de beleza e barbearias – hoje, está presente em mais de 200 salões pelo país, a maioria em São Paulo e no Rio Grande do Sul. A Usebarba não revela o faturamento, mas Leal diz que o número cresceu cerca de 40% ao mês nos últimos meses.

A história é parecida com a O Barbudo. Criada em Palhoça, Santa Catarina, pela insistência de Jaquelina Barufe, mulher de Carlos Eduardo Barufe. Ela fazia em casa produtos para cuidar da barba dele. Com o tempo, ambos decidiram vender o food truck do qual tiravam seu sustento para investir na produção dos cosméticos. Contrataram uma empresa de produtos para beleza para ajudar a desenvolver algo mais profissional e montaram um e-commerce. Lançaram a empresa no final de 2015 e hoje vendem em mais de 150 pontos no país, além do próprio site, que responde por 16% do faturamento anual na casa de 1 milhão de reais.

O ponto de venda

Como as empresas têm produtos e modelos de negócio muito parecidos, a briga por clientes é acirrada. Embora todas tenham começado vendendo pelo comércio eletrônico, buscam agora se fortalecer nos salões e barbearias. Em comum, os pontos de venda que vendem esses produtos são aqueles onde a cerveja e os jogos que ficam espalhados pelo local são quase tão importantes quanto o corte e os preços se comparam aos dos cuidados com cabelo feminino – que usualmente são maiores e demandam mais produtos.

O preço alto, aliás, não fica só nos salões. Nos shampoos para barba, que normalmente têm entre 120ml e 140ml, gira em torno dos 35 reais. Nos óleos, com 30ml, em torno de 50 reais. “Os produtos que mais vendem são os kits, com shampoo, condicionador, óleo e cera”, diz Leal. Dependendo da marca, a receita vinda das vendas na internet, dos salões e farmácias varia, mas a maioria delas ganha mais dinheiro com os pontos físicos.

Os criadores das marcas – todos barbudos – costumam dizer que a ideia surgiu do fato de não encontrarem produtos para cuidar da própria barba. Grandes companhias ainda não abriram os olhos para isso. A P&G, por exemplo, não tem em sua linha produtos para a barba, assim como a Unilever. Ambas focam em cosméticos para o ato de barbear, como espumas e loções pós-barba.

Esse pode ser mais um indicativo que existe mercado para as pequenas empresas. A Usebarba, por exemplo, não revelou nomes, mas disse que faz contatos para possíveis negócios com companhias maiores, consolidadas em outras áreas de cosméticos. Além disso, é comum que as empresas planejem expandir a própria linha. “Começamos só com shampoo e óleo para barba. Adicionamos hidratante e pomada e queremos ter 15 produtos na nossa linha em breve”, diz Carlos, da O Barbudo. A dúvida é o que acontece se a P&G entrar no jogo disposta a fazer barba, cabelo e bigode.

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