Cena de "Depois da Terra", com Will e Jaden Smith, uma das decepções da temporada (Divulgação/Sony Pictures)
João Pedro Caleiro
Publicado em 2 de agosto de 2013 às 17h20.
São Paulo - “Haverá uma implosão quando três ou quatro ou talvez até seis filmes de alto orçamento se espatifarem, e isso vai mudar o paradigma”. A previsão foi feita por Steven Spielberg na abertura de um novo centro de mídia na Universidade da Califórnia do Sul. Desde que ele fez a declaração, no meio de junho, quatro produções caras estrearam com resultados fracos nas bilheterias americanas – e Hollywood continua de pé. Mas a questão permanece: o blockbuster deixou de ser um bom negócio?
Para começo de conversa, ainda não dá para saber o tamanho do rombo que decepções da temporada como “O Ataque” e “Turbo” vão deixar, já que os números dos Estados Unidos são cada vez menos relevantes para o resultado final. O mercado americano responde hoje por apenas 30% da arrecadação, enquanto o restante vem das salas de cinema ao redor do mundo – há 15 anos atrás, a proporção era exatamente inversa.
Os estúdios também mudaram: atualmente, eles são apenas uma parte (pequena) de grandes conglomerados de mídia. Geram novas marcas e abastecem canais e parques de novo conteúdo, mas não são a peça chave para o resultado financeiro. Não é por acaso que o valor das ações da Disney permaneceu inabalado após fracassos da magnitude de “John Carter” e “Cavaleiro Solitário”: o estúdio respondeu por apenas 7% da receita operacional total da empresa no último ano fiscal.
Estratégia
Mais do que lucrar na margem com projetos individuais, a luta de Hollywood é para permanecer relevante em um mundo saturado de opções de entretenimento. Após a crise de 2008, houve uma opção, assim como em outros setores da economia, pela fuga do risco. Isso significou foco total em franquias em detrimento de novos projetos, e em menos filmes com maior potencial.
Para o fundador e diretor-geral da distribuidora Downtown filmes, Bruno Wainer, só uma sucessão de safras negativas poderia causar uma guinada no modelo: “O que deu errado nessa temporada foram justamente as tentativas de lançar novas franquias, e o planejamento dos próximos anos já está feito. Fazer um downsizing do tamanho dos filmes significaria fazer um downsizing dos jatinhos, dos bônus executivos, de toda a estrutura.”
Todo o modelo está baseado nessa lógica. A MPAA (Motion Pictures Association of America) já não divulga o custo médio das produções desde 2009, mas os últimos dados, de 2007, apontavam um custo médio de 106 milhões de dólares em produção e marketing para um filme de estúdio.
“Quem fura o bloqueio é o blockbuster. É ele que mantém a chama acesa do cinema como espetáculo. É quase como o lançamento de um smartphone da Apple: tem a urgência de tirar você dentro de casa, faz você ficar na fila na chuva. Se Hollywood for fazer filme médio, vai concorrer com todo mundo”, diz Paulo Sérgio Almeida, diretor da Filme B, portal especializado no mercado de cinema.
Os estúdios sabem que basta um fenômeno como “Os Vingadores” (1,5 bilhão e meio de dólares de bilheteria global) para justificar o gasto em mais um punhado de produções do tipo. “Você compra dez cavalos de corrida, mas só um vai ser craque. Não se pode economizar tostões para dominar o mundo”, completa Paulo.
Perspectivas
2012 foi o melhor ano da história na arrecadação do cinema americano, com 10,836 bilhões de dólares, apesar do pico de ingressos vendidos ter sido o de 1,572 milhão em 2002. A explicação para isso está no fenômeno 3D – uma experiência impossível de reproduzir em casa e que justifica a venda de ingressos mais caros.
Isso não significa que os diretores estejam satisfeitos com o modelo atual. No último Festival Internacional de Cinema de São Francisco, em abril, o diretor Steven Soderbergh comparou Hollywood a “Detroit antes do resgate” e disse que “um roedor pode ser mais inteligente do que um estúdio na hora de escolher um projeto“. Seu último filme, uma biografia do cantor Liberace estrelada por Michael Douglas e Matt Damon, foi lançado diretamente na televisão – que está atraindo talentos consagrados e se tornando um celeiro de projetos mais autorais.
Falando no mesmo evento de Spielberg, George Lucas disse acreditar que o cinema caminha para um modelo mais próximo da Broadway, com foco em alguns grandes projetos que ficam em cartaz por muito tempo em salas maiores com preços mais caros. A Paramount experimentou algo nesse sentido ao oferecer um mega-ingresso de 50 dólares para exibições prévias de “Guerra Mundial Z”, que incluíam pipoca, pôster e outros mimos.
Spielberg foi um dos responsáveis pelo florescimento do filme-espetáculo nos anos 1980, mas seus projetos mudaram muito desde então. O cinema está em uma encruzilhada, mas não espere pela estreia da implosão de Hollywood já no próximo verão.