São Paulo – Quinze dias antes de fechar a venda da Alpargatas para a J&F, por R$ 2,67 bilhões, antecipada por EXAME, os controladores da companhia venderam as marcas Topper e Rainha ao grupo do bilionário Carlos Wizard.
Na transação, de R$ 48,7 milhões, o dono da Mundo Verde e Ronaldo Academy, afirmou que o negócio aconteceu porque a Alpargatas queria focar em sua maior marca, a Havaianas.
A mesma resposta foi dada na época pelo presidente da empresa, Márcio Utsch.
“Havaianas é a responsável por metade do nosso faturamento”, disse o executivo. “Sabemos que podemos explorar muito mais a marca e é o que faremos”.
Os planos da companhia para a chinela que se tornou referência do Brasil em vários países, era a de expansão internacional e diversidade de produtos.
Vendida no país em 150.000 pontos comerciais, a marca ganhou novos itens nos últimos anos – além de novas versões, sapatos e acessórios entraram para o portfólio.
A intenção era a de estender os itens Havaianas ainda mais a partir deste ano. Óculos da marca começariam a ser vendidos a partir do segundo semestre de 2016, por meio de um acordo com a Safilo.
A parceria de licenciamento entre as duas, fechada em setembro, permite que a fabricante italiana produza e venda óculos Havaianas para vários países até 2021.
Outras frentes
Para a Osklen, o plano era de aumentar as vendas por meio de lojas multimarcas no país, além de começar a produzir roupas femininas.
Atualmente, a marca está presente em cinco países e com lojas próprias em Nova York e Miami, nos Estados Unidos. A intenção também era de, aos poucos, torná-la mais global.
Com o dólar mais alto, outro plano era o de começar a produzir a marca Mizuno nas fábricas da Alpargatas no Brasil até 2017.
“Temos como expandir nossa capacidade produtiva com novos turnos e faremos isso até lá”, contou Utsch.
Nos próximos dois anos, a empresa ainda seguirá fabricando os tênis Topper e Rainha, de forma terceirizada. Planos que devem seguir sem alterações com a mudança de controle.
Da fábrica ao varejo
JBS e Alpargatas são negócios distintos, com estratégias semelhantes em alguns pontos.
As duas, gigantes em seus segmentos, conseguiram um feito e tanto: apostaram em marcas e deixaram de ser apenas fabricante para atuar também no varejo.
Havaianas se tornou um ícone mundial, com direito a celebridades fazendo propaganda espontânea e uma equipe de 90 pessoas dedicadas a pensar na marca dentro da empresa.
Na mesma linha, a JBS apostou pesado na criação de uma marca de carne, a Friboi, para impulsionar seus produtos no país.
As iniciativas de uma e outra não deixaram de lado, claro, as exportações crescentes de ambas – um negócio que as protege de volatilidade e de um cenário interno ruim.
"Acreditamos que nossa experiência acumulada em operações globais e no desenvolvimento de marcas fortes irá impulsionar ainda mais a bem sucedida trajetória da Alpargatas" afirmou Joesley Batista, presidente da J&F Investimentos, por meio de comunicado.
Além da JBS, a J&F Investimentos controla Eldorado Brasil, o Banco Original, a Vigor e a Flora, fabricante de itens de higiene, limpeza e cosméticos.
Venda de ativos
A Camargo Corrêa era a principal acionista da Alpargatas desde 1982 e afirma que agora irá “direcionar o foco para seu principal seguimento de atuação, que é o de desenvolvimento, construção e operação de Infraestrutura”.
A holding também é dona da empreiteira de mesmo nome, uma das 23 envolvidas na Operação Lava Jato, que investiga corrupção na Petrobrás, e fechou acordo de leniência para devolver R$ 700 milhões aos cofres públicos.
A venda da Alpargatas é consequência de tal cenário segundo o mercado. Outros ativos da holding, como uma fatia da divisão de cimento InterCement e na CPFL, também estariam à venda.
-
1. Antiga presença
zoom_out_map
1/14 (Exame/Site Exame)
Dona da marca Havaianas, entre outras marcas, a Alpargatas foi vendida pela J&F, holding controladora da JBS, por 3,5 bilhões de reais. Os novos controladores da companhia são a Itausa – Investimentos Itaú S.A., Cambuhy Investimentos e a Brasil Warrant Administração de Bens Empresa S.A (BW).
