Karine Oliveira, presidente da Wakanda Educação Empreendedora: jovem de 27 anos é formada em serviço social e técnica em viabilidade econômica (Na prática/Reprodução)
Carolina Ingizza
Publicado em 7 de fevereiro de 2021 às 08h00.
“Como é que você poderia criar uma metodologia de negócio se não tem MBA?” ou “Como sua empresa vai crescer estando em Salvador (BA)?”. Foi o que a empreendedora baiana Karine Oliveira, de 27 anos, presidente da Wakanda Educação Empreendedora, chegou a escutar das pessoas. Enxergar suas próprias potências, “ver essa divindade que existe em nós”, como ela mesma explicou, é o que a impulsionou a seguir seus objetivos.
Formanda em Serviço Social e técnica em viabilidade econômica, Karine tem 10 anos de experiência com empreendedorismo de impacto social. E foi em 2018, ano de estreia do filme “Pantera Negra” (de Ryan Coogler), que surgiu a empresa. Wakanda, no longa, é a nação da tecnologia e símbolo da representatividade. Inspirada e motivada, a jovem construiu ainda na faculdade uma metodologia para potencializar negócios locais, mostrando que pode existir uma Wakanda em cada periferia do Brasil.
“Eu estava tão empolgada com esse mundo do empreendedorismo, o filme ‘Pantera Negra’, que escrevi pela primeira vez a minha metodologia para auxiliar empreendedores e empreendedoras por necessidade, com três imersões de 8h, voltadas à gestão financeira, planejamento estratégico e vendas”, disse ela em entrevista ao Na Prática.
De lá para cá, o projeto já impactou mais 600 empreendimentos periféricos, sobretudo iniciativas direcionadas às mulheres negras e comunidade LGBTQIA+. Entre algumas das ações realizadas, estão o “Pitch de Buzu”, competição para valorizar os trabalhadores que ganham a vida vendendo produtos nos transportes públicos de Salvador, e o “Deusas do Empreendedorismo”, que enaltece os negócios feitos por mulheres através da metodologia desenvolvida pela empresa.
O que diferencia a Wakanda Educação Empreendedora é justamente a aproximação, ao falar de empreendedorismo com uma linguagem informal e regional. Esse mundo de palavras em inglês que giram em torno do que é empreender sempre incomodou Karine.
“Fora as referências de empresas multinacionais, ao invés da gente validar as empresas daqui. Entrando nesse universo, pegando essa experiência de impacto social, conhecendo empreendimentos incríveis, foi que eu comecei a perceber o quanto a gente aqui no Brasil tem uma grandiosidade de iniciativas e por que não construir uma ponte entre esse empreendedorismo da rua, do corre, e o mundo dos negócios tradicionais como a gente conhece?”, pensou.
Segundo a empresária, não é que há uma linguagem boa e outra ruim, mas evidenciar a existência de outras maneiras de falar sobre empreendedorismo. “Queremos mostrar para as pessoas que esse método Wakanda, esse jeito de utilizar a linguagem informal como transformação, como uma tecnologia para traduzir os conteúdos do meio de negócio, é possível. Esperamos chegar a outros estados em 2021, fixar essa referência em educação empreendedora focada em empreendimentos periféricos”, projetou a presidente.
A jornada empreendedora de Karine, inclusive, começou em casa, quando via a sua mãe sair para trabalhar fora. “Minha mãe começou a fazer esses corres de estar na rua, de fazer esses trâmites, e foi vendo ela empreender e fazer essa atividades que eu também me inspirei. Lembrando que minha mãe nunca se identificou como empreendedora, assim como várias outras mulheres negras, porque essa figura do empreendedor está muito distante”.
Historicamente a população negra empreende há um bom tempo. “Por conta de questões estruturais e por conta da falta de empregos disponibilizados para a população negra, a gente sempre buscou através dessas atividade uma forma de sustentar nossas famílias e nossa comunidade, como foram as baianas de acarajé, as negras ganhadeiras [mulheres negras livres que lutavam para garantir o seu sustento e o de seus filhos, trabalhando com a prestação de diversos serviços na cidade, nos séculos 18 e 19], dentre tantas outras pessoas”, explicou.
“Por isso que o mais legal é quando a gente ressignifica o empreendedorismo e mostra que existem outros olhares. Por exemplo, a figura do empreendedor fica muito ligada ao “Lobo de Wall Street” [Jordan Belfort, que trabalhou por muitos anos no mercado financeiro em Nova York e que teve a vida retratada no livro e no filme ‘O Lobo de Wall Street’], mas quando você lembra que as mulheres negras ganhadeiras em 1800 já faziam essas atividades e também atividades ancestrais, ressignificar o empreendedorismo é importante, traz a grandiosidade da população negra e ressalta o que a gente já faz.”
Um dos grandes reconhecimentos que Karine teve de seu trabalho foi estar entre os nomes da Forbes Under 30 2020 – que destaca os jovens brasileiros mais influentes, empreendedores e inovadores do ano, na categoria “Ciência e Educação”.
“Eu ainda estou nas nuvens com essa lista. Eu sonhava muito estar na Forbes e nunca achei que pudesse conseguir. Está sendo extremamente importante para a minha família e para mim, principalmente em um ano como foi 2020. Nenhuma conquista é sozinha, foram vários empreendimentos e mulheres que acreditaram e abriram caminhos para que isso acontecesse. É um reconhecimento de todo um trabalho coletivo”, comemorou ela.
“É também uma validação que outras pessoas precisavam para poder entender que a linguagem informal, regional, as gírias, são ferramentas importantes. É o que chamamos de nosso vibranium“, disse ela, fazendo referência ao metal poderoso da fictícia Wakanda. E finaliza: “que isso não somente inspire outras Karines, mas que a galera entenda que o seu tipo de linguagem está tudo bem, a sua história está tudo bem, que são essas especificidades que fazem toda a diferença para as nossas conquistas”.
Esse conteúdo foi originalmente publicado no Na Prática, portal da Fundação Estudar