Justiça: se o juiz entender que fere a Constituição, a regra pode não ser aplicada (Foto/Thinkstock)
Mariana Fonseca
Publicado em 26 de janeiro de 2017 às 11h00.
Última atualização em 26 de janeiro de 2017 às 16h36.
A morosidade da Justiça e burocracia regulatória fazem da indústria de advocacia uma das mais lucrativas do Brasil. Já existem no país 1 milhão de advogados, 109 milhões de processos tramitando na Justiça e as empresas gastam, em média, 1,7% de seu faturamento em litígios.
Nesse ecossistema, porém, estão surgindo empresas que prometem trazer mais eficiência e rapidez ao sistema jurídico, como é o caso da Finch Soluções, JusBrasil, Justto e Looplex. Ao agregar tecnologia a procedimentos jurídicos, as lawtechs ou legaltechs, como são chamados no exterior, estão ganhando atenção de escritórios e empresas e já estão ganhando dinheiro com isso.
Segundo estudo da Thomson Reuters feito com exclusividade para EXAME, 40% dos escritórios entrevistados estão em busca de alguma solução de automatização de processos.
E engana-se quem acha que seus produtos não passam de softwares de gestão de prazos e ações – há companhias com sistemas avançados de análise de dados, indicação de tendências a partir de jurisprudência, cálculo de probabilidades de ganho/perda, desenvolvimento de peças em poucos minutos e até quem tente intermediar conciliações e evitar que mais impasses cheguem à Justiça.
Conheça algumas delas:
A empresa nasceu da necessidade de um dos maiores escritórios de advocacia do país, o JBM & Mandaliti, de agilizar e baratear os processos de contencioso de massa. A empresa se tornou independente em 2013 e hoje conta com 620 funcionários.
Em 2015 foi a primeira a fechar uma parceria com a empresa de tecnologia IBM para aplicar a tecnologia de computação cognitiva Watson a seus softwares.
Oferece programas de gestão jurídica, com análise de dados, pesquisa avançada de jurisprudência e acompanhamento de processos e automação de agendamentos que reduzem de meses para segundos o tempo de alguns processos.
Ao aumentar a produtividade dos advogados, diminui custos com folha de pagamento de escritórios e departamentos jurídicos. Em 2016 a empresa espera crescer 15% e faturar 52 milhões de reais.
Em seu portal a empresa baiana oferece dois principais serviços: pesquisa gratuita de processos jurídicos públicos e intermediação para a contratação de advogados. Os mais de 20 milhões de visitantes por mês e o imenso banco de dados chamaram a atenção de investidores.
Em 2013, o brasileiro Monashees fez um primeiro aporte e, em 2016, foi a vez do Founders Fund, fundo do Vale do Silício que já aportou dinheiro no Nubank, Facebook, Spotify e SpaceX também investir no negócio. O valor de aportes supera 10 milhões de reais, segundo fontes do mercado.
“Estamos desenvolvendo serviço semelhante a um Airbnb jurídico e isso chamou a atenção dos investidores”, diz Luiz Paulo Pinho, um dos fundadores da startup.
Fundada em 2008 por quatro amigos, além da pesquisa, que é gratuita, a plataforma oferece serviços pagos, como o de alerta que envia notificações sobre processos a partir de palavras-chave, CPF ou CNPJ, busca por citações em peças jurídicas similares e é também possível contratar um advogado. A empresa não divulga o faturamento.
Desenvolvida por advogados, a empresa oferece modelos inteligentes e customizáveis de documentos jurídicos (contratos, petições, escrituras e propostas), com assinatura digital e tradução para outras línguas além do português.
O tempo de elaboração de uma contestação de um caso bancário, por exemplo, cai de 3 horas de trabalho de um advogado para menos de 20 minutos. No caso de uma escritura de debênture, documento mais complexo, o tempo de elaboração cai de 20 horas para menos de 30 minutos.
“Nosso produto é anticíclico, porque aumenta eficiência com diminuição de custos. Estamos bastante otimistas quanto a 2017”, diz Rafael Salomão, sócio-fundador.
A empresa, criada em novembro do ano passado, e quer fechar este ano com 200 clientes e 100 mil documentos gerados pelo sistema.