A história da companhia é longa: em 2013, ela comemorou 100 anos na Bolsa de Valores de São Paulo – tempo de existência considerado quase que um milagre da perpetuidade para qualquer empresa. Grandes guerras, crises econômicas, crises de gestão e de consumo foram alguns dos cenários enfrentados durante este período pela companhia de calçados, consagrada como uma das brasileiras percursoras da difícil arte de tornar-se um negócio global.
Hoje, ela marca um novo capítulo, com novos controladores. Confira a trajetória nas imagens a seguir.
-
2. Começo de tudo
zoom_out_map
2/14 (Divulgação/Divulgação)
A história da companhia começa em 3 de abril de 1907 com a vinda da Argentina para o Brasil do escocês Robert Fraser, investidor que se une a um grupo de empresários, para a criação da Sociedade Anonyma Fábrica Brazileira de Alpargatas e Calçados. A companhia, que depois passaria a se chamar São Paulo Alpargatas, começou com uma fábrica na Mooca, zona leste da capital paulista, para a produção de calçados para trabalhadores na colheita de café.
-
3. Primeiros desafios
zoom_out_map
3/14 (Divulgação/Divulgação)
Em 1910, os calçados para lavouras de café impulsionam os negócios da empresa, que acaba tendo de estrear na Bolsa de Valores, com a intenção de captar mais recursos e investir na ampliação das operações. Porém, com a Primeira Guerra Mundial, as dificuldades financeiras, falta de matéria-prima e gripe espanhola, que deixa metade dos empregados da fábrica doentes, atrapalham os negócios. No fim da década de 20, a crise econômica provocada pela superprodução de café e pela quebra da Bolsa de Valores de Nova York faz cessar a produção das Alpargatas Roda, um dos calçados mais acessíveis e populares do País.
-
4. Novas marcas
zoom_out_map
4/14 (Veja São Paulo/VEJA)
Enquanto muitas empresas fechavam suas portas, a companhia decide investir ainda mais nos negócios e retoma a fabricação da Alpargatas Roda. Passa também a fornecer mochilas, barracas e fardas aos combatentes da Revolução de 1932. Depois de atravessar outro grande desafio, com a Segunda Guerra Mundial, a companhia lança sua primeira calça jeans, a Rodeio. Na década de 50, os modelos de tênis Conga e Bamba Basquete são lançados, assim como a lona Sempreviva. Os lançamentos seguem com as calças de brim Far West, na década de 60, as botas de borracha Sete Léguas para trabalhadores da agricultura, agropecuária e construção civil no ano seguinte e a Havaianas, um ano depois.
-
5. Não deformam
zoom_out_map
5/14 (Divulgação/Divulgação)
Criada em 1962, a marca Havaianas foi, desde o começo, um sucesso de vendas entre as pessoas que recorriam ao tal chinelo de dedo para ficar em casa. As vendas perderam fôlego nos anos 80, mas foram relançadas em 1994, com outro enfoque. Os produtos reapareceram com tons monocromáticos e, três anos depois, em versões de uma infinidade de cores para deixar de ser funcional e se tornar um acessório de moda. O marketing em cima das “únicas que não deformam” ajudou bastante. Missão cumprida com sucesso dentro e fora do país, onde o produto ganhou destaque a ponto de ser usado por celebridades de todo mundo. Em 2009, a marca ganha sua primeira loja conceito: o Espaço Havaianas, na Rua Oscar Freire, badalado endereço da capital paulista.
-
6. Marcas esportivas
zoom_out_map
6/14 (Divulgação/Divulgação)
A empresa inaugura fábricas de Norte a Sul do País e entra no segmento de artigos esportivos com o lançamento da marca Topper e a compra da Rainha em 1979, no mercado brasileiro desde 1934. Inaugura, anos depois, uma fábrica na Paraíba, e lança as sandálias Samoa (descontinuada em 2003) e o jeans Top Plus. Além do relançamento da Havaianas, a Alpargatas licencia, na década de 90, as marcas Timberland, especializada em esportes de aventura, Mizuno, tênis voltado para adeptos do atletismo, o calçado Kichute, e a Nike (cuja licença da marca ficou em seu poder até 1994.
-
7. A reforma
zoom_out_map
7/14 (Divulgação/Divulgação)
A partir de 1998, a empresa interrompe um longo processo de declínio iniciado nos anos 80 e volta a dar lucro. Mudanças de processos e cortes de custos e pessoas aconteceram depois do resultado de uma análise dos donos da empresa com a consultoria McKinsey e a implantação de um programa intitulado Avaliação do Valor de Atividade – apelidado internamente de Adeus aos Velhos Amigos pelos funcionários. Nesta etapa, o número de empregados foi reduzido de 14.500 para 10.500 e a empresa foi dividida, como hoje, em unidades de negócios.
