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Ricardo Eletro sonegou impostos para enriquecer fundador, diz MP

A Ricardo Eletro disse, em nota, que investigação é relacionada a membros de gestão anterior e não tem a ver com a empresa

Ricardo Nunes, foi o fundador da Ricardo Eletro e é o vice-prefeito de São Paulo. (Leandro Fonseca/Exame)

Ricardo Nunes, foi o fundador da Ricardo Eletro e é o vice-prefeito de São Paulo. (Leandro Fonseca/Exame)

Mariana Desidério

Mariana Desidério

Publicado em 8 de julho de 2020 às 11h44.

Última atualização em 8 de julho de 2020 às 14h21.

Investigadores à frente da operação que levou à prisão do fundador da Ricardo Eletro (ex-Máquina de Vendas), Ricardo Nunes, afirmam que a empresa tinha um comportamento recorrente de não pagamento de valores recolhidos de ICMS na venda de seus produtos, de acordo com os indícios colhidos até agora nas investigações.

O valor era cobrado dos clientes, aparecia nas notas fiscais, mas não era repassado ao estado, dizem os investigadores. A Ricardo Eletro tem uma dívida estimada em 380 milhões de reais com o estado de Minas Gerais.

O empresário foi preso na manhã desta quarta-feira em operação deflagrada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e pela Receita Federal que investiga sonegação fiscal e lavagem de dinheiro batizada de "Direto com o Dono". O caso ainda está em investigação e não foi analisado pela Justiça.

A investigação envolve o período de quase uma década. “A atitude da empresa é informar o tributo devido ao estado, solicitar o parcelamento da dívida e depois descumprir o parcelamento. É a figura do devedor contumaz, deve sempre e não quita os tributos”, afirmou Antônio de Castro Vaz de Mello Filho, superintendente Regional da Fazenda.

A suspeita dos investigadores é de que o dinheiro era usado para enriquecimento do fundador da companhia, Ricardo Nunes. Os investigadores dizem ainda que Ricardo Nunes deixou oficialmente o comando da empresa, mas que segundo as suspeitas, na prática continuava atuando na companhia.

“Ao longo de 10 anos, o que se notou foi um empobrecimento da empresa, que abriu recuperação extrajudicial, e um enriquecimento do principal sócio, que usava empresas de fachada para ocultar seu patrimônio, que vinha de sonegação, o que caracteriza lavagem de dinheiro”, afirmou Fábio Nazareth, do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa da Ordem Econômica e Tributária (Caoet/Contagem).

A operação pediu o sequestro de 60 milhões de reais em bens imóveis de alguma forma ligados ao empresário. Segundo as investigações, foram encontrados indícios de aquisição de patrimônio em pessoas jurídicas sem vínculo com a companhia ao longo dos anos. Eles citam a suspeita de abertura de uma empresa no exterior em nome da mãe do empresário.

"Localizamos documentos em que a empresa investigada pagava uma nota fiscal de aquisição de mármore destinada a um imóvel em um condomínio onde sabemos que está uma das residências do principal dono da empresa. O dinheiro não era transferido para a conta dele, mas sim usado para pagar despesas de aquisição de imóveis, reformas e cotas em outras sociedades", afirmou Nazareth.

Os investigadores dizem ainda que há suspeita de participação de outros executivos no esquema. Um deles foi alvo de mandado de prisão nesta quarta-feira, mas não foi encontrado e é considerado foragido. No total, a operação cumpre três mandados de prisão e 14 de busca e apreensão em em Belo Horizonte, Contagem, Nova Lima, São Paulo e Santo André. Além de Ricardo Nunes, foi presa também a filha do empresário, Laura Nunes.

Em nota à imprensa, a Ricardo Eletro disse que "pertence a um fundo de investimentos em participações, que vem trabalhando para superar as crises financeiras que assolam a companhia desde 2017, sendo inclusive objeto de recuperação extrajudicial devidamente homologada perante a Justiça, em 2019”.

A empresa afirma que a operação está relacionada a processos anteriores à atual gestão e “dizem respeito a supostos atos praticados por Ricardo Nunes e familiares, não tendo ligação com a companhia”.

“Em relação à dívida com o Estado de MG, a Ricardo Eletro reconhece parcialmente a dívida, antes da pandemia, estava em discussão avançada com o Estado para pagamento dos tributos passados, em consonância com as leis estaduais", diz a empresa.

Atual gestão

Em 2018, a gestora brasileira de fundos de participação Starboard negociou um acordo para comprar 72,5% da empresa por 250 milhões de reais. Pelo acordo, Nunes ficou com 15% da Máquina de Vendas. 

No mesmo ano a empresa iniciou um processo de recuperação extrajudicial. Na época a empresa tinha débitos de 1,5 bilhão com Itaú, Bradesco e Santander, além de 1 bilhão em dívidas com fornecedores de eletrônicos como Whirlpool, Samsung e LG. Por conta de atrasos nos pagamentos, a varejista deixou de receber produtos essenciais para uma varejista de eletrônicos como televisores e geladeiras. 

Em fevereiro deste ano, Pedro Bianchi, ex-sócio da gestora Starboard assumiu o comando da companhia, no lugar do executivo Luiz Wan-Dall Jr. que estava no cargo há um ano e meio.  

A companhia faturou 2 bilhões de reais em 2019 e previa faturar 2,6 bilhões em 2020, antes da pandemia. Nas últimas semanas, vinha reforçando sua operação online em meio à pandemia do coronavírus. A companhia tem 2.400 vendedores e 300 lojas.

Histórico

O grupo Ricardo Eletro foi formado em 2010, quando as varejistas mineira Ricardo Eletro e baiana Insinuante se fundiram com outras redes regionais em Rondônia, em Pernambuco e Santa Catarina para sobreviver à consolidação que o setor passava com o surgimento de gigantes como a Via Varejo. O grupo havia sido batizado de Máquina de Vendas, mas foi renomeado com a marca principal.  

O resultado foi uma empresa que faturava 10 bilhões de reais, forte presença no estado de Minas Gerais e no Nordeste. Mas a sinergia esperada para o negócio não deu resultado. Desde 2014, a empresa começou a apresentar prejuízos em seu balanço.  

Para tentar virar o jogo, a Máquina de Vendas chegou a recrutar o executivo Enéas Pestana, ex-CEO do Grupo Pão de Açúcar, para tocar o negócio. Não deu certo. Em 2016, o fundador Ricardo Nunes voltou ao cargo. Nos últimos seis anos, a companhia teve sete presidentes.  

 

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