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Sem crise no Post, de Jeff Bezos

James B. Stewart © 2017 New York Times News Service Desde os dias gloriosos do Watergate, minha necessidade de ler o Washington Post aumenta e diminui. Eu assino e leio o New York Times (claro), o Wall Street Journal e a New Yorker, o que já é muito para gerir antes mesmo que possa alcançar […]

WASHINGTON POST: o jornal contratou e ganhou relevância depois de ser comprado pelo fundador da Amazon  / Justin T. Gellerson/The New York Times

WASHINGTON POST: o jornal contratou e ganhou relevância depois de ser comprado pelo fundador da Amazon / Justin T. Gellerson/The New York Times

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Da Redação

Publicado em 26 de maio de 2017 às 13h00.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h10.

James B. Stewart
© 2017 New York Times News Service

Desde os dias gloriosos do Watergate, minha necessidade de ler o Washington Post aumenta e diminui. Eu assino e leio o New York Times (claro), o Wall Street Journal e a New Yorker, o que já é muito para gerir antes mesmo que possa alcançar os livros da mesinha de cabeceira e o Kindle. Então, não estou procurando mais coisa para ler e muito menos outra despesa mensal.

Mas, por algum tempo, o logotipo do Washington Post com as palavras “Notícias Urgentes” tem aparecido na tela do meu laptop. Não tenho certeza como o Post entrou no meu reino digital, já que não me recordo de tê-lo convidado. E provavelmente teria achado irritante e intrusivo se as notícias urgentes não fossem tão interessantes.

Uma recente manchete sensacional – “Trump revelou informações altamente secretas para diplomatas russos em seu encontro no Salão Oval na semana passada” – era excepcionalmente interessante. Claro que eu cliquei.

Foi então que me vi cara a cara com a barreira de pagamento do Post, junto com a observação lisonjeira afirmando que “você obviamente ama o bom jornalismo”. E por apenas 0,99 centavos de dólar pelas primeiras quatro semanas e mais alguns cliques, eu poderia continuar lendo. Quem resistiria?

Tornei-me um assinante pela primeira vez, e o Post conseguiu monetizar seu furo.

Empresa privada desde 2013, quando o endinheirado fundador da Amazon, Jeff Bezos, a comprou por 250 milhões de dólares, o Post não divulga muito seus dados financeiros. Mas, em todas as medidas visíveis, a ressureição do jornal, tanto editorial quanto financeiramente, em menos de quatro anos, tem sido no mínimo surpreendente.

O Post afirmou que teve lucro no ano passado – e não por meio de corte de custos. Pelo contrário, com a redação sob a liderança de Martin Baron, antigo editor do Boston Globe retratado de maneira memorável no filme “Spotlight, Segredos Revelados”, o Post fez uma série de contratações. Admitiu centenas de repórteres e editores e mais do que triplicou sua equipe de tecnologia.

No mês passado, segundo dados do comScore, o jornal teve 78,7 milhões de usuários únicos e 811 milhões de visualizações de páginas digitais, ficando atrás apenas da CNN e do New York Times entre as organizações de imprensa.

“Os números publicados especulando nossas assinaturas e lucros com anúncios subestimaram tanto a realidade que chega a ser cômico”, contou-me este mês Jed Hartman, diretor de receitas do Post. “Nossa receita de publicidade digital está em sólidos nove dígitos”, ou seja, acima de 100 milhões de dólares. Este ano, afirmou, “teremos nosso terceiro ano seguido de crescimento de receita na casa de dois dígitos”.

Craig Huber, analista veterano de mídia e jornais e fundador da Huber Research Partners, diz que apesar de não ter visto os dados do Post, os ganhos relatados são incríveis. “Estou muito, muito surpreso com esses números. Ninguém está nem chegando perto. Se eles estão corretos, estou muito impressionado.”

Claro que, como acontece com outros jornais, o cenário econômico do Post ainda está sobrecarregado pelo impresso, onde a diminuição da circulação e da receita publicitária ainda é uma realidade. E a recuperação digital tem vindo muito provavelmente de uma base moderada.

