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Saavalainen, da Finland University: a Finlândia que ensina a ensinar

A Finland University, uma empresa focada em espalhar as boas práticas do país, mostra que o sucesso começa na formação de professores

"Acredito que o setor de educação na Finlândia tem muito o que compartilhar com o mundo", diz Pekka Saavalainen (thinkstock/Thinkstock)

"Acredito que o setor de educação na Finlândia tem muito o que compartilhar com o mundo", diz Pekka Saavalainen (thinkstock/Thinkstock)

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Da Redação

Publicado em 4 de julho de 2018 às 15h36.

Última atualização em 4 de julho de 2018 às 18h26.

O finlandês Pekka Saavalainen é presidente de uma empresa que reúne quatro das maiores universidades finlandesas, um país referência em ensino. Seu objetivo é replicar pelo mundo alguns dos pilares finlandeses, centrados no respeito à formação de professores e na autonomia dos alunos. Assim, afirma, poderá não só contribuir para a educação mundo afora, como também gerar divisas importantes para seu país. Um dos lugares que ele mais tem visitado é o Brasil, onde já tem uma parceria com o grupo de ensino Ânima. É um primeiro passo, afirma, para ajudar a transformar a educação e a sociedade brasileira. Saavalainen concedeu a seguinte entrevista EXAME, na sede da Ânima, em São Paulo.

Qual o foco de sua viagem ao Brasil?

Esta é minha terceira viagem ao país. A primeira foi ano passado, em minha primeira viagem à América Latina. A atmosfera e o dinamismo que eu vi e senti aqui é algo que me atrai. A Finland University é uma empresa de educação internacional. Há catorze universidades na Finlândia. Quatro dessas universidades se juntaram e formaram a Finland University para ser o canal delas para educação internacional. Isto é, trabalhar dos dois jeitos. Fazemos assistência técnica e atividades de treinamento, e em segundo lugar, atrair mais alunos ao redor do mundo para virem estudar em nossos programas internacionais. Essas quatro universidades representam aproximadamente 40% das universidades finlandesas.

E o Brasil é uma das prioridades?

Representamos os programas das universidades ao redor do mundo. Estamos operando há quatro anos e com um foco geográfico e temático muito rigoroso. Nos primeiros dois anos, focamos o sudeste asiático. Indonésia, Tailândia e Vietnã. É um mercado de 400 milhões de pessoas, e crescendo no ritmo que a China está crescendo. Temos também um programa importante no Oriente Médio, especialmente em Omã ena Arábia Saudita. Mas as Olimpíadas foram uma virada para nós. Em contato com os Jogos Olímpicos, a Finlândia teve um campus de educação no Rio e fizemos alguns contatos iniciais. Uma das melhores conexões que fizemos foi com Daniel [Castanho, presidente da nima]. Também temos programas na Argentina e no Chile. E agora também estamos olhando ativamente para a Colômbia. Mas, sendo o Brasil um mercado de 200 milhões de pessoas, e com esse tremendo programa de reforma educacional acontecendo, é o mercado mais interessante para se estar

Como a Universidade da Finlândia trabalha?

A maior parte do nosso trabalho, da demanda que recebemos nestes últimos anos, tem relação com a educação de professores. Temos programas em cinco áreas: medicina, biomedicina, meio-ambiente, reforma de administração pública e ciência de dados (especialmente cybersecurity). A formação pode ser feita de várias formas. Pelos programas de graduação, que podem ser bacharelado na graduação ou mestrado, e também cursos de desenvolvimento profissional. A Finlândia é muito conhecida por sua educação primária. Nós claramente fizemos algo brilhante, e isso vem sendo demonstrado nos resultados até agora. Mas também há uma tremenda quantidade de pesquisa acontecendo nas universidades. Das nossas quatro universidades acionistas, uma delas, a Tampere, tem se destacado na Finlândia na pesquisa para o ensino em educação superior. E esse tem sido o programa no qual estamos trabalhando aqui.

Começamos o primeiro programa com um seleto grupo de 40 professores em Belo Horizonte, e depois lançamos uma nova leva. Uma coisa que quero enfatizar é que estamos no mercado de compartilhar. E estamos no mercado de ajudar a proporcionar soluções sustentáveis. Em algum momento, nosso programa vai funcionar em língua portuguesa, então ele poderá ser distribuído e oferecido para uma audiência muito maior. Testamos isso na Tailândia. Quando vamos para esses grandes países, temos recursos de pessoal limitado para fazer o treinamento. Então, você precisa treinar pessoas do local para continuar levando a mensagem.

O que a Finlândia fez na educação primária e, depois, na educação secundária, que pode compartilhar com outros países?

