PME

A expansão do mercado de casamentos

Oportunidades no mercado brasileiro de serviços para casamentos, que vai movimentar quase 15 bilhões de reais em 2012 - e as histórias de quem já está ganhando com isso

Renato Aguiar, dono da Renato Aguiar Casamentos (Daniela Toviansky)

Renato Aguiar, dono da Renato Aguiar Casamentos (Daniela Toviansky)

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Da Redação

Publicado em 23 de julho de 2012 às 06h00.

São Paulo - Organizar um casamento nos dias de hoje pode ser quase tão complicado quanto encontrar a pessoa ideal. De acordo com a Abrafesta, entidade que reúne as empresas de serviços para eventos, 85% dos noivos acham muito complicado organizar a cerimônia e a comemoração. É difícil encontrar um bom lugar para a festa.

É difícil achar bufês de qualidade. É difícil encontrar decoradores que caibam no orçamento. E, acima de tudo, é difícil ter tempo para cuidar de tantos detalhes. "A carência de bons fornecedores de casamentos é uma oportunidade para as pequenas e médias empresas", diz Vera Simão, presidente da Abrafesta.  

O número de casamentos está aumentando no Brasil - foi 1 milhão no ano passado, 30% mais do que em 2003. O mercado de serviços para as cerimônias e festas também cresceu. Neste ano deverão ser movimentados 14,8 bilhões de reais - o dobro de dez anos atrás. Há motivos para acreditar que a corrida para o altar não terminará tão já. Eis alguns:

•  De acordo com o IBGE, há 34 milhões de solteiros no Brasil entre 20 e 40 anos. Eles nasceram nas décadas de 70 e 80 e formam a maior geração de todos os tempos. Cerca de 40% deles - 14 milhões de pessoas - querem casar nos próximos dois anos. Se apenas a metade concretizar o desejo, o resultado será algo em torno de 70 milhões de reais movimentados, em média, por dia. 

•  Quanto mais alto o poder aquisitivo de uma camada da população, maior é a proporção de casamentos. Por enquanto, na classe C há 40%  de pessoas casadas. Na classe E, apenas um terço. "Como a renda está crescendo, o potencial é enorme", afirma José Luiz de Carvalho César, organizador da Expo Noivas & Festas, uma das maiores feiras desse setor.

•  Crédito mais fácil e menos desemprego facilitaram a compra do primeiro imóvel. Na construtora Tecnisa, os jovens casais compram 45% dos lançamentos — cinco anos atrás eram 20%.  "Eles estão mais confiantes de que poderão pagar as prestações e montar a nova casa", diz Romeo Busarello, diretor de marketing da Tecnisa. 


Segundo a Abrafesta, neste ano serão gastos, em média, 14.400 reais por casamento - 20% acima de 2009. Só na Expo Noivas & Festas foram fechados no ano passado 300 milhões de reais em negócios - 10% mais que 2010. Nas próximas páginas, Exame PME mostra como seis pequenas e médias empresas estão crescendo nesse mercado. 

Vinicius Credidio

A ideia partiu dos noivos. Eles queriam passar,  ainda no baile, um vídeo com os melhores momentos da cerimônia que acabara de acontecer. O cinegrafista contratado - Vinicius Credidio, de 39 anos - levou um computador para a festa.

Ali mesmo ele editou 5 minutos entre todo o material de gravação contido nas quatro câmeras que levou ao evento e transmitiu as imagens num telão. "Os convidados ficaram surpresos com a cobertura quase em tempo real", diz ele. 

Desde então, Credidio incluiu uma versão adicional desse tipo em todos os casamentos que sua equipe cobre. Depois, ele a posta no site de sua empresa, a Vinicius Credidio Films. "Os noivos podem baixar o filme no computador e postá-lo em blogs e no Facebook", diz. Desde 2006, quando Credidio incluiu o serviço, os casamentos registrados pela empresa aumentaram 60%. 

