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Tutinha, da Jovem Pan, quer fazer do rádio a sua TV

Empresário lança canal de TV a cabo 24 horas e passa a concorrer diretamente com CNN, Globonews, Record News e Band News

Tutinha, da Jovem Pan: “Fomos os primeiros a trazer para o jornalismo a opinião” (Omar Paixão/Exame)

Tutinha, da Jovem Pan: “Fomos os primeiros a trazer para o jornalismo a opinião” (Omar Paixão/Exame)

RC

Rodrigo Caetano

Publicado em 30 de setembro de 2021 às 06h00.

Última atualização em 30 de setembro de 2021 às 14h58.

Antônio Augusto Amaral de Carvalho Filho, o Tutinha, dono da rede Jovem Pan de rádio, cresceu dentro de uma emissora de TV. Seu avô, Paulo Machado de Carvalho, fundou a TV Record, nos anos 50, comprada pelo bispo Edir Macedo em 1989. “Eu não sei como meu avô conseguiu perder uma TV”, afirma Tutinha, que recebeu a EXAME nos estúdios da rádio, na Av. Paulista, em São Paulo. Com as mãos unidas, como em uma prece, ele ressalta: “É impossível.”

Tutinha terá a chance de refazer os passos do avô – ao menos na área de comunicação. No final de outubro, ele lançará o seu próprio canal de TV, que será transmitido pelas operadoras de cabo e satélite (Vivo, Claro e Sky). Não será a primeira incursão da Jovem Pan no vídeo. A rádio já é uma das maiores audiências do YouTube, por exemplo, com as transmissões de seus programas mais populares, como o Pânico e o Os Pingos nos Is. Mas será a estreia de Tutinha na chamada programação linear, ou seja, que não é on demand, como no streaming.

A grade está pronta. Tutinha levará para o canal sucessos como o Morning Show, noticiário matutino que traz em seu elenco o economista Joel Pinheiro da Fonseca, filho do economista Eduardo Gianetti, ex-assessor econômico da candidata à presidência Marina Silva. Também estará na grade o Direto ao Ponto, programa de entrevistas comandado pelo jornalista Augusto Nunes, ícone da direita, que chegou a trocar sopapos com o jornalista Glenn Greenwald, fundador do site Intercept, dentro dos estúdios da Jovem Pan.

Haverá, também, um pouco de entretenimento e esportes, mas o forte será o jornalismo. “É o que já fazemos bem e em quantidade”, afirma Tutinha. “Somos um grande produtor de conteúdo”. O canal será 24 horas. Para viabilizar a TV, o empresário investiu, ao longo de quatro anos, 50 milhões de reais em equipamentos, incluindo caminhões para externas ao vivo. O número de funcionários da JP, nesse período, dobrou, para quase 500.

O futuro é online, mas os anunciantes não sabem

Antes da febre das rádios online começar, Tutinha e Roberto Alves de Araújo, o CEO da JP, estavam em Nova York para um congresso de radiodifusão e foram visitar a loja de eletrônicos B&H, famosa entre fotógrafos e cinegrafistas. “Vi uma câmera robô e falei pro Roberto, ‘vamos comprar’? Enfiamos uma cada um na mala e trouxemos”, conta o empresário. O equipamento proporcionou a primeira experiência de filmar um programa de rádio, e deu “uma baita audiência”.

A ideia de filmar os apresentadores da rádio garantiu audiência e reconhecimento à Jovem Pan. Araújo representou a empresa em alguns eventos do Youtube, que usou a experiência da emissora como case de sucesso de transição digital. “Em 2018, nos chamaram para apresentar o case para uma plateia de 70 jornalistas americanos”, recorda Araújo. “Éramos nós, um veículo da Índia e a Vox (site americano). Quando subimos no palco, o apresentador falou ‘aqui tem 1 bilhão de views’.”

Os programas da Jovem Pan são assistidos por milhões. Somente o Pingo nos Is rende, por mês, cerca de 14 milhões de visitantes únicos. A rádio tem o segundo maior número de seguidores no Youtube entre as empresas de mídia, atrás apenas da Globo. “Soubemos fazer a transição para o digital”, define o CEO.

Por que, então, se enveredar pela TV, um segmento que perde relevância frente às novas tecnologias? “Os anunciantes querem essa identificação”, afirma Tutinha. “O futuro é a internet, mas, hoje, ainda nos falta esse braço de televisão.”

Tudo pela audiência

A Jovem Pan já foi responsável por uma pequena revolução televisiva. O programa Pânico na TV, comandado por Emilio Zurita, teve uma versão para a telinha entre 2003 e 2012, inicialmente na RedeTV e, por último, na Band. Com seu humor escrachado e apelo a temáticas sexuais (uma das personagens era a “Mulher Samambaia”, protagonizada pela modelo Danielle Souza, que, com o mínimo de roupas, fazia o papel de adereço de cenário), o programa foi um sucesso. “Nós quebramos uma série de paradigmas de comportamento”, diz Tutinha.

O show acabou, segundo ele, por ser muito caro. O alto custo da televisão, por sinal, foi o que manteve a Jovem Pan fora do segmento por tanto tempo, mas o cenário mudou. “Estou lançando uma TV porque ficou barato. Hoje você monta um estúdio com 1 milhão de dólares, que era o preço de uma câmera no passado”, afirma.

Reviver o Pânico, no entanto, não está nos planos. Tutinha reconhece que muitas piadas do programa se tornaram inaceitáveis culturalmente. A objetificação das mulheres, os estereótipos sociais, as pegadinhas com famosos, são coisas do passado, assim como as piadas raciais de Didi Mocó e Mussum em Os Trapalhões. “Seríamos presos”, define.

O que ainda é permitido e funciona, segundo ele, é o debate político. “Fomos os primeiros a trazer para o jornalismo a opinião”, diz Tutinha. “Os outros veículos sempre se preocuparam mais em relatar as notícias. Nós não, apostamos no debate”. Essa tradição começou com o, ainda hoje, maior sucesso da rádio, o Pingo nos Is, inicialmente sob o comando do jornalista Reinaldo Azevedo. Atualmente, o programa reúne notórios apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, como Rodrigo Constantino e Guilherme Fiúza.

A defesa intransigente de Constantino e Fiúza do governo Bolsonaro rendeu à Jovem Pan a fama de ser uma emissora “bolsonarista”. Tutinha rechaça essa ideia. “De manhã eu tenho o Joel Pinheiro da Fonseca, a Amanda Klein, que são de esquerda. À noite, o pessoal é mais de centro-direita. Procuro balancear”, diz Tutinha. “O que eu posso fazer se o Pingo dá audiência? E mais, quem acha que dá para controlar comentarista, está enganado. Eu não controlo o Constantino, nem controlava o Reinaldo Azevedo.”

Tutinha se considera de centro. Acredita no poder de mercado, mas também reconhece a necessidade do estado de ajudar quem precisa. Para ele, o empreendedorismo e o livre mercado não resolvem todos os problemas. Radical ele diz que é, mas apenas na defesa da liberdade de expressão. “Não se pode regular a mídia. Quem vai dizer o que é notícia, o que é opinião e o que é fake news? Qualquer iniciativa nesse sentido é o caminho para a censura”, afirma.

É essa liberdade que Tutinha pretende levar para a TV a cabo, com todo seu conteúdo jornalístico, para desbancar Globonews, CNN, Record News e Band News. “O investimento está feito, agora, não tem como dar errado”, diz o empresário, como um mantra. “Uma coisa é certa, vou dar trabalho.”

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