A chegada dos serviços de saneamento básico traz ganhos para a sociedade, em especial a diminuição dos casos de doenças e, consequentemente, a redução dos gastos com saúde (Getty Images/Getty Images)
Felipe Giacomelli
Publicado em 10 de setembro de 2020 às 08h00.
Em 2012, o Serviço Municipal de Água e Esgoto (Semae) de Piracicaba e a prefeitura da cidade, a 160 quilômetros da capital paulista, e a Aegea Saneamento, uma das líderes no saneamento privado no país, firmaram um contrato de parceria público-privada (PPP) por meio da Concessionária Mirante para universalizar o serviço de saneamento básico no município. Dois anos depois, a meta foi cumprida.
A universalização trouxe benefícios sociais, como a redução dos problemas de saúde e a melhora da qualidade de vida, além de ganhos econômicos para os cidadãos atendidos. Mais do que isso, o serviço levou cidadania à população carente atendida. “Essas pessoas passam a ter um endereço com comprovante residencial, ganham dignidade e se sentem valorizadas com as novas condições de vida”, afirma Jacy Prado, presidente da concessionária Mirante. “Elas começam a poder fazer coisas que para muitos parecem simples, como ter uma conta de água em seu nome e, com isso, poder fazer um crediário.”
Atualmente, cerca de 400.000 pessoas são beneficiadas pela estratégia de universalização dos serviços em Piracicaba. A cidade ocupa a primeira posição, ao lado dos municípios paulistas de São Caetano do Sul e Rio Claro, nos índices de atendimento total de esgoto do Brasil, com 100% de cobertura, segundo o Ranking do Saneamento Básico 2020 – 100 Maiores Cidades do Brasil, elaborado pelo Instituto Trata Brasil, em parceria com a GO Associados, com base em informações do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), ano-base 2018, divulgadas pelo Ministério das Cidades anualmente. O município também é referência no Ranking de Saneamento da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes).
A universalização do esgotamento sanitário em Piracicaba de forma acelerada é um exemplo bem-sucedido de parceria entre os setores público e privado e como isso pode refletir em ganhos para a população.
Para Édison Carlos, presidente executivo da Trata Brasil, os ganhos da sociedade com a chegada dos serviços de saneamento são muitos, em especial a diminuição dos casos de
doenças de veiculação hídrica que provocam internações por enfermidades como diarreia, cólera e leptospirose, e, consequentemente, a redução dos gastos com a saúde.
Um estudo elaborado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) mostra que aproximadamente 65% das internações hospitalares de crianças de até 10 anos são decorrentes de problemas relacionados à falta de saneamento básico, como a dificuldade do acesso a água tratada e serviços de coleta e tratamento de esgoto.
Mas os ganhos vão além da saúde. Pessoas mais saudáveis têm aproveitamento melhor na escola e no trabalho. Na sala de aula, por exemplo, menores que vivem onde não há saneamento apresentam 18% menos rendimento e a reprovação de quem tem acesso a estruturas adequadas é 44,2% menor do que os que não têm acesso. Os dados fazem parte da pesquisa Trata Brasil: Saneamento, Saúde, Educação, Trabalho e Turismo, desenvolvida pelo instituto Trata Brasil em parceria com a Fundação Getulio Vargas (FGV).
Tudo isso também se reflete nos cofres públicos. Segundo dados do Trata Brasil, os dez municípios com o pior índice de saneamento gastam 16,72 reais por habitante ao ano com doenças de veiculação hídrica, enquanto os dez melhores gastam 3,43 reais. E chega a ser 2,7 vezes maior o total de internações onde os dados relativos a água e esgoto são inferiores na comparação com o desempenho dos municípios que mais investem em saneamento.
Em duas décadas, já descontando os custos da universalização, os ganhos econômicos e sociais trazidos pela expansão dos serviços em suas diversas áreas alcançariam 1,2 trilhão de reais no Brasil. Isso significa que a universalização do saneamento traria ganhos expressivos para a sociedade brasileira muito superiores a seus custos, segundo o estudo “Benefícios Econômicos e Sociais da Expansão do Saneamento Brasileiro 2018”, elaborado pela consultoria Exante para o Instituto Trata Brasil, em parceria com a Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (ABCON).