A plataforma oferece pela internet serviços de arbitragem e conciliação extrajudicial. Fundada em 2011, a startup passou pelo processo de mentoria da aceleradora ACE e acaba de receber um aporte de 1 milhão de reais de investidores pessoa física e jurídica.
Tem sob seu guarda-chuva a Arbitranet, uma espécie de câmara de arbitragem online que já intermediou 2 milhões de reais em sentenças arbitrais, e o Acordo Fácil, sistema online de negociação de acordos entre empresas e consumidores que já resolveu 5 000 impasses fora da Justiça.
Com a negociação de acordos consumidor com empresas, por exemplo, conseguiu reduzir em 46% os gastos com processos e baixar em 30% o valor médio pago nas condenações. A expectativa é faturar 1 milhão de reais em 2017.
A empresa resolve um gargalo comum para quem trabalha com eventos: fazer milhares de contratos para contratação temporária de fornecedores em shows e jogos esportivos.
O software gera automaticamente e de forma inteligente esses documentos padrões e, com isso, reduz em quatro vezes o tempo de criação e, portanto, diminui custos para as empresas. Também ajuda a diminuir erros e fraudes.
A Netlex já tem como clientes a Confederação Brasileira de Vôlei, a Emae, braço de geração de energia da concessionária Eletropaulo, a empresa de transporte Localiza e a empreitera Mendes Júnior.
Pela plataforma é possível tirar dúvidas de diversas naturezas: jurídicas, contábeis, empresariais, forenses, financeiras e societárias.
Voltado para pessoas físicas e pequenas empresas que demandam informações simples, que não precisam necessariamente serem resolvidas na justiça. Há pacotes de 49,99 a 439,99 por mês que dão direito a respostas de dúvidas e acesso a documentos modelo.
A empresa de comunicação e informações financeiras Thomson Reuters lançou em 2016 a Legal One, uma plataforma de gestão jurídica que reúne processos, conteúdo legal, financeiro, contratos, clientes e contatos. Integrado entre departamentos jurídicos e seus escritórios contratados pode aumentar significativamente a eficiência da área.
Os precursores das lawtechs são americanos e têm entre seus expoentes o Ross, o advogado inteligente criado a partir da tecnologia de inteligência artificial Watson, da IBM.
O Ross pesquisa, em segundos, milhões de documentos regulatórios, processos na Justiça, notícias e legislação. Além de respostas completas, ainda sugere ações e alerta sobre decisões que podem impactar o caso – já foi ‘contratado’ por alguns escritórios americanos.
Já o Luminance é um robô treinado para auxiliar em processos de fusão e aquisição de negócios. O programa lê rapidamente centenas de páginas de documentos detalhados e complexos e identifica os pontos principais. Criado na Universidade de Cambridge, no Reino Unido, recebeu aporte de 3 milhões de dólares no fim de 2016.
Na mesma linha, o assistente virtual Kim atualiza novas legislações e mostra, em tempo real, todos os casos em andamento no escritório, seu status, o risco de perda, quem está cuidado do processo e disponibiliza métricas de produtividade por pessoa e assunto. Desenvolvido pela empresa de soluções jurídicas River View em parceria com a Universidade de Liverpool, na Grã-Bretanha.
Alguns escritórios também estão correndo para se atualizar, como o Siqueira Castro. Uma equipe interna ficou encarregada de pensar novas formas de usar o digital para agilizar as atividades manuais e burocráticas. O escritório está terminando de desenvolver um aplicativo próprio para gerenciar suas atividades.
O Braga, Nascimento & Zilio decidiu apostar no advento da tecnologia de um jeito diferente: criou um novo modelo de negócios para oferecer a startups.
A nova divisão de negócio, que já tem cinco pessoas exclusivas e venderá pacotes pré-pagos de serviços, onde o cliente poderá usar o crédito como preferir. Os principais serviços demandados pelas startups são das áreas de societário, análise de contratos (fornecedores e parcerias), trabalhistas, fusões e aquisições, tributário (importação de produtos, por exemplo) e compliance.
Segundo Arthur Braga Nascimento, coordenador do projeto, essas empresas em fase inicial não têm grandes demandas e nem dinheiro pagar aos 1000 reais pela hora do advogado , como grandes escritórios cobram.