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Por que a dona de Louis Vuitton e Sephora quer comprar a Tiffany

Grupo francês de Bernard Arnault ofereceu 14,5 bilhões de dólares pela Tiffany. A possibilidade do negócio fez ações da joalheria subirem mais de 30%

Audrey Hepburn no filme Breakfast at Tiffany's: o filme dos anos 1960 imortalizou o luxo como estilo de vida.  (Breakfast At Tiffany's/Reprodução)

Audrey Hepburn no filme Breakfast at Tiffany's: o filme dos anos 1960 imortalizou o luxo como estilo de vida. (Breakfast At Tiffany's/Reprodução)

CR

Carolina Riveira

Publicado em 28 de outubro de 2019 às 18h39.

Última atualização em 30 de julho de 2020 às 14h27.

Uma notícia divulgada neste fim de semana pode revirar o mercado de luxo mundial. O grupo francês LVMH, dono de marcas como Louis Vuitton e Dior, fez uma oferta para comprar a americana Tiffany, maior joalheria do mundo. A informação foi inicialmente divulgada pela agência Reuters e confirmada nesta segunda-feira 28 pelo LVMH.

A oferta do LVMH foi de 14,5 bilhões de dólares, ou 120 dólares por ação. Em comunicado, o grupo diz que iniciou "conversas preliminares" com a Tiffany, mas que não há "nenhuma certeza de que as negociações serão concluídas com êxito". A agência AFP afirmou que a oferta foi feita no início de outubro. O jornal britânico Financial Times diz ainda que a Tiffany deve rejeitar a oferta, de acordo com pessoas próximas à negociação.

O valor oferecido pelo grupo francês seria pouco mais de 20% maior do que o preço em que ação da Tiffany fechou na última sexta-feira 25, 98,55 dólares. Mas ao longo desta segunda-feira, com a perspectiva do negócio, o valor da ação da Tiffany passou a oferta do LVMH: o papel subiu mais de 30% ao longo de todo o dia e fechou em alta de 31,6%, valendo 129,72 euros.

Apesar do valor da ação já estar próximo à oferta do LVMH, a animação dos investidores vem do potencial de crescimento da joalheria norte-americana sob o guarda-chuva do grupo francês, diz Abelardo Marcondes, fundador do LuxuryLab Global, consultoria especializada em mercado de luxo.

Embora seja uma gigante mundial do luxo, a Tiffany faturou 4,4 bilhões de dólares no ano passado, pouco comparado aos 46,8 bilhões de euros do grupo LVMH (ou 51,9 bilhões de dólares). A Tiffany vale 15,7 bilhões de dólares na bolsa de Nova York (a NYSE), enquanto o LVMH tem valor de mercado de 192,3 bilhões de euros em Paris.

O grupo francês é dono de mais de 70 marcas de luxo em diversos segmentos, como jóias, roupas, perfumes e acessórios, e está presente em mais de 4.000 lojas mundo afora, incluindo o segmento de varejo de lojas de luxo, como com as lojas de maquiagem Sephora.

A LVMH já comprou em 2011 a merca de jóias italiana Bulgari por 3,7 bilhões de euros, em um negócio que seu controlador, Bernard Arnault, chamou de "transformacional". Fundada em 1881, a Bulgari diversificou o portfólio de produtos de luxo da LVMH e, unindo seu renome à grande cadeia do grupo francês, conseguiu expandir sua atuação em mercados emergentes e na Ásia. "A Bulgari conseguiu se desenvolver muito bem sob controle da LVMH. A expectativa é que a Tiffany possa seguir o mesmo caminho", diz Marcondes, do LuxuryLab Global.

Puxado pela Bulgari, o segmento de relógios e jóias do LVMH teve alta de mais de 30% nos lucros operacionais em 2018, ante alta geral de 12% do LVMH. O LVMH também vem expandindo sua atuação na Ásia, sobretudo na China, que, em vista de seu alto crescimento econômico, tornou-se a galinha dos ovos de ouro do mercado de luxo no mundo.

Assim, pelo lado da Tiffany, a parceria com o LVMH poderia ajudá-la a expandir sua atuação para novos mercados fora dos Estados Unidos, sua terra-natal. Já o LVMH poderia usar a Tiffany para intensificar sua participação no segmento de jóias e, sobretudo, entrar com mais força nos Estados Unidos -- mercado onde o desemprego está baixo há quase uma década e a classe média forte pode ser alavancar o faturamento.

