Álcool em gel: produto se esgotou em boa parte das farmácias físicas, enquanto demanda no online também subiu mais de 4.000% no ano passado (iStock/Getty Images)
Carolina Riveira
Publicado em 3 de abril de 2020 às 18h31.
Última atualização em 6 de maio de 2020 às 16h03.
Comprar álcool, detergente e ração pela internet? Com as pessoas menos propensas a saírem de casa, a internet virou local para comprar itens de primeira necessidade, hábito até então pouco cultivado pelos brasileiros.
Levantamento da empresa de inteligência de e-commerce Compre&Confie analisou as vendas na internet brasileira entre 24 de fevereiro e 29 de março. O resultado deste mês intenso foi que algumas categorias chegaram a vender 50 vezes mais do que no mesmo período de 2019.
Dos produtos que mais tiveram alta nas vendas online, os campeões são gel antisséptico e material de limpeza, cujo volume de pedidos subiu 4.261% e 2.520%. Logo atrás vêm lente de contato/acessórios e termômetros. Os itens de farmácia como um todo veem seu pico de popularidade, como sabonetes, soro fisiológico e itens de higiene íntima (veja no gráfico abaixo as categorias que mais cresceram).
Nas categorias como um todo, a tendência se repete: o faturamento de pedidos no segmento de saúde mais que dobrou, crescendo 110%, enquanto o número de pedidos em si cresceu 67%. Ou seja, as pessoas pediram mais vezes e, sobretudo, gastaram mais em cada pedido.
"São categorias que até então eram pouco representativas no comércio eletrônico e estão crescendo muito com esta mudança de comportamento devido ao coronavírus", diz André Dias, diretor da Compre&Confie.
O segmento de Pet Shop, por exemplo, cujo volume de pedidos subiu 54% no período analisado, representa somente 1,6% dos pedidos totais no e-commerce. Em 2019 inteiro, foram menos de 3 milhões de pedidos neste segmento -- telefonia e eletrodomésticos tiveram juntos 25 milhões de pedidos. Já Alimentos e Bebidas também representaram em 2019 1,6% dos pedidos do e-commerce.
A campeã em crescimento, inclusive, é a categoria de instrumentos musicais, o que foi uma surpresa, diz Dias. "É uma categoria super pequena em vendas na internet e cresceu em número de pedidos tanto quanto saúde." A teoria é que, com pessoas mais confinadas em casa, cresce a busca por cursos e novos hobbies. Dias afirma ainda que também deve seguir aumentando o volume de pedidos em categorias como itens esportivos e suplementos.
A única exceção à lista dos novatos no e-commerce é a categoria de Beleza e Perfumaria, que mesmo antes do coronavírus já era a terceira mais pedida na internet, com 12,5% das vendas. Agora, segue demandada como nunca: no período analisado no levantamento, o segmento cresceu mais de 50% em meio à busca por sabonete, shampoo, desodorante sem álcool e outros itens básicos.
O levantamento registra um período em que o Brasil foi de nenhum caso de coronavírus a fechamento de cidades. Do primeiro caso de coronavírus registrado, em fevereiro, até o fim de março, o país chegou a mais de 4.000 casos. Mais da metade (57%) da população brasileira já está em quarentena, como mostrou levantamento da startup In Loco. Quase todos os shopping centers brasileiros também precisaram fechar as portas.
Apesar de boa parte do varejo não estar mais conseguindo operar fisicamente, as categorias que mais vêm tendo alta no e-commerce são as de estabelecimentos que continuam abertos, por configurarem serviços essenciais, como supermercados e farmácias.
A alta na procura por serviços como compras de supermercado fez o prazo de entrega de redes supermercadistas chegar a mais de 15 dias em São Paulo, como mostrou reportagem da EXAME. Os dados da Compre&Confie corroboram essa tendência, e mostram que o brasileiro está mais relutante em sair de casa, mesmo que para atividades essenciais.
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Apesar das altas em segmentos específicos, o comércio eletrônico como um todo não teve somente ganhos em meio à quarentena. Muitas categorias tradicionais na internet vêm perdendo espaço nas últimas semanas.
É o caso de eletrônicos, cujo volume de pedidos caiu 17% e o faturamento, 27%. Câmeras e drones também caíram quase 50% em número de pedidos e mais ainda em faturamento. Até mesmo os games tiveram queda de 35% em pedidos, ainda que a expectativa fosse que as pessoas jogassem mais ficando em casa.
A leitura é que o consumidor vem preferindo empregar o dinheiro em itens de necessidades básicas. O potencial de desaceleração da economia e desemprego não estimula o brasileiro a gastar neste momento, diz Dias. O e-commerce só não está enfrentando queda no faturamento desde já justamente pela alta exponencial das categorias essenciais.
Para março, a projeção do e-commerce era uma alta de 32% em volume de pedidos. No fim, o crescimento foi de 36%, não muito além do esperado. Em faturamento, a performance ficou inclusive um pouco aquém da projeção, com alta de 29% ante previsão de 32%.
No total, a projeção da Compre&Confie para o crescimento do e-commerce em 2020, feita antes do coronavírus, era de alta na casa dos 20%, assim como foi no ano passado. Dias diz que ainda é quase impossível prever se haverá alguma alteração nesses números em virtude da pandemia.
"Se a crise econômica diminuir a renda da população e o consumo ficar afetado, o e-commerce sofrerá também", diz o diretor da Compre&Confie. "Tudo vai depender dos efeitos econômicos, da duração da quarentena, dos empregos". O e-commerce, assim, não está isolado dos desafios que toda a economia terá de viver em 2020.
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