A maioria dos novos clientes conheceu o trabalho da empresa por causa dos vídeos na internet. Alguns foram vistos mais de 7.000 vezes no YouTube. "Recebi convites para filmar cerimônias até em Nova York", diz Credidio. O faturamento anual está em 2,5 milhões de reais e tem crescido 10% ao ano. 

Para dar conta dos pedidos, no início Credidio chamava cinegrafistas free lancers, mas a experiência não deu certo. "Cada um tinha suas preferências estéticas e, às vezes, não dava para padronizar a linguagem em todos os filmes", diz. Credidio passou, então, a contratar estudantes de cinema e TV e a treiná- los para que o resultado ficasse do seu jeito.

"Explico, por exemplo, que cada cena não pode durar mais do que 4 segundos", diz ele. Hoje, a empresa tem nove cinegrafistas contratados. "De segunda a sexta, eles editam as imagens feitas nos fins de semana, quando acontecem os casamentos", diz.

O compartilhamento de filmes como os que Credidio faz tem crescido muito. De 2006 para cá, os vídeos passaram de 9% para mais de 40% dos dados que viajam pela internet no mundo, segundo a empresa americana de roteadores Cisco.

A maioria está em sites de produções caseiras, como o YouTube. "As pessoas adoram dividir seus momentos na internet", diz Gustavo Caetano, fundador da gerenciadora de vídeos Samba Tech. "Os negócios que investem nesse comportamento são muito promissores."

Sandra Pessini e Elodie Pérignon

A francesa Elodie Pérignon, de 36 anos, havia acabado de se mudar para o Brasil, em março de 2008, quando foi convidada para o casamento de amigos. Ao perguntar onde poderia comprar o presente, Elodie achou estranho haver seis listas em seis lojas diferentes - uma para artigos domésticos, outra para eletrodomésticos, outra para roupas de cama e banho.


"Na França, os noivos fazem uma lista só e a deixam numa loja de departamentos", diz ela. "A relação costuma conter apenas itens decorativos e viagens, pois os casais, na maioria, já moram juntos." 

Logo Elodie soube que, no Brasil, o normal é os noivos morarem separados antes da cerimônia e usarem os presentes do casamento para montar a casa. "Além disso, aqui há poucas lojas com um catálogo abrangente, o que resulta em várias listas”, diz ela. “Achei que organizar esses produtos em um lugar só poderia ser um negócio promissor."

Elodie convidou sua colega de trabalho  Sandra Zlotagora Pessini, de 41 anos, para criar, em 2008, o Lista Perfeita. A empresa das duas sócias é basicamente um site que reúne 7.000 itens de 45 lojas.

No site, os noivos montam uma lista de presentes e ganham uma página em que seus convidados podem comprá-los. A cada transação, o Lista Perfeita avisa os noivos, que têm a opção de aceitar o produto ou trocar o crédito por outro item. "No final, repassamos todos os pedidos às nossas lojas parceiras", diz Sandra. As receitas vêm da comissão sobre as vendas. 

Para divulgar o Lista Perfeita, as sócias fizeram acordos com dezenas de blogueiras que escrevem sobre casamento - em geral, moças com interesse em moda que dão sugestões sobre roupas e decoração com base em exemplos de outros países. De acordo com dados da Abrafesta, esses blogs são fonte de informação para 85% das noivas brasileiras.

As parceiras de Elodie e Sandra colocam, em seus blogs, links para o site do Lista Perfeita. Em troca, o Lista Perfeita coloca links para os blogs. "Dessa forma, todo mundo sai ganhando", afirma Sandra. As sócias calculam que, neste ano, a empresa vá faturar 5 milhões de reais, cinco vezes mais do que no ano passado.

Alice Cabral

Numa viagem à China, Alice Cabral, de 62 anos, sócia da Black Tie, rede paulistana de trajes para festas, viu um vestido de noiva ser produzido em 28 minutos - desde o molde até a roupa receber o preço de venda, de 200 dólares. "No Brasil levaríamos um mês e gastaríamos quatro vezes mais para fazer uma peça semelhante", afirma Alice. 