-
8. Negócios globais
zoom_out_map
8/14 (Exame/Exame)
O sucesso da Havaianas, e a estabilidade do cenário mundial, abriu para a Alpargatas a oportunidade de replicar o sucesso das vendas do produto de dentro para fora do Brasil. Dentro da estratégia de virar global, a companhia inaugurou, em 2007, um escritório em Nova York. Também adquiriu 60% da operação na Argentina, além da pernambucana Dupé, assumindo a liderança do segmento de sandálias no país. Em 2008, inaugura escritórios comerciais na Espanha e, no ano seguinte, no Reino Unido, França e Itália.
-
9. Compra da Osklen
zoom_out_map
9/14 (Jorge Bispo/Veja SP/VEJA)
Em novembro de 2010, a empresa
comprou 30% da brasileira Osklen, com opção para mais 30%. A marca adquirida, já famosa internacionalmente, continuou sob a coordenação de criação e estilo de seu fundador, Oskar Metsavaht, e a intenção era repetir com a Osklen o sucesso mundial de Haiavanas.
-
10. Novo posicionamento
zoom_out_map
10/14 (Lailson Santos/Exame)
Em 2009, a Topper ganha um novo posicionamento. A ideia é fazer dela uma marca unissex, voltada para vários esportes, como tênis e rugby. Mas também mantê-la no promissor mercado de futebol, com o patrocínio dos clubes Atlético Mineiro, no Brasil, o Estudiantes, na Argentina, além de craques brasileiros como os goleiros Marcos, do Palmeiras, e Marcelo Lomba, do Flamengo. No ano seguinte, passa a patrocinar a Seleção Brasileira de Rugby.
-
11. Mais mudanças
zoom_out_map
11/14 (Kai Hendry/Wikimedia Commons)
A empresa reforça o enfoque na comercialização de calçados e artigos esportivos e vende a operação Locomotiva e os respectivos ativos do negócio. De São Paulo Alpargatas passa a se chamar Alpargatas e, seguindo o caminho da globalização, transfere sua sede e rejuvenesce a imagem institucional. Em 2011, a Alpargatas detém 91,5% do capital das operações na Argentina e vira líder do mercado de calçados na América Latina. Para analistas de mercado, a compra da Osklen é só o começo do quanto a empresa ainda pretende investir lá fora.
-
12. Marcas vendidas
zoom_out_map
12/14 (./Divulgação)
Em novembro de 2015, a Alpargatas anunciou a venda das marcas de calçados esportivos Rainha e Topper no Brasil a um grupo de investidores liderados pelo empresário Carlos Wizard por 48,7 milhões de reais.
O acordo também envolve a venda da marca Rainha no mundo e 20% da Topper na Argentina e no mundo, com exceção de Estados Unidos e China, onde a marca será licenciada por 15 anos aos compradores.
-
13. Mudança de mãos
zoom_out_map
13/14 (Ueslei Marcelino/Reuters)
Poucas semanas depois de vender as marcas Rainha e Topper, a companhia muda de mãos. A Camargo Correa vendeu o controle da Alpargatas para dona da JBS, a holding J&F, no fim de novembro de 2015. O valor da operação de venda para a J&F foi de 2,66 bilhões de reais.
O grupo empresarial controlava cada passo desde 2002 (desde 1982 tinha participação na empresa) e precisava levantar o dinheiro depois da empreiteira ter sido uma das envolvidas na Operação Lava Jato, que investiga corrupção na Petrobras. A condenação da justiça por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa nas obras da refinaria Abreu e Lima, da Petrobrás, em julho, forçou a empresa a um acerto.
-
14. Venda, de novo
zoom_out_map
14/14 (./Divulgação)
A Operação Lava Jato interferiu na história da companhia de novo. Após delação premiada dos irmãos Joesley e Wesley Batista, controladores da J&F, o grupo colocou em andamento um processo de desinvestimentos. A meta é conseguir 6 bilhões de reais em recursos.
Entre esses ativos, estava a Alpargatas. O negócio foi fechado por R$ 3,5 bilhões, sendo R$ 14,25 o valor atribuído por ação ordinária e R$ 11,40 por preferencial, vendidas pela J&F.