Mas, editorialmente, seus furos recentes têm frequentemente moldado a discussão nacional. David Fahrenthold ganhou o Prêmio Pulitzer de reportagem nacional este ano por sua série desbancando as alegações de contribuições para caridade do presidente Donald Trump e pela maior bomba da campanha presidencial: a revelação da gravação do “Access Hollywood” em que Trump se gabava de apalpar mulheres. (O Post também foi finalista em reportagem e editorial.)

Foi a revelação do Post de que Michael Flynn havia mentido sobre seus contatos com os russos que lhe custou seu emprego como assessor de segurança nacional e jogou a Casa Branca em uma crise contínua sobre as tentativas de Trump de limitar as investigações sobre suas ligações administrativas com a Russia. (Em uma guerra à moda antiga de investigações de notícias, o Times recentemente publicou um furo correlato de que Trump havia pressionado James Comey, como diretor do FBI, a abandonar o inquérito sobre Flynn.). Furos – e jornalismo de qualidade – estão integrados ao modelo de negócio do Post.

“A reportagem investigativa é absolutamente fundamental para nosso modelo de negócios”, afirmou Baron. “Agregamos valor. Contamos às pessoas o que elas ainda não sabem. Responsabilizamos o governo, os poderosos e as instituições. Isso não pode acontecer sem apoio financeiro. Estamos em um ponto em que o público percebe e quer dar um passo para apoiar esse trabalho por meio da compra de assinaturas.”

Ele explica que as assinaturas digitais aumentaram muito depois das recentes revelações sobre a Rússia, assim como aconteceu com outros furos. No primeiro trimestre do ano, segundo o Post, o jornal somou centenas de milhares de novos assinantes digitais. (A empresa não revela o número total de assinantes.)

O jornalismo investigativo também estimula a publicidade, de acordo com Hartman. “É o que impulsiona nosso nome. E outras marcas querem se juntar a nossa marca, que é confiável.”

O analista Huber concorda. “O único futuro para os jornais é no topo do jornalismo de qualidade. É a única coisa pela qual as pessoas aceitam pagar.”

Ele explica que o Post foi um dos três jornais, com o Times e o Wall Street Journal, que fizeram transformações de sucesso. “Eles estão mostrando que uma estratégia digital é viável. Mas não dá para saber o número de pessoas que querem pagar 10 ou 12 dólares por mês por uma assinatura on-line de outros veículos além desses três.”

Huber afirma que as fontes dos furos estão gravitando em torno de apenas alguns canais de notícias liderados pelo Times e pelo Post. As fontes (e as pessoas que querem fazer “vazamentos”) procuram a publicação que tem maior impacto; formadores de opinião e influenciadores vão atrás daquela com mais fontes e furos – desse modo se dá o “efeito de rede” tão cobiçado nos círculos da tecnologia, conceito que Bezos compreende muito bem.

Quando pedi para Baron citar o que havia impulsionado a reviravolta, sua resposta imediata foi Bezos – e não por causa de sua vasta fortuna.

“A coisa fundamental que Jeff fez foi mudar totalmente nossa estratégia”, contou Baron. “Éramos uma organização de mídia focada na região de Washington, então nossa visão ficava restrita. Jeff disse desde o começo que essa não era a estratégia certa. Nossa indústria vem sofrendo por causa da internet, mas a internet também nos trouxe presentes, e devemos reconhecer isso. Ela possibilitou a distribuição gratuita, que nos deu a oportunidade de ser uma organização de imprensa nacional e mesmo internacional. Devemos reconhecer e tirar vantagem disso.”

Para muitas pessoas, a avalanche de notícias urgentes trouxe de volta as vívidas memórias do Watergate de Nixon, “Todos os Homens do Presidente” e os repórteres Woodward e Bernstein, do Post. Mas a liderança atual do jornal é a primeira a admitir que os tempos mudaram tão imensamente que as comparações com a era pré-internet são bastante irrelevantes.

“Hoje você tem de ser muito bom em tudo”, disse Hartman. “Precisa ser muito bom em tecnologia, em monetização. Mas uma coisa que acho que estamos provando é que o jornalismo de excelência pode ser lucrativo.”

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