Nos modelos de PPPs de que a Aegea participa, a companhia atua como administradora das concessões de esgoto com operadores públicos, contribuindo com sua expertise no setor e com investimentos. Nesse modelo de negócios, o parceiro privado ajuda a captar recursos e a planejar a execução de obras necessárias para o município num prazo menor.
“O rápido avanço nos números, como em Piracicaba, tem a ver com o know how e o modelo de negócios da Aegea. Trabalhamos com metas de investimentos, eficiência
operacional e com ações socioeconômicas que beneficiam a população não somente com seus serviços prestados”, afirma Rogério Tavares, vice-presidente de relações institucionais da empresa.
Hoje, a Aegea atende quatro concessões nesse formato. Além de Piracicaba, as cidades de Serra e Vila Velha, no Espírito Santo, e nove municípios que constituem a região metropolitana de Porto Alegre foram elaborados no modelo de concorrência e leilão nos últimos anos.
Para Édison Carlos, da Trata Brasil, as PPPs são uma das modalidades que possibilitam ampliar de forma mais acelerada os serviços de saneamento, pois a sinergia entre a empresa pública e a privada permite aproveitar o conhecimento e o histórico da primeira com os recursos financeiros, a tecnologia, a gestão, a eficiência e a produtividade normalmente trazidos pela segunda.
Essas parcerias também ajudam a acelerar o alcance de metas locais, nacionais e compromissos internacionais pela universalização da água e do esgoto. “Temos compromissos com o cidadão, mas também com iniciativas voltadas para o tema, como o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – especificamente o número 6, que propõe levar água potável e saneamento básico a todos até 2030, firmado pelo Brasil com a Organização das Nações Unidas”, diz o executivo da Trata Brasil.
Com a pandemia de covid-19, ficou evidente que a crise sanitária afeta a saúde da população, pois a água é o principal elemento da vida e item essencial para prevenção de doenças.
Para o presidente executivo da Trata Brasil, o coronavírus trouxe luz a vários problemas nacionais, como as carências na saúde e no saneamento. “As áreas mais pobres e vulneráveis são justamente onde as pessoas correm mais riscos de contaminação da covid-19.”
Com esse cenário, a Aegea intensificou obras e adaptou a operação nas 57 cidades atendidas pela empresa, visando garantir a continuidade dos serviços. No âmbito operacional, foram intensificados os trabalhos para regularização do abastecimento em áreas de população vulnerável em Manaus, capital do Amazonas, um dos epicentros da covid-19.
Em Teresina, a expansão de obras para regularização em comunidades carentes foi intensificada, beneficiando mais de 32.000 pessoas com a redução dos riscos de
contaminação do coronavírus, e também de outras doenças, com o tratamento do esgoto.
Todos os investimentos e parcerias são essenciais para mudar o quadro de atraso do saneamento no Brasil, onde mais de 100 milhões de pessoas ainda não possuem tratamento de esgoto e 35 milhões não têm acesso a água tratada.
Em julho deste ano foi sancionado o Marco Legal do Saneamento Básico. A meta é universalizar o saneamento básico no país até 2033, atingindo cobertura de 99% no fornecimento de água potável e de 90% em coleta e tratamento de esgoto no território nacional. A previsão de investimento é de até 700 bilhões de reais.
Para o vice-presidente de relações institucionais da Aegea, o novo marco vai promover novos investimentos, que serão capazes de gerar grandes resultados na esfera socioeconômica do país, bem como a melhoria da saúde pública – com ampliação e aperfeiçoamento do setor e com ganho de renda, em razão dos impactos diretos e indiretos na geração de empregos. “A expectativa é que as principais mudanças no setor sejam perceptíveis aos consumidores em um período de três a cinco anos”, diz Tavares.
A nova Lei traz metas que deverão ser cumpridas por todas as cidades e empresas de água e esgoto do Brasil. Elas precisarão comprovar capacidade técnica e financeira para resolver definitivamente o problema do saneamento no país.
“A lei será ainda mais relevante para as empresas que estão há muitos anos prestando serviços nas cidades mas que não têm conseguido avançar”, afirma Édison Carlos. “Os serviços prestados precisarão ser regulados e sua qualidade avaliada. Além disso, as tarifas precisarão estar adequadas ao poder de pagamento da população”, completa.