Embora o mundo esteja se tornando global e os nossos valores e interesses são muito similares ao redor dos países, eu ainda diria que o sistema de educação, como o sistema de leis, tem que ser desenvolvido na cultura local e usando os valores locais. Eu não acredito que o sistema de educação finlandês possa ser implementado em nenhum outro país. Mas alguns pilares podem inspirar uma reforma em um outro país. Na Finlândia nós oferecemos oportunidades iguais de educação para todo mundo. Em um país em que há recursos naturais limitados, o único recurso que temos é o nosso povo. Todo mundo tem que receber uma oportunidade de fazer jus ao potencial que tem.

O Brasil tem uma estrutura social e um sistema social diferente. Mas uma coisa que poderia fazer a diferença é o professor da escola primária. Na sociedade finlandesa, os professores são altamente respeitados. Porque eles são bem treinados e talentosos, eles recebem muita confiança das autoridades de educação, e muita autonomia. O que significa que dentro do amplo limite do currículo nacional, o professor pode desenvolver o treinamento usando metodologias e o programa exatamente para se adequar às necessidades de estudantes específicos com os quais ele ou ela está trabalhando.

Então, é uma abordagem muito focada no aluno. No nosso sistema de educação só tem uma prova padrão, aplicado no terceiro ano do ensino médio, essa é a prova final antes de eles irem para a universidade. Então, se há uma coisa que beneficiaria a reforma educacional brasileira, é olhar para o professor, com programas voltados para o professor da escola primária conectados com a universidade, supervisionados pela universidade. Eu não conheço nenhum outro país que use esse sistema como a Finlândia.

Esse é o tipo de conhecimento que você tenta compartilhar aqui?

Sim, estamos felizes em compartilhar, e tem um grande interesse por isso ao redor do mundo. Em muitos grandes países, o sistema de educação é de cima para baixo. Eles têm provas padrão, e depois comparam os resultados dos professores entre as escolas, e recompensam as escolas que conseguem mais pontos. Acrescenta-se uma competição nisso. Não acreditamos nesse modelo.

Mas você pode mudar o cenário no Brasil ou na Tailândia focando em empresas privadas como a Anima ou você também tenta falar com os governos?

Dado que somos recém-chegados no Brasil, ainda estamos testando. Aprendendo a entender como o Brasil funciona. Eu nunca diria que sou um expert no setor de educação no Brasil. Eu só sei um pouco. A vantagem dessas empresas de educação privada é que elas são dinâmicas. Quando elas veem algo bom, elas tem o poder de decisão para fazer as coisas acontecerem. E demonstrar que algo bom está acontecendo. E por meio dessas experiências positivas é que você influencia políticas públicas governamentais. Ainda não estamos tentando diretamente influenciar as políticas públicas. Eu acredito que ações falam mais alto. Em uma empresa como a Anima, e outras, se eles têm novos modelos e os testaram e mostraram bons resultados, esse é um jeito muito poderoso de influenciar as políticas públicas.

O trabalho da sua empresa também é muito importante para a Finlândia, certo?

Eu acredito que o setor de educação na Finlândia tem muito o que compartilhar com o mundo; em termos de volume monetário ainda é pequeno, mas eu acho que há um potencial de crescimento significativo. Na Nova Zelândia, há menos de 5 milhões de pessoas. O mercado de educação internacional deles é de cerca de 3 bilhões de dólares americanos. A maioria das pessoas vai estudar na Nova Zelândia, pagam mensalidade, pagam por moradia. Na Austrália, é mais de 20 bilhões de dólares americanos. Então, em algum momento, isso terá benefícios econômicos significativos para a Finlândia. como um setor. Vai dar novas oportunidades e fortalecer a capacidade das universidades de melhorar sua educação e pesquisa.

Nos últimos anos vimos muitos estudos e artigos sobre os problemas do modelo finlandês, os últimos resultados do PISA não foram os mesmos do que há dez anos… É parte do seu trabalho renovar o modelo, renovar o sistema para continuar no topo dos rankings, ou isso não é importante?

Para a Finlândia, estar no topo dos rankings nunca foi importante. Eu acho que os finlandeses estão meio surpresos com isso. Para muitos países, isso é muito importante, mas é uma boa coisa o fato de eles terem melhorado suas posições nos rankings, porque significa que alguma boa aconteceu nos sistemas de educação deles. Mas a China é um caso extremo. Principalmente algumas cidades, como Shanghai, têm se saído muito bem no PISA. Acho que uma das razões para isso é que são grupos selecionados de alunos que fazem a prova, e eles praticam pra essa prova. Então, não é uma amostragem aleatória, como é na Finlândia. Todas as nossas crianças vêm de uma amostragem aleatória. Seja você número 1, ou 5, ou 10, realmente não importa se você está no topo dessas medições de forma consistente. Isso mostra que algo positivo está acontecendo.

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