Alguns anos depois, em 2006, Alice encerrou a fabricação própria e passou a importar todos os vestidos de fabricantes dos Estados Unidos, da Espanha e da Itália. Desde então, a receita da Black Tie cresceu 50% e chegou a 13,3 milhões de reais em 2011. Com as importações, os preços da Black Tie caíram drasticamente. Um vestido que antes era vendido por 5.000 reais, por exemplo, hoje custa 2 500 reais. 

Os preços mais em conta ajudaram a atrair pessoas de classes mais populares às lojas da Black Tie e também ajudaram Alice a expandir o negócio para outros estados. Hoje, além de vender para o consumidor final em São Paulo, a Black Tie fornece vestidos para lojas de Goiás, Rio Grande do Sul, Paraná e Minas Gerais, além do Distrito Federal. O novo negócio começou no ano passado e deve representar 30% do faturamento em 2012.  

O grande problema de Alice atualmente é a burocracia na importação. A Receita Federal, por exemplo, exige o preenchimento de guias com informações detalhadas para cada roupa trazida de fora - o material usado, o tipo de corte, a modelagem e o endereço do fabricante.

Segundo Alice, todo o processo de importação  - a encomenda, a fabricação, o transporte até o Brasil e a liberação alfandegária - acaba levando cerca de quatro meses. "Se houver imprevistos, pode ser até mais", diz ela. "Para evitar o inconveniente de um traje não chegar a tempo para a cerimônia, só aceitamos encomendas com seis meses de antecedência do casamento."

Jacqueline Dallal Mikahil

Visitando os estandes de uma feira para noivas, há seis anos, a agente de viagens Jacqueline Dallal Mikahil, de 48 anos, teve uma ideia que faria deslanchar seu negócio, a agência de viagens Be Happy. "Lá havia fornecedores de todo tipo de serviço para noivos, menos uma agência de viagens especializada em lua­ de mel", diz Jacqueline, que na época montava roteiros turísticos para públicos variados, como famílias e executivos. 

Jacqueline se preparou bastante para entrar nesse mercado. O primeiro passo foi pesquisar, entre os hotéis que já vendia, quais tinham condições especiais para casais. O levantamento durou um ano e resultou em uma revista que Jacqueline entregou aos visitantes de um evento para noivas.


"A publicação fez sucesso porque trazia 25 sugestões de roteiros de lua de mel, como o Nordeste e o Caribe", diz. Novas edições da revista foram distribuídas em outros eventos nos anos seguintes. Hoje, as viagens de lua de mel representam 70% do faturamento da empresa, que atingiu 4,5 milhões no ano passado - quatro vezes mais do que em 2007.

Os casamentos mudaram o relacionamento da Be Happy com hotéis e companhias aéreas. Antes, eles forneciam as cotações de preço para um prazo de seis meses. "Eu não conseguia atender os noivos, que programam a lua de mel com bastante antecedência", diz.

Para resolver o problema, Jacqueline visitou os hotéis prediletos dos casais e explicou a necessidade de seus novos clientes. "Agora recebo uma previsão de preços válida para um ano", diz. 

Formada em psicologia, Jacqueline entrevista os clientes, explica os atrativos turísticos de cada destino e tenta ajudar na decisão do casal antes de fechar o pacote. "Os noivos precisam de atenção para controlar a ansiedade e não discutir um com o outro ao organizar a lua de mel", diz ela.

Renato Aguiar

A mãe da noiva estava furiosa. "Não foi isso que eu pedi!", ralhou com a decoradora. Os vasos de tulipa encomendados deveriam estar no centro das mesas -  e não na entrada do salão. O jantar seria servido dali 2 horas e não havia tempo para mais nada. "Os pais da noiva ficaram frustrados", diz o chef Renato Aguiar, de 47 anos, dono da Renato Aguiar, empresa da cidade paulista de Ribeirão Preto, responsável pela refeição.

