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Por que a Bombril pediu recuperação judicial e quem são os maiores credores

Endividada e com passivos tributários de R$ 2,3 bilhões, empresa busca proteção para evitar falência e renegociar dívidas

Bombril: companhia tem dívidas tributárias de R$ 2,3 bilhões (.)

Bombril: companhia tem dívidas tributárias de R$ 2,3 bilhões (.)

Isabela Rovaroto
Isabela Rovaroto

Repórter de Negócios

Publicado em 11 de fevereiro de 2025 às 14h50.

A Bombril entrou com pedido de recuperação judicial nesta segunda-feira, 10, na 1ª Vara Regional Empresarial e de Conflitos Relacionados à Arbitragem. A empresa, conhecida pelas esponjas de aço e outros produtos de limpeza, busca proteção para renegociar suas dívidas e evitar a falência. Seus passivos tributários somam R$ 2,3 bilhões, resultado de autuações fiscais que se arrastam há décadas.

Além disso, a empresa enfrenta obrigações financeiras com vencimentos antecipados que podem chegar a R$ 220 milhões. Entre os principais credores estão bancos e instituições financeiras, como Banco ABC Brasil, C6 Bank, Banco Daycoval e Tribanco.

O pedido reflete um cenário mais amplo. Em 2024, o Brasil registrou 2.273 recuperações judiciais, o maior número da série histórica da Serasa Experian. O volume representa um aumento de 61,8% em relação a 2023, impulsionado principalmente por micro e pequenas empresas, que responderam por 1.676 pedidos. O setor de serviços liderou os requerimentos, seguido por comércio e indústria.

No caso da Bombril, o pedido é consequência de um longo histórico de problemas financeiros. A crise começou nos anos 1990, quando a empresa foi vendida para um grupo estrangeiro e passou por uma gestão marcada por operações financeiras duvidosas. Desde então, a empresa acumulou dívidas bilionárias, perdeu acesso a crédito, viu sua participação de mercado diminuir e enfrentou penhoras sobre seus ativos.

A seguir, os principais fatores que levaram a Bombril à recuperação judicial.

Falta de gestão

Nos anos 1990, após a morte do fundador Roberto Ferreira, a Bombril foi vendida para o grupo italiano Cragnotti & Partners Capital Investments Brasil S.A., liderado pelo empresário Sérgio Cragnotti. De acordo com o documento da recuperação judicial, a nova gestão adotou práticas financeiras arriscadas, incluindo a transferência de recursos para a compra de títulos da dívida americana e argentina.

A operação chamou atenção da Receita Federal, que autuou a empresa em valores bilionários. Mesmo após anos de disputas judiciais, os débitos continuaram afetando a estrutura financeira da Bombril.

Em 2002, a crise se aprofundou. A Cragnotti & Partners deixou de cumprir compromissos assumidos na compra da empresa, o que levou um dos herdeiros do fundador, Ronaldo Sampaio Ferreira, a acionar a Justiça. A 10ª Vara Cível de São Paulo determinou intervenção na administração, afastando os gestores indicados pelos italianos e nomeando um administrador judicial.

A família Ferreira só retomou o controle da Bombril em 2006, após uma decisão da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo. Desde então, a empresa tentou reorganizar suas finanças, mas o peso das dívidas deixadas pela antiga administração continuou comprometendo seu desempenho.

Dificuldade de acesso a crédito

Nos últimos anos, a Bombril enfrentou dificuldades para acessar crédito devido às incertezas sobre sua continuidade operacional e ao peso das dívidas acumuladas. Com restrições no mercado financeiro, a empresa passou a recorrer a empréstimos de curto prazo com condições desfavoráveis.

Em 2023, a Bombril pagava juros médios de 24% ao ano, enquanto 77% da sua dívida tinha vencimento inferior a 12 meses. Sem crédito de longo prazo, a capacidade de investimento ficou limitada.

A baixa geração de caixa agravou o problema. Apesar de ter registrado 100 milhões de reais em lucro contábil em 2023, a empresa conseguiu transformar apenas 1,8 milhão de reais em caixa, o que representava menos de 2% do lucro.

Perda de mercado e dificuldades operacionais

A empresa perdeu participação de mercado em segmentos estratégicos, como desinfetantes, lã de aço, sapólio e amaciantes. Sem capacidade de investir em marketing e inovação, a Bombril viu concorrentes avançarem enquanto tentava equilibrar suas finanças.

A crise financeira afetou diretamente a operação. Para lidar com o passivo bilionário, a empresa precisou renegociar prazos com fornecedores e reduzir investimentos na modernização das fábricas.

A situação piorou com a penhora de ativos essenciais, incluindo suas unidades industriais em São Bernardo do Campo (SP), Sete Lagoas (MG) e Abreu e Lima (PE). Sem esses bens livres para garantir novos financiamentos, a capacidade de expansão e reposicionamento da marca ficou ainda mais limitada.

Com isso, a companhia reduziu sua capacidade de oferecer garantias para financiamentos e dificultando investimentos em modernização e operação. Parte dos fornecedores exigiu pagamento à vista, pressionando ainda mais o fluxo de caixa.

Reclassificação da dívida tributária

A reclassificação de uma dívida tributária bilionária foi um dos principais gatilhos para o pedido de recuperação judicial da Bombril. A empresa passou a considerar como "perda provável" um passivo que antes estava em disputa, o que aumentou a desconfiança sobre sua capacidade de pagamento e obrigou um provisionamento contábil significativo.

Com essa mudança no balanço, credores começaram a avaliar a possibilidade de vencimento antecipado de obrigações, o que poderia gerar cobranças superiores a 220 milhões de reais de forma imediata. Esse movimento criou uma corrida de credores, em que cada um tentava executar sua dívida antes dos demais, potencialmente forçando a liquidação de ativos da empresa.

A reavaliação da dívida também restringiu ainda mais o acesso da Bombril a crédito. Sem garantias livres e já enfrentando taxas elevadas, a empresa ficou sem margem para novas captações. Os credores passaram a exigir condições mais rígidas, como juros de 24% ao ano e vencimentos de curto prazo.

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