Sob o guarda-chuva do LVMH, a Tiffany poderia também expandir seu portfólio para além das jóias, que hoje respondem por mais de 90% do faturamento da empresa americana. O grupo francês abriu no ano passado uma gigantesca fábrica no Texas, nos Estados Unidos, para fabricar bolsas da marca Louis Vuitton -- ganhando elogios do presidente Donald Trump. "É uma cadeia de varejo e manufatura gigantesca da qual a Tiffany poderia se aproveitar", diz Marcondes.

Analistas que cobrem a Tiffany também acreditam que a aproximação de Tiffany e LVMH poderia ser benéfica às duas empresas. "Há sinergias significativas em marketing e mercado imobiliário (lojas) que poderiam ser desbloqueadas", escreveu o analista Edward Yruma, do banco americano KeyBanc.

O bom momento do LVMH, cujo faturamento subiu mais de 15% no primeiro semestre de 2019, fez Arnault tornar-se neste ano o terceiro homem mais rico do mundo, com uma fortuna de 96,5 bilhões de dólares -- só nos últimos 12 meses, o francês enriqueceu 28 bilhões de dólares. Arnault comprou o LVMH na década de 1980, quando a empresa estava à beira da falência, e o transformou no maior grupo de luxo do mundo. Seu patrimônio é hoje maior que o do mega investidor Warren Buffett, dono do fundo Berkshire Hathaway, e está atrás somente de Jeff Bezos, fundador e presidente da Amazon, e Bill Gates, fundador da Microsoft.

Loja da Tiffany&Co. no shopping JK Iguatemi

Loja da Tiffany&Co. no shopping JK Iguatemi: a joalheria norte-americana tem seis unidades no Brasil (Massimo Falluti/Tiffany&Co./Divulgação)

O desafio da Tiffany com os millenials 

Joalheria mais antiga do mundo, a Tiffany foi fundada em 1837 em Nova York, a princípio com o nome Tiffany and Young -- dos fundadores Charles Lewis Tiffany e John Barnett Young. Em 1853, passou a chamar-se apenas Tiffany. A empresa cresceu junto com a economia dos Estados Unidos no século 20, e também se aproveitou da corrida pelo ouro na Califórnia em meados do século 19, que a ajudou a fabricar suas jóias dentro de casa. 

Apesar de uma certa retração nas vendas em anos como 2015 e 2016, as finanças da empresa estão saudáveis sob comando do presidente Alessandro Bogliolo, que já passou pela Bulgari e comanda a Tiffany desde 2017. No ano passado, a empresa teve lucro de 586,4 milhões de dólares em 2018, alta de 58% na comparação com 2017. No Brasil, a empresa tem seis lojas em Brasília, Curitiba, Rio de Janeiro e São Paulo.

Seu maior desafio atualmente é fazer com que sua tradicional marca continue relevante para as novas gerações. "É uma marca que está envelhecendo, não está se transformando, fazendo algo novo", diz Marcondes, do LuxuryLab Global. "É o contrário do que faz a LVMH, que está conseguindo se reinventar o tempo todo, se conectar com influenciadores, novos designers, investindo em novas marcas".

O mercado de luxo faturou 1,2 trilhão de dólares em 2018, segundo a consultoria Bain&Co, com alta de 5% na comparação com o ano passado. Por atender a classes mais altas, o setor é relativamente protegido de crises. Mas há uma transformação em curso: empresas como a Tiffany e a LVMH são as vítimas mais fatais de um movimento do setor de luxo que inclui os consumidores gastando mais em "experiências" do que na aquisição de mercadorias duráveis, o que vem fazendo crescer segmentos como turismo, bem-estar, academias e até serviços de saúde. Nesse cenário, empresas como a própria LVMH e as italianas Armani e Versace, mesmo especializadas em vestuário e perfumaria, estão investindo em hotéis de luxo.

Bogliolo chegou justamente com o desafio de modernizar a Tiffany para atender a essas novas demandas. Neste ano, a empresa investiu, por exemplo, em um sistema para mapear a origem de seus diamantes, dando voz a uma crescente preocupação do mercado de luxo com a responsabilidade social e ambiental. A empresa também criou recentemente produtos como acessórios para casa e cozinha, fragrâncias próprias e uma cafeteria em Nova York.

Cenas como do filme "Breakfast at Tiffany's" (ou "Bonequinha de Luxo"), lançado em 1961, ainda vêm à mente quando o assunto é a Tiffany e o luxuoso estilo de vida que tornou-se símbolo da elite urbana nova-iorquina. O desafio da Tiffany será fazer com que, mais de meio século depois, a imagem de Audrey Hepburn usando as jóias da centenária empresa ainda seja objeto de desejo dos jovens de 20 ou 30 anos -- tanto quanto uma viagem ou um café gourmet.

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