Não era a primeira vez que ele assistia a uma cena dessas. "Muitas empresas novatas estavam entrando no mercado de casamentos", diz Aguiar. "Havia uma oportunidade para expandir a empresa se, além dos comes e bebes, fornecêssemos o serviço completo."

Aguiar passou a vender de tudo. Além  dos salgadinhos e das bebidas, a empresa faz o projeto de decoração e aluga até a mobília. A Renato Aguiar está aparelhada para eventos de 1 000 convidados. Seu acervo tem 100 sofás, 2.000 toalhas, 4.000 cadeiras e 30.000 itens, como pratos, talheres e copos. "Compramos 150 000 flores por mês", diz Aguiar. "Dá para 20 igrejas."


Boa parte da rentabilidade da empresa vem dessa alta escala. Aguiar diz que cada flor, adquirida na cidade de Holambra, um polo de fornecedores de flores do estado de São Paulo, lhe custa 60 centavos - os concorrentes compram as mesmas espécies por 3 reais.

Com um modelo de negócios muito semelhante ao de um atacadista, Aguiar pode oferecer preços mais competitivos. "Nossas festas custam, em média, 200 reais por convidado, incluindo decoração e bufê", diz ele. "Meus concorrentes cobram por volta de 30% mais."  

A diversificação dobrou as receitas em três anos. Dos 4 milhões de reais obtidos em 2011,  cerca de 30% vieram dos novos serviços. "Devido à nossa estrutura, não vale mais a pena atender pequenos eventos", diz Aguiar. "Só fazemos festas de casamento a partir de 100 convidados." Um deles foi o da apresentadora Luciana Gimenez com o empresário Marcelo de Carvalho, em 2006, em Ilhabela. "Havia até um deque para receber convidados que vinham de barco", diz Aguiar.   

Edda Bauder, Gizella Luglio e Elisa Bueno

As sócias Edda Bauder, de 32 anos, Elisa Bueno e Gizella Luglio, ambas de 34 anos, donas da Boutique de Três, de São Paulo, têm um dever incomum - ajudar noivos a gastar mais de 300.000 reais numa festa de casamento. Elas assumem o trabalho de procurar e escolher empresas de bufê, flores, filmagem e outros fornecedores e acompanhar a execução dos serviços contratados.

"Nossa missão  é não deixar que o casal se estresse com os muitos detalhes de organizar a cerimônia e a festa nesse momento tão importante para eles", diz Edda. O negócio está prosperando - neste ano, a previsão é faturar 1,6 milhão de reais, 30% mais que 2011. 

A Boutique de Três coordena todo o trabalho dos fornecedores e acompanha as cerimônias e as festas para assegurar que tudo saia conforme o combinado. Para o casamento da filha de um usineiro paulista, em Trancoso, na Bahia, por exemplo, as sócias contrataram 33 empresas, todas de São Paulo. "Levamos até as faxineiras dos banheiros", diz Elisa. 

Pela assessoria, a Boutique de Três cobra cerca de 30.000 reais - o dobro da média nacional de despesas totais de um casamento. A demanda por serviços assim tem crescido por duas razões. A primeira: a proporção de casados é mais alta quanto maior for o poder aquisitivo dos noivos.

Segundo o IBGE, nas famílias com renda superior a 14.000 reais, metade das pessoas são casadas - ante 35% nas famílias com renda até 960 reais. A segunda: os consumidores de alta renda vêm aumentando rapidamente. Segundo a Anbima, associação que representa bancos e corretoras que atuam no mercado de capitais, a cada dia oito pessoas se juntam ao grupo de brasileiros com mais de 1 milhão de reais em aplicações, "Eles querem comodidade", diz Débora Gambaroni, da consultoria MCF, especializada no mercado de luxo.

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