Repórter de Negócios
Publicado em 23 de junho de 2025 às 12h42.
Última atualização em 23 de junho de 2025 às 13h48.
Guerras no Oriente Médio e na Europa: as 100 maiores fabricantes de armas do mundo faturaram 632 bilhões de dólares em 2023 (Foto de Jalaa MAREY / AFP) (Jalaa Marey/AFP)
O relógio acabava de virar de sexta para sábado quando sete bombardeiros B-2 Spirit decolaram da base aérea de Whiteman, no Missouri, rumo ao Irã. Ao longo do trajeto de 18 horas, as aeronaves — entre as mais avançadas da indústria militar — foram reabastecidas no ar. Às 18h40, horário local, lançaram 14 bombas antibunker GBU-57. Cada uma pesa 13,6 toneladas e é capaz de perfurar até 61 metros no subsolo antes de explodir.
Foi a primeira vez que esse armamento foi usado em combate, para atingir instalações subterrâneas onde o Irã enriquecia urânio. É nesses locais que os serviços de inteligência acreditam que o país desenvolvia um programa nuclear ativo.
A operação marcou a entrada direta dos Estados Unidos no conflito entre Irã e Israel. Apenas os norte-americanos possuem armamentos com essa capacidade de destruição subterrânea. E só eles têm aviões com alcance, precisão e autonomia suficientes para executar um ataque desse porte.
Em 2024, os Estados Unidos gastaram 997 bilhões de dólares em despesas militares — o equivalente a 37% de todos os gastos do tipo no mundo. É mais do que o triplo da China (314 bilhões) e mais de seis vezes o que a Rússia investiu (149 bilhões).
Só os bombardeiros B-2 usados na missão custam, cada um, 2,1 bilhões de dólares. E por trás dessas máquinas de guerra, há um mercado bilionário movido por empresas privadas. São elas que fabricam os caças, mísseis, drones, blindados, satélites e bombas que alimentam os arsenais modernos. A maioria está sediada nos Estados Unidos — e lucra com cada novo episódio de instabilidade global.
A maior delas é a Lockheed Martin, com sede em Bethesda, no estado de Maryland. Formada em 1995, após a fusão entre a Lockheed Corporation e a Martin Marietta, ela é hoje a maior fabricante de equipamentos militares do mundo.
O ataque dos Estados Unidos ao Irã colocou no centro dos holofotes um setor bilionário — e opaco. Por trás dos aviões, bombas e mísseis estão empresas privadas que lucram com a instabilidade global. Segundo o levantamento mais recente do SIPRI, o Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo, as 100 maiores fabricantes de armas do mundo faturaram 632 bilhões de dólares em 2023, alta de 4,2% sobre o ano anterior.
O SIPRI é referência global no monitoramento de conflitos, armamentos e gastos militares. Criado em 1966 e sediado na Suécia, o instituto compila dados públicos e estimativas técnicas para medir o impacto da indústria bélica no cenário internacional.
Entre as 100 maiores fabricantes, 41 empresas são dos Estados Unidos, que somaram 317 bilhões de dólares, ou 50% de toda a receita global com armas. Só as cinco maiores do ranking — todas americanas — concentram 31% desse total.
A liderança é da Lockheed Martin, com 60,8 bilhões de dólares, seguida por RTX (ex-Raytheon), com 40,6 bilhões. Na terceira posição está a Northrop Grumman, fabricante do bombardeiro B-2 usado na missão contra o Irã. A empresa faturou 35,5 bilhões de dólares.
Boeing (31,1 bilhões) e General Dynamics (30,2 bilhões) completam o Top 5.
Em 2023, pela primeira vez na história, todas as 100 empresas listadas faturaram mais de 1 bilhão de dólares com armamentos. Isso mostra como até fabricantes menores surfaram o novo ciclo global de rearmamento. Segundo o SIPRI, foram justamente as empresas da “segunda divisão” — aquelas fora do Top 50 — que mais cresceram, com alta de dois dígitos em muitos casos. Elas têm cadeias produtivas mais curtas e conseguem escalar a produção mais rapidamente.
F-35 da Lockheed: caça é vendido a 17 países
Maior fabricante de armas do mundo, a Lockheed Martin nasceu em 1995 da fusão entre duas veteranas da aviação americana: a Lockheed Corporation, criada em 1912 pelos irmãos Loughead, e a Martin Marietta, formada nos anos 1960.
A união deu origem ao maior conglomerado militar do planeta. E à base do poder aéreo dos Estados Unidos.
Sediada em Bethesda, no estado de Maryland, a empresa é a responsável pelo F-35 Lightning II, um caça furtivo de quinta geração usado por mais de 17 países. Também produz o sistema THAAD, um escudo antimíssil de alta altitude, e os mísseis HIMARS, amplamente usados pela Ucrânia na guerra contra a Rússia.
Em 2023, a Lockheed liderou o ranking do SIPRI — instituto sueco que monitora a indústria bélica global — com 60,8 bilhões de dólares em vendas de armamentos, o equivalente a 90% da sua receita. Em 2024, o faturamento total da empresa chegou a 71 bilhões de dólares — e o braço militar representa cerca de 63,9 bilhões de dólares.
Em junho de 2025, o valor de mercado da companhia é estimado em 110,2 bilhões de dólares.
Quase toda a receita da Lockheed vem de contratos com o governo dos Estados Unidos. A empresa também exporta para mais de 65 países, mas sempre com autorização de Washington.
Sistema antimíssel Patriot: RTX tem parceria com empresa de Israel para criar o Domo de Ferro que protege o país de ataques de mísseis
A RTX, antiga Raytheon Technologies, é a principal fabricante de mísseis do planeta. Surgiu em 2020, com a fusão da centenária Raytheon (conhecida por seus sistemas de defesa) com a United Technologies, dona da Pratt & Whitney, que fabrica motores de avião. Hoje, a empresa tem sede na Virgínia, nos Estados Unidos.
Entre os produtos mais conhecidos da RTX está o Patriot, um sistema de defesa aérea usado para interceptar mísseis e aeronaves. Também fabrica armamentos como os mísseis Javelin, Tomahawk e AMRAAM, usados em conflitos na Ucrânia, Oriente Médio e Ásia.
Em 2023, a empresa faturou 40,6 bilhões de dólares com armamentos. No ano passado, a carteira de pedidos alcançou 218 bilhões — quase metade em defesa. Com isso, a RTX se tornou a mais valiosa do setor, com valor de mercado estimado em 195,6 bilhões de dólares.
Além dos mísseis, a RTX fabrica sensores, radares e sistemas eletrônicos embarcados, por meio da Collins Aerospace. O foco está em tecnologias de vigilância, defesa aérea e comunicação segura entre forças militares. A RTX é fornecedora dos Estados Unidos e aliados da OTAN.
A Northrop Grumman é responsável por alguns dos projetos mais estratégicos da defesa dos Estados Unidos. É dela o B-2 Spirit, bombardeiro furtivo usado no ataque recente ao Irã, e também o B-21 Raider, nova geração de aeronaves invisíveis ao radar. A empresa surgiu em 1994, da fusão entre a Northrop, fundada na Califórnia em 1939, e a Grumman, famosa por desenvolver o módulo lunar do programa Apollo.
Com sede na Virgínia e quase 100 mil funcionários, a Northrop atua em quatro áreas principais: aeronaves militares, mísseis e sistemas de defesa, satélites e sensores, e tecnologias espaciais. Também é referência em drones, como o Global Hawk, e na produção de munições guiadas, armas hipersônicas e sistemas de vigilância. Em 2024, a empresa faturou 40,3 bilhões de dólares, com carteira de pedidos de 84,2 bilhões e valor de mercado de 71,6 bilhões.
Boa parte do crescimento vem de contratos com o Departamento de Defesa dos EUA. A empresa é uma das responsáveis pela modernização nuclear americana, produzindo sistemas de lançamento, interceptação e comando. Também fornece tecnologias para aliados da OTAN, Oriente Médio e Ásia.
A Boeing é mais conhecida por fabricar aviões comerciais, mas sua divisão de defesa movimenta cifras bilionárias. Em 2023, a empresa faturou 31,1 bilhões de dólares com armamentos, ficando em quarto lugar no ranking global do SIPRI. O portfólio inclui caças F-15 e F/A-18, helicópteros Apache, drones, satélites militares e o cargueiro C-17 Globemaster. A Boeing também participa de programas espaciais da NASA e contratos de modernização das Forças Armadas dos EUA.
Já a General Dynamics opera com perfil mais discreto — e foco pesado em blindados, submarinos nucleares e tecnologia militar terrestre. A empresa é dona do tanque Abrams, peça central da artilharia americana, e fabrica os submarinos da classe Columbia, que vão substituir os atuais lançadores de mísseis nucleares dos EUA. Em 2023, a General Dynamics registrou 30,2 bilhões de dólares em vendas de defesa.
As duas empresas estão entre os principais fornecedores do Pentágono e têm forte presença em contratos com países da OTAN e do Oriente Médio.
Mesmo longe do protagonismo das grandes potências, o Brasil aparece na 21ª posição entre os países que mais gastam com armamentos. Em 2024, foram 20 bilhões de dólares investidos em defesa, segundo o levantamento mais recente do SIPRI.
A maior parte do orçamento vai para manutenção das forças armadas, mas o país também movimenta uma indústria local relevante. A principal fornecedora nacional é a Embraer Defesa, fabricante dos cargueiros KC-390 e dos aviões A-29 Super Tucano, exportados para mais de 15 países. Outras empresas de destaque são a Avibras, que fabrica o sistema de foguetes Astros II; a IMBEL, produtora de armas leves; e a Forjas Taurus, líder em pistolas e revólveres para uso policial e militar.
O Brasil também depende de tecnologia estrangeira. Helicópteros militares são produzidos pela Helibras, controlada pela Airbus. E fabricantes como a Sig Sauer, da Alemanha, buscam firmar produção local em parceria com a IMBEL. Além disso, o país importa equipamentos dos Estados Unidos, França, Israel, Reino Unido